As palavras destacadas nos trechos a seguir estão qualifica...
Sobre a banalização do próprio corpo
Recentemente, num café da manhã entre confrades, ao sugerir – destaco “sugerir” – a uma amiga atriz que fechasse um dos botões de sua camisa, pois um de seus seios poderia ficar exposto ao movimentar-se, obtenho a resposta: “Mas é só um peito como todos os outros. Como aquele das mães que amamentam. É só mais um peito”.
Um pouco confuso com a reação, me calo e reflito… “É só mais um peito”? Mal da Filosofia: faço da afirmação um problema, uma questão.
A pergunta me remói por dias, até que assisto ao espetáculo Ziggy, homenagem prestada a David Bowie pela Cisne Negro Cia. de Dança, de Hulda Bittencourt. Ao mergulhar minha visão – e meu ser, portanto – nos corpos em gesto dos bailarinos e nas suas extensões, isto é, o belo e inspirado figurino de Fabio Namatame, uma pletora de pensamentos me invade, dentre eles, e sobretudo, a reflexão do filósofo francês Maurice Merleau-Ponty.
Merleau-Ponty teve um papel importantíssimo ao recuperar a importância da percepção para a Filosofia. Suas teses de doutorado – a complementar, A estrutura do comportamento, e a principal, Fenomenologia da percepção – são consagradas a permutar, no modo como concebemos a consciência, o ego cogito (“eu penso”), tal como o compreendemos até então, pelo ego percipio (“eu percebo”). Numa direção diversa daquela de Descartes, Merleau-Ponty não funda o modo de ser singular do homem em sua capacidade de pensar, mas em sua percepção.
A partir das reflexões de Edmund Husserl, MerleauPonty alerta que não há uma consciência pura, tal como o defendia Descartes, isto é, o homem não pode ser simplesmente uma “coisa pensante” (res cogitans). Ele é necessariamente uma consciência aberta para o mundo. Sua consciência é sempre consciência de alguma coisa. E aquilo que possibilita a ele estar no mundo em consciência é seu corpo. E aqui temos uma marca importantíssima.
Em diálogo com Husserl e com toda uma série de pensadores franceses – dentre eles Malecranche, Maine de Biran e Bergson –, Merleau-Ponty evoca a noção de corpo-próprio. Podemos compreendê-la melhor por meio de uma distinção que faz a língua alemã. Dentre as palavras usadas para se referir a “corpo”, destacam-se duas: Körper e Leib. Körper designa qualquer corpo posto no espaço. Leib designa um corpo animado, um corpo vivo, o corpo próprio a um dado sujeito ou, se se preferir, a uma dada subjetividade.
Mas por que desta distinção? Responder a esta pergunta nos auxilia a responder à questão que nos colocamos de início. Nosso próprio corpo, ou, se se preferir, nosso corpo-próprio – como se traduz usualmente em português a palavra Leib – não é como qualquer outro corpo posto no espaço. Ele é dotado de vida: vida única, singular e que nos constitui. Sem ele, não estaríamos presentes no mundo, não o perceberíamos e não faríamos a sua experiência (a do corpo e a do mundo).
Nosso corpo não se desloca no espaço, ele realiza gestos. Uma cadeira não realiza gestos, um automóvel ou uma máquina tampouco. Minha mão, seus olhos, os braços de um dançarino, o corpo de um ator se movimentam no espaço de uma maneira totalmente diversa daquela de qualquer outro corpo. O corpo próprio percebe tudo aquilo que o envolve no ato em que se move, percebendo a si próprio. Mais que isso, na e pela percepção ele cria, inventa e transforma o espaço que se abre para acolher seu gesto.
Como diria Merleau-Ponty em sua tese principal, “O corpo-próprio está no mundo como o coração no organismo: ele mantém continuamente com vida o espetáculo visível, ele o anima e o nutre interiormente, forma com ele um sistema”.
Regressemos ao espetáculo Ziggy. Nele, o figurino expunha partes dos corpos dos bailarinos sem qualquer excesso, sem qualquer possibilidade de banalização. Lá havia seios à mostra: em alguns casos um; noutros, eram vistos parcialmente. Mas tudo sem excesso. O figurino valorizava os movimentos de cada um dos corpos que se ofereciam ao espaço, que eram por ele acolhidos e que, simultaneamente, o faziam se abrir a seus gestos. Na dança, por exemplo, é possível captar esta bela dimensão em que se percebe a criação como o encontro entre o movimento e o espaço, e não somente como fruto do movimento de um sujeito num espaço inerte. Não é possível um sem o outro.
Fechando o círculo constituído por esta reflexão, retomo, então, a questão: “É só mais um peito”? Não se tratava, ali, de “só um peito”, mas de um seio único que não é simplesmente algo à parte, um conjunto de pontos localizáveis no espaço que o constituem como um corpo isolado. Ele é necessariamente parte de um corpo inteiro que, por sua vez, põe a pessoa em contato com o mundo e a faz, por esta situação, transformar o próprio mundo por seus gestos. Como o seio da dançarina, aquele dito “só mais um peito” se movimenta com o corpo todo. Dizia Merleau-Ponty que as partes do corpo “se reportam umas às outras de uma maneira original: não estão dispersas umas ao lado das outras, mas envolvidas umas nas outras”.
