Considere o trecho “Na França, agosto também não tem boa rep...

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Q2510013 Português

Agosto

Apenas uma rima para desgosto?


    Agosto, desgosto. Rimar, rima. Mas será verdade? Da minha parte, desde menino ouvia dizer em Minas “agosto, mês de desgosto”. Oitavo mês do ano, agosto retirou seu nome do imperador César Augusto. Não podia ter um patrono de mais sorte, em tudo por tudo benéfico. O século de Augusto, o quinto antes de Cristo, foi um brilho só. E ainda teve Mecenas, que passou o seu nome a todos os protetores das artes e das letras.

    A 13 de agosto de 1965, na TV Globo recém-inaugurada, que era então apenas o Canal 4 do Rio de Janeiro, Gláucio Gil abriu o seu programa à noite com as seguintes palavras: “Sexta-feira, 13 de agosto. Até agora, tudo bem”. E, trágica ilustração, caiu morto, fulminado por um infarto. Sua intenção era dizer um texto leve, meio humorístico, sobre o mês que tem fama de aziago. Os estudiosos do folclore colhem na fonte popular a certeza dogmática de que se trata de um mês de mau agouro, impróprio para casamento, mudança de casa ou início de qualquer empreendimento.

    Será assim só no Brasil? Não; na Argentina quem lava a cabeça em agosto, sobretudo se for mulher, está chamando a morte para si ou para alguém de sua família. Na França, agosto também não tem boa reputação. Com o calor e as férias, Paris fica entregue aos turistas e é, para o francês, o mês menos propício do ano. No Brasil, o dito popular se fortaleceu com a Primeira Guerra Mundial, em 1914. A notícia chegou aqui a primeiro de agosto. Mas de fato a guerra começou na Sérvia a 28 de julho. Antes do satélite, do telex e do DDI, o atraso ficou por conta do cabo submarino. Aprofundou-se, porém, a convicção de que agosto é um mês nefasto. Chegou por isso a inspirar uma canção popular. E um pesquisador já em 1925 garantia que se trata de um mês tradicionalmente desmancha- -prazeres da humanidade. A segunda-feira de agosto era apontada naquela altura como o dia mais agourento de todo o ano.

    Hoje, ninguém duvida, e os jornais nunca se esquecem de o dizer, este triste privilégio cabe à sexta-feira, 13. Sexta-feira, 13 e agosto — é um somatório de maus presságios, que a morte súbita de Gláucio Gil diante das câmeras só fez confirmar. Em 1954, onze anos antes, a suprema prova dos maus eflúvios de agosto veio com o suicídio de Getúlio Vargas. Fato singular: um chefe de Estado se matar na sede do governo.    

    Sete anos depois, em 1961, o Brasil era sacudido por outro abalo de dramáticas consequências — a renúncia de Jânio Quadros. Exatamente a 25 de agosto, tinha de ser, como foi, associada ao suicídio de Getúlio. No fundo, foi um suicídio simbólico. A renúncia permanece até hoje encoberta por uma aura de mistério. Jânio nunca deu explicação satisfatória. Se pretendia dar um golpe de Estado para ter plenos poderes, é fora de dúvida que se lembrou de Getúlio, ainda que inconscientemente. Ninguém no Brasil encarnou melhor do que Getúlio a astúcia no poder — e a ditadura.

        E nem sempre agosto é um mês aziago. Em Portugal se diz de maneira positiva que “maio come o trigo e agosto bebe o vinho”. Mas o padre Antônio Delicado, que no século XVII reuniu os Adágios portugueses, registra este: “Queres ver teu marido morto? Dá-lhe couves em agosto”. Que diabo de couves serão estas? Não importa. Para o padre Antônio Vieira, “o último sermão é o agosto dos pregadores, se se colhe algum fruto, neste sermão se colhe”. Aqui está uma visão propícia, portanto, do malfadado agosto.

    No Brasil, gato preto é sinal certo de desgraça. Gato preto na sexta-feira 13 é de meter medo em qualquer um. Se for em agosto, então, é o cúmulo da desdita. Sucede, porém, que as superstições mudam de mão e se entendem às vezes pelo avesso. Em Londres, gato preto é na certa good luck. Um gato preto em casa não só a protege como afasta qualquer misfortune. Igualmente na China um gato preto à noite é anúncio de felicidade. Se for em agosto, melhor ainda. Levado numa gaiola na noite do dia 13 de agosto, um gato preto pode fazer milagre na safra de cereais. O gato chinês chama a chuva e protege a lavoura.

