A respeito dos sentidos do texto de Sérgio Sampaio, que cons...
Pavio do destino
Sérgio Sampaio
01 O bandido e o mocinho
São os dois do mesmo ninho
Correm nos estreitos trilhos
04 Lá no morro dos aflitos
Na Favela do Esqueleto
São filhos do primo pobre
07 A parcela do silêncio
Que encobre todos os gritos
E vão caminhando juntos
10 O mocinho e o bandido
De revólver de brinquedo
Porque ainda são meninos
13 Quem viu o pavio aceso do destino?
Com um pouco mais de idade
E já não são como antes
16 Depois que uma autoridade
Inventou-lhes um flagrante
Quanto mais escapa o tempo
19 Dos falsos educandários
Mais a dor é o documento
Que os agride e os separa
22 Não são mais dois inocentes
Não se falam cara a cara
Quem pode escapar ileso
25 Do medo e do desatino
Quem viu o pavio aceso do destino?
O tempo é pai de tudo
28 E surpresa não tem dia
Pode ser que haja no mundo
Outra maior ironia
31 O bandido veste a farda
Da suprema segurança
O mocinho agora amarga
34 Um bando, uma quadrilha
São os dois da mesma safra
Os dois são da mesma ilha
37 Dois meninos pelo avesso
Dois perdidos Valentinos
Quem viu o pavio aceso do destino?
Infere-se da leitura dos versos “O bandido veste a farda / Da suprema segurança / O mocinho agora amarga / Um bando, uma quadrilha” (v.31-34) que houve uma inversão: o menino que fazia o papel de mocinho na brincadeira virou bandido quando adulto, e o que fazia o papel de bandido se tornou policial. Na mesma estrofe, os termos “surpresa” (v.28), “ironia” (v.30) e “avesso” (v.37) ratificam essa interpretação.