Leia, abaixo, um trecho de uma entrevista com Cristovam Buar...

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Q2881189 Português

Leia o texto abaixo e responda às questões propostas.


O mundo para todos


1_____ Durante debate recente, nos Estados Unidos, fui questionado sobre o que pensava da internacionalização da Amazônia. O jovem introduziu a pergunta dizendo que esperava a resposta de um humanista e não de um brasileiro. Foi a primeira vez que um debatedor determinou a ótica humanista como ponto de partida para uma resposta minha.

2_____ De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimônio, ele é nosso. Respondi que, como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental que sofre a Amazônia, podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o mais que tem importância para a Humanidade.

3_____ Se a Amazônia, sob uma ótica humanista, deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia para o nosso futuro.

4_____ Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço. Os ricos do mundo, no direito de queimar esse imenso patrimônio da Humanidade.

5_____ Da mesma forma, o capital financeiro de países ricos deveria ser internacionalizado. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada pela vontade de um dono, ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desemprego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação. Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França.

6_____ Cada museu do mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar que esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, seja manipulado e destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito, um milionário japonês decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro deveria ter sido internacionalizado.

7_____ Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniram o Fórum do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por constrangimentos na fronteira dos Estados Unidos. Por isso, eu disse que Nova York, como sede das Nações Unidas, deveria ser internacionalizada. Pelo menos Manhatan deveria pertencer a toda a Humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília, Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria ser do mundo inteiro.

8_____ Se os Estados Unidos querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos Estados Unidos. Até porque eles já demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil.

9_____ Nos seus debates, os atuais candidatos à presidência dos Estados Unidos têm defendido a idéia de internacionalizar as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para garantir que cada criança no mundo tenha possibilidade de ir à escola. Internacionalizemos as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio que O mundo para todos merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia.

10____ Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimônio da Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar, que morram quando deveriam viver.

11____ Como humanista, aceito defender a internacionalização do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia seja nossa. Só nossa.


Cristovam Buarque. O Globo, 23 de outubro de 2000.

Leia, abaixo, um trecho de uma entrevista com Cristovam Buarque, concedida em 15 de março de 2005, quatro anos após a publicação do texto O mundo para todos:


"Esse questionamento feito pelo jovem americano no debate é uma interpretação apenas dos americanos ou muitos brasileiros também pensam da mesma forma?


C. B. Não sei se muitos brasileiros pensam da mesma forma, no sentido de internacionalização. Agora, alguns falaram comigo quando leram o artigo e discordaram daquela frase final, que afirma que a Amazônia, enquanto não internacionalizarmos tudo, continua nossa. Eles acham que a gente tem de ter uma responsabilidade maior com a Amazônia. Se não, não se justifica essa afirmação. “Um amigo meu, muito conhecido, Sebastião Salgado, me disse que aquele artigo ficaria melhor se não tivesse aquela frase.”


As críticas à conclusão do texto se justificam porque:

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