    Muitos ditados que correm mundo ainda hoje tiveram origem rural, a partir do trabalho agrícola. E há por isso os que se ligam à meteorologia. No Brasil como em Portugal, numerosos são os dessa categoria que continuam vivos e válidos. Diz-se, por exemplo, que “gato de luva é sinal de chuva”. Seria o caso de perguntar primeiro o que é um gato de luva. Você sabe? Nem eu. E por que seria sinal de chuva? Mistério.

    Na verdade, o que importa é a rima. Se “luva” e “chuva” rimam, tanto basta. O gato entrou aí como Pilatos no credo. Afinal, o gato é um animal sagrado desde os remotos tempos do Egito. É fora de dúvida que o mês de agosto entre nós deve à rima com “desgosto” boa parte de sua carga negativa. Não há explicação lógica no domínio do esotérico. Lógica também não tem a poesia, a que se pede apenas que seja bela: “April is the cruelest month”, canta T.S. Eliot. Entre nós, seria preciso substituir abril pelo mês de agosto, já que abril aqui nada tem de cruel. E agosto não tem sido politicamente correto.    

    Entre os romanos, havia dias fastos e nefastos. Na Idade Média, havia horas abertas e fechadas, segundo estivessem mais ou menos à mercê do demônio. Ainda hoje, hoje talvez mais do que nunca, de volta a moda esotérica, o tempo e o calendário, em matéria de presságios, continuam sendo divididos por um critério que nada tem a ver com a lógica ou com o sistema solar. De resto, o sol foi um deus na Antiguidade e quem foi deus é sempre... divindade. No interior do Brasil, diz o povo que várias coisas não se devem fazer de dia. Noturnos, preferencialmente noturnos, são o nascimento e a morte.

    Agosto este ano pode nos reservar algumas surpresas. Esperemos que sejam favoráveis. De uma coisa estamos livres: nem o 13, nem o 24 caem numa sexta-feira. 13 é segunda-feira, um dia, desculpem, também considerado de maus bofes. E o 13 é por sua vez o número aziago por excelência, desde a Última Ceia de Cristo. Nos Estados Unidos não há nos hotéis 13º andar. Nos aviões, salta-se a poltrona 13, que ninguém quer. Como lá dizia o Hamlet ao Horácio, há mais coisas entre o céu e a terra do que sonha a nossa filosofia. “Yo no creo en brujerias, pero que las hay”...


(RESENDE, Otto Lara. 1992. Agosto, apenas uma rima para desgosto? Elle, São Paulo. Adaptado.)

    


Considere o trecho “Na França, agosto também não tem boa reputação.” (3º§) É correto afirmar que a disposição da vírgula na oração em comento se deu pela mesma razão que as vírgulas nas orações elencadas nas afirmativas a seguir, EXCETO em:
Alternativas

Gabarito comentado

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Alternativa correta: C

Vamos entender por que a alternativa C é a correta e as demais não são, abordando o uso da vírgula na pontuação, que é o tema principal da questão.

Alternativa C:Mas o padre Antônio Delicado, que no século XVII reuniu os Adágios portugueses, registra este: [...]

A vírgula aqui foi utilizada para isolar uma oração explicativa, que fornece uma informação adicional sobre o sujeito "padre Antônio Delicado". Diferentemente das outras alternativas, essa vírgula não está isolando um adjunto adverbial.

Alternativa A:No interior do Brasil, diz o povo que várias coisas não se devem fazer de dia.

Nesta frase, a vírgula foi usada para separar um adjunto adverbial deslocado ("No interior do Brasil") do restante da oração. Isso facilita a leitura e compreensão do texto, destacando a localização.

Alternativa B:No Brasil, o dito popular se fortaleceu com a Primeira Guerra Mundial, em 1914.

Similar à alternativa A, a vírgula separa o adjunto adverbial deslocado ("No Brasil") do restante da oração. Novamente, isso faz com que a localização seja enfatizada antes da informação principal.

Alternativa D:Sete anos depois, em 1961, o Brasil era sacudido por outro abalo de dramáticas consequências — a renúncia de Jânio Quadro.

