CabeludinhoQuando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresen...
Quando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresentou aos amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e voltou de ateu. Ela disse que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada me fantasiava de ateu. Como quem dissesse no carnaval: aquele menino está fantasiado de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério. Mas todo-mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer de uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza nas palavras e uma solenidade de amor. E pode ser instrmento de rir. De outra feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse, Cabeludinho. Eu não disiliminei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe um perfume de poesia à nossa quadra. Aprendi nessas férias a brincar de palavras mais do que trabalhar com elas. Comecei a não gostar de palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar. Aprendi a gostar mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que elas informam. Por depois ouvir um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena, não me escreve/ que eu não sei a ler. Aquele a preposto ao verbo ler, ao meu ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro.
BARROS, M. Memórias inventadas: a infância. São Paulo: Planeta, 2003.
No texto “Cabeludinho” de Manuel de Barros, o autor usa elementos linguísticos para criar efeitos estilísticos e expressivos. Sobre o uso da preposição deslocada e a criação de verbos novos no texto, qual das alternativas a seguir está correta?
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Gabarito comentado
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Alternativa correta: C
O tema central da questão aborda o uso estilístico das preposições e a criação de neologismos (novos verbos) no texto "Cabeludinho" de Manuel de Barros. Para resolver essa questão, é necessário compreender como a linguagem pode ser manipulada para criar efeitos expressivos e humorísticos, além de conhecer o conceito de regência verbal e a função poética da linguagem.
Alternativa C é a correta. A deslocação da preposição na frase "Ele voltou de ateu" é usada para criar um elemento de humor e ironia. Essa construção lembra o carnaval, onde as pessoas se fantasiam de algo que não são normalmente. O texto brinca com a ideia de "fantasiar-se" de ateu, usando a linguagem de forma criativa e irônica.
Agora, vamos analisar por que as outras alternativas estão incorretas:
Alternativa A: A afirmação de que a preposição deslocada enfatiza a seriedade do narrador está incorreta. Na verdade, o uso da preposição "de" dessa forma é inusitado e cria um efeito humorístico, não sério.
Alternativa B: O verbo "disiliminar" é uma invenção do autor, mas o objetivo não é criar formalidade. Pelo contrário, ele é usado para brincar com a linguagem e adicionar um toque poético e lúdico à narrativa, refletindo a infância e a criatividade das crianças.
Alternativa D: A ideia de que o verbo "disiliminar" cria um efeito de precisão é incorreta. A criação desse verbo visa justamente o oposto, ou seja, explorar a liberdade e a brincadeira com as palavras, sem amarras à precisão linguística.
Alternativa E: A frase “não me escreve / que eu não sei a ler” não busca enfatizar a clareza. Pelo contrário, a construção "a ler" amplia a ideia de solidão do vaqueiro, dando um tom poético à mensagem.
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Comentários
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A deslocação da preposição no exemplo dado é utilizada para adicionar um elemento de humor e ironia, comparável ao carnaval, momento em que geralmente as pessoas se fantasiam.
Acredito que a "E" tbm esteja certa.
“não me escreve / que eu não sei a ler” Não tem como ser mais claro.
"Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério. Mas todo-mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer de uma informação um chiste."
Alguém me explica como, diante desse trecho do texto, é possível que a alternativa C esteja correta? Que elemento de humor e ironia há na adição da preposição, visto que o próprio autor admite que sua avó falava sério, inclusive em seguida alegando, de forma adversativa, que todos riram?
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