Ao tomar o seio, por exemplo, como “só mais um peito”, é desprezado o corpo inteiro da bailarina que se expressa no movimento, compondo um gesto singular que cria a cena, que abre um horizonte de percepção. Ao banalizar o corpo-próprio, seu gesto – a dança, o atuar, o canto, por exemplo – perde sentido. Os seios nus das combatentes do “Femens” deixariam de ter o mesmo impacto e de, em sua densidade, constituir ato político. E assim será se banalizarmos qualquer parte de nosso corpo ou mesmo quaisquer de seus gestos: punhos erguidos, palmas, vaias, o beijo.
Não se trata, aqui, de debater a ocasião em que a frase sugerida para discussão – “Mas é só um peito […]” – fora enunciada. Tampouco de renegar as lutas políticas pelas quais passamos nas últimas décadas, de que somos devedores, que possibilitaram liberações em dimensões diversas de nossa vida em sociedade, e de nos recolhermos na redoma conservadora que, nos anos recentes, se ergue em torno de nós e nos sufoca tal qual clausura. É preciso defender o espaço
Trata-se apenas de um convite a pôr em questão a frase proferida, de modo a manter-nos despertos e atentos a cada gesto realizado, não para perscrutar a própria consciência ou mesmo o inconsciente, como se ambos escondessem alguma verdade à espera da decifração, mas para, por meio desta atenção sobre nós mesmos, vivermos intensamente cada gesto realizado pelo próprio corpo, pelo corpo inteiro – pelo corpo-próprio –, em sua singular complexidade.conquistado.
Francisco Alessandro. Revista cult. Disponível em:
<https://bit.ly/2LHLa1P>. Acesso em: 6 ago. 2018 (Adaptação).
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Vamos analisar a questão e entender por que a alternativa correta é a Alternativa A.
Primeiramente, a questão está nos pedindo para identificar qual das alternativas contém uma palavra que não está qualificando outra no mesmo trecho. Para isso, precisamos revisar o conceito de adjetivo, que é a palavra que qualifica ou determina um substantivo, atribuindo-lhe uma característica.
No enunciado, temos as seguintes alternativas:
Alternativa A: “Minha mão, seus olhos, os braços de um dançarino, o corpo de um ator se movimentam no espaço [...]”
Nessa alternativa, a palavra “Minha” é um pronome possessivo que está determinando o substantivo “mão” e não qualificando-o. Portanto, essa alternativa é a correta.
Alternativa B: “[...] mas de um seio único que não é simplesmente algo à parte [...]”
Aqui, a palavra “único” está qualificando o substantivo “seio”, indicando que ele é especial ou diferente. Portanto, está correto afirmar que “único” é um adjetivo qualificativo.
Alternativa C: “[...] de modo a manter-nos despertos e atentos a cada gesto realizado [...]”
Nesta alternativa, a palavra “despertos” está qualificando o sujeito oculto “nós”, dizendo que estamos acordados ou vigilantes. Logo, “despertos” é um adjetivo qualificativo.
Alternativa D: “Merleau-Ponty teve um papel importantíssimo ao recuperar a importância da percepção para a Filosofia.”
Por fim, na alternativa D, a palavra “importantíssimo” qualifica o substantivo “papel”, indicando que ele teve um papel de grande importância. Assim, “importantíssimo” é um adjetivo superlativo.
Portanto, a única alternativa em que a palavra destacada não está qualificando outra é a Alternativa A, onde “Minha” é um pronome possessivo e não um adjetivo qualificativo.
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Comentários
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GABARITO: LETRA A
? ?Minha mão, seus olhos, os braços de um dançarino, o corpo de um ator se movimentam no espaço [...]?
? O termo em destaque é um pronome possessivo adjetivo, ele acompanha um substantivo, mas não o qualifica (=isso é função de um adjetivo).
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? FORÇA, GUERREIROS(AS)!!
Dica:
☛Jogue um "tão" antes do termo e faça o gol!
B) um seio (TÃO) único
C) manter-nos (TÃO) despertos
D) um papel importantíssimo OU (tão) Importante ...
Sucesso, Bons estudos, Nãodesista!
Mas esse MINHA não seria um pronome adjetivo???
A resposta para a questão encontra-se já no enunciado: quer-se um termo que não caracterize outros, ou seja, em palavras distintas, deve-se marcar a alternativa em que o termo destacado não seja adjetivo, responsável por conferir característica, qualidade a outros vocábulos. Leiamos:
a) “Minha mão, seus olhos, os braços de um dançarino, o corpo de um ator se movimentam no espaço [...]”
Correto. O termo em destaque é pronome possessivo e não confere característica alguma ao substantivo, alterando-o. Corresponde ao que foi pedido no enunciado;
b) “[...] mas de um seio único que não é simplesmente algo à parte [...]”
Incorreto. Trata-se de adjetivo e caracteriza o termo ao qual se refere;
c) “[...] de modo a manter-nos despertos e atentos a cada gesto realizado [...]”
Incorreto. Trata-se de adjetivo e caracteriza o termo ao qual se refere;
d) “Merleau-Ponty teve um papel importantíssimo ao recuperar a importância da percepção para a Filosofia.”
Incorreto. Trata-se de adjetivo e caracteriza o termo ao qual se refere.
Letra A
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