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Q2939365 Português

    Gilberto Freyre sugeriu certa vez que diferentes tipos de construção revelam algo importante sobre a cultura dentro da qual surgiram. “O século XIX criou o grande hotel assim como o século VI criou a catedral gótica”, disse ele.
    Qual seria o equivalente à catedral ou ao hotel em nossos tempos? O shopping center, com certeza. Ele é ao mesmo tempo uma resposta aos problemas urbanos, uma forma arquitetônica que molda nosso cotidiano e um símbolo da sociedade de consumo. No Brasil, o shopping parece ter sido uma inovação dos anos 1960 e, desde então, eles se multiplicaram. Converteram-se em centros de sociabilidade, tomando o lugar das ruas e das praças como lugares para passear, encontrar amigos, tomar um café e ir a restaurantes e cinemas. Poderíamos dizer que o shopping center se converteu num modo de vida, entre outras razões, porque garante um ambiente seguro.
    Os centros começaram como uma combinação de lojas, estacionamentos de veículos e áreas de pedestres, mas pouco depois ganharam o acréscimo de cafés, restaurantes, cinemas e agências bancárias, criando virtuais pequenas cidades, protegidas tanto das intempéries do clima quanto (graças aos agentes de segurança) da violência. Esses empreendimentos faziam e ainda fazem muito sentido econômico. Construídos em áreas de aluguel baixo, nas periferias das cidades ou até mesmo fora delas, dotados de amplo espaço de estacionamento, tinham como público as famílias que eram atraídas pelos cinemas ou restaurantes, mas ficavam ali para fazer compras (ou eram atraídas pelas lojas, mas ficavam ali mais tempo para comer ou ir ao cinema). Uma espécie de substitutos, em ambiente fechado, da vida das ruas, que se encontrava mais e mais ameaçada pela expansão das cidades, pelo uso crescente do automóvel e pelo conseqüente declínio das calçadas.
    Olhando em retrospectiva, os historiadores vão enxergar os shoppings como símbolos da sociedade de consumo, nos quais fazer compras − ou pelo menos olhar as vitrines sem comprar nada − se converteu numa forma importante de lazer. Eles oferecem um bom exemplo de como a arquitetura exprime os valores de uma época, como sugeriu Gilberto Freyre, mas também molda a vida social, incentivando o surgimento de novas rotinas cotidianas e novas formas de sociabilidade.

 (Adaptado de Peter Burke. Folha de S. Paulo, Mais!, 11 de março de 2007, p. 3)

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o texto para quem tem interesse : Gilberto Freyre sugeriu certa vez que diferentes tipos de construção revelam algo importante sobre a cultura dentro da qual surgiram. “O século XIX criou o grande hotel assim como o século VI criou a catedral gótica”, disse ele.

Qual seria o equivalente à catedral ou ao hotel em nossos tempos? O shopping center, com certeza. Ele é ao mesmo tempo uma resposta aos problemas urbanos, uma forma arquitetônica que molda nosso cotidiano e um símbolo da sociedade de consumo. No Brasil, o shopping parece ter sido uma inovação dos anos 1960 e, desde então, eles se multiplicaram. Converteram-se em centros de sociabilidade, tomando o lugar das ruas e das praças como lugares para passear, encontrar amigos, tomar um café e ir a restaurantes e cinemas. Poderíamos dizer que o shopping center se converteu num modo de vida, entre outras razões, porque garante um ambiente seguro.

Os centros começaram como uma combinação de lojas, estacionamentos de veículos e áreas de pedestres, mas pouco depois ganharam o acréscimo de cafés, restaurantes, cinemas e agências bancárias, criando virtuais pequenas cidades, protegidas tanto das intempéries do clima quanto (graças aos agentes de segurança) da violência. Esses empreendimentos faziam e ainda fazem muito sentido econômico. Construídos em áreas de aluguel baixo, nas periferias das cidades ou até mesmo fora delas, dotados de amplo espaço de estacionamento, tinham como público as famílias que eram atraídas pelos cinemas ou restaurantes, mas ficavam ali para fazer compras (ou eram atraídas pelas lojas, mas ficavam ali mais tempo para comer ou ir ao cinema). Uma espécie de substitutos, em ambiente fechado, da vida das ruas, que se encontrava mais e mais ameaçada pela expansão das cidades, pelo uso crescente do automóvel e pelo conseqüente declínio das calçadas.

Olhando em retrospectiva, os historiadores vão enxergar os shoppings como símbolos da sociedade de consumo, nos quais fazer compras − ou pelo menos olhar as vitrines sem comprar nada − se converteu numa forma importante de lazer. Eles oferecem um bom exemplo de como a arquitetura exprime os valores de uma época, como sugeriu Gilberto Freyre, mas também molda a vida social, incentivando o surgimento de novas rotinas cotidianas e novas formas de sociabilidade.

(Adaptado de Peter Burke. Folha de S. Paulo, Mais!, 11 de março de 2007, p. 3)

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