O fragmento acima (Texto 11) foi retirado do capítulo 1 de “...
A leitura do Texto 11 serve como base para responder à questão.
TEXTO 11
Antes de iniciar este livro, imaginei construí-lo pela divisão do trabalho.
Dirigi-me a alguns amigos, e quase todos consentiram de boa vontade em contribuir para o desenvolvimento das letras nacionais. Padre Silvestre ficaria com a parte moral e as citações latinas; João Nogueira aceitou a pontuação, a ortografia e a sintaxe; prometi ao Arquimedes a composição tipográfica; para a composição literária convidei Lúcio Gomes de Azevedo Gondim, redator e diretor do Cruzeiro.Eu traçaria o plano, introduziria na história rudimentos de agricultura e pecuária, faria as despesas e poria o meu nome na capa.
[...]
O resultado foi um desastre. Quinze dias depois do nosso primeiro encontro, o redator do Cruzeiro apresentou-me dois capítulos datilografados, tão cheios de besteiras que me zanguei:
– Vá para o inferno, Gondim. Você acanalhou o troço. Está pernóstico, está safado, está idiota.
Há lá ninguém que fale dessa forma!
Azevedo Gondim apagou o sorriso, engoliu em seco, apanhou os cacos da sua pequena vaidade e replicou amuado que um artista não pode escrever como fala.
Não pode? Perguntei com assombro. E por quê?
Azevedo Gondim respondeu que não pode porque não pode.
– Foi assim que sempre se fez. Aliteratura é a literatura, seu Paulo. Agente discute, briga, trata de negócios naturalmente, mas arranjar palavras com tinta é outra coisa. Se eu fosse escrever como falo, ninguém me lia.
(RAMOS, Graciliano. São Bernardo. 80. ed. Rio de Janeiro: Record, 2004, p. 9)