Mais uma vez, a vírgula separa um adjunto adverbial de tempo ("Sete anos depois, em 1961"). Isso ajuda a destacar o contexto temporal antes de continuar com a ideia principal da frase.

Portanto, a diferença principal é que nas alternativas A, B e D, as vírgulas são usadas para separar adjuntos adverbiais deslocados, enquanto na alternativa C, a vírgula isola uma oração explicativa. Por isso, a alternativa correta é a alternativa C.

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Comentários

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as vírgulas estão separando adverbios e locuções adverbiais, oque não ocorre na letra C

Para responder corretamente a essa questão, vamos analisar a razão para a disposição da vírgula no trecho "Na França, agosto também não tem boa reputação." e compará-la com as vírgulas nas orações das alternativas fornecidas.

"Na França, agosto também não tem boa reputação."

  • A vírgula é usada para separar um adjunto adverbial deslocado ("Na França") que está no início da oração.

A. "No interior do Brasil, diz o povo que várias coisas não se devem fazer de dia."

  • Aqui, a vírgula também separa um adjunto adverbial deslocado ("No interior do Brasil") no início da oração.
  • Razão da vírgula: Adjunto adverbial deslocado.

B. "No Brasil, o dito popular se fortaleceu com a Primeira Guerra Mundial, em 1914."

  • Nesta frase, a vírgula novamente separa um adjunto adverbial deslocado ("No Brasil") no início da oração.
  • Razão da vírgula: Adjunto adverbial deslocado.

C. "Mas o padre Antônio Delicado, que no século XVII reuniu os Adágios portugueses, registra este: [...]"

  • Aqui, as vírgulas são usadas para isolar uma oração subordinada adjetiva explicativa ("que no século XVII reuniu os Adágios portugueses").
  • Razão da vírgula: Oração subordinada adjetiva explicativa.

D. "Sete anos depois, em 1961, o Brasil era sacudido por outro abalo de dramáticas consequências — a renúncia de Jânio Quadros."

  • Neste caso, a vírgula separa um adjunto adverbial deslocado ("Sete anos depois") e uma expressão explicativa ("em 1961").
  • Razão da vírgula: Adjunto adverbial deslocado e expressão explicativa.
  • As alternativas A, B e D usam a vírgula para separar adjuntos adverbiais deslocados, assim como no trecho original.
  • A alternativa C, no entanto, usa a vírgula para isolar uma oração subordinada adjetiva explicativa.

A disposição da vírgula na oração "Na França, agosto também não tem boa reputação." se dá pela mesma razão que nas orações das alternativas A, B e D. Portanto, a alternativa que não segue essa mesma razão é:

C. "Mas o padre Antônio Delicado, que no século XVII reuniu os Adágios portugueses, registra este: [...]"

A alternativa C é a exceção, pois as vírgulas aí isolam uma oração subordinada adjetiva explicativa, não um adjunto adverbial deslocado.

Questão boa. #PMMG2025

[GABARITO: LETRA C]

A disposição da vírgula na oração “Na França, agosto também não tem boa reputação.” ocorre por uma razão diferente das vírgulas nas outras orações elencadas. Vamos analisar cada alternativa:

  • Alternativa A: “No interior do Brasil, diz o povo que várias coisas não se devem fazer de dia.” (10º§) Nesse caso, a vírgula separa o adjunto adverbial “no interior do Brasil” no início da frase.
  • Alternativa B: “No Brasil, o dito popular se fortaleceu com a Primeira Guerra Mundial, em 1914.” (3º§) Aqui, a vírgula isola o adjunto adverbial “no Brasil”.
  • Alternativa C: “Mas o padre Antônio Delicado, que no século XVII reuniu os Adágios portugueses, registra este: […]” (6º§) Nessa oração, a vírgula isola a expressão intercalada “que no século XVII reuniu os Adágios portugueses”.
  • Alternativa D: “Sete anos depois, em 1961, o Brasil era sacudido por outro abalo de dramáticas consequências — a renúncia de Jânio Quadro.” (5º§) Aqui, a vírgula separa o aposto “em 1961”.

Portanto, a alternativa que não segue a mesma razão da vírgula no trecho original é a alternativa C. A vírgula em “Na França, agosto também não tem boa reputação.” serve para isolar o adjunto adverbial “Na França”.

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