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Q417702 Português
                                         Cultura e terror


      Essa minha ideia de que o homem é, sobretudo, um ser cultural, não deve ser entendida como uma visão idealizada e otimista, pelo simples fato de que isso o distingue dos outros seres naturais. 
      Se somos seres culturais, se pensamos e com nosso pensamento inventamos os valores que constituem a nossa humanidade, diferimos dos outros animais, que se atêm a sua animalidade e agem conforme suas necessidades vitais imediatas. 
      Entendo que, ao contrário dos outros animais, o homem nasceu incompleto e, por essa razão, teve de inventar-se e inventar o mundo em que vive. Por exemplo, um bisão ou um tigre nasce com todos os recursos necessários à sua sobrevivência, mas o homem, para caçar o bisão, teve que inventar a lança. 
      Isso, no plano material. Mas nasceu incompleto também no plano intelectual, porque é o único animal que se pergunta por que nasceu, que sentido tem a existência. Para responder a essas e outras perguntas, inventou a religião, a filosofia, a ciência e a arte. 
      Assim, construiu, ao longo da história, uma realidade cultural, inventada, que alcança hoje uma complexidade extraordinária e fascinante. O homem deixou de viver na natureza para viver na cidade que foi criada por ele. 
      Mas, o fato mesmo de se inventar como ser cultural criou-lhe graves problemas, nascidos, em grande parte, daqueles valores culturais. É que, por serem inventados, variam de uma comunidade humana para outra, gerando muitas vezes conflitos insuperáveis. As diversas concepções filosóficas, religiosas, estéticas e políticas podem levar os homens a divergências insuperáveis e até mesmo a conflitos mortais. 
      Pode ser que me engane, mas a impressão que tenho é de que o homem, por ser essencialmente os seus valores, tem que afirmá-los perante o outro e obter dele sua aceitação. Se o outro não os aceita, sente-se negado em sua própria existência. Daí por que, a tendência, em certos casos, é levá-lo a aceitá-los por bem ou por mal. Chega-se à agressão, à guerra. 
      Certamente, nem sempre é assim, depende dos indivíduos e das comunidades humanas; depende sobretudo de quais valores os fundamentam. 
      De modo geral, é no campo da religião e da política que a intolerância se manifesta com maior frequência e radicalismo. A história humana está marcada por esses conflitos, que resultaram muitas vezes em guerras religiosas, com o sacrifício de centenas de milhares de vidas. 
      Com o desenvolvimento econômico e ampliação do conhecimento científico, a questão religiosa caiu para segundo plano, enquanto o problema ideológico ganhou o centro das atenções. 
      A questão da riqueza, da desigualdade social e consequentemente da justiça social tornou-se o núcleo dos conflitos entre as classes e o poder político. 
      Esse fenômeno, que se formou em meados do século XIX, ocuparia todo o século XX, com o surgimento dos Estados socialistas. O ápice desse conflito foi a Guerra Fria, resultante do antagonismo entre os Estados Unidos e a União Soviética. 
      Surpreendente, porém, é que, em pleno século do desenvolvimento científico e tecnológico, tenha eclodido uma das expressões mais irracionais da intolerância religiosa: o terrorismo islâmico, surgido de uma interpretação fanatizada daquela doutrina. 
      O terrorismo não nasceu agora mas, a partir do conflito entre judeus e palestinos, lideranças fundamentalistas islâmicas o adotaram como arma de uma guerra santa contra a civilização ocidental, que não segue as palavras sagradas do Corão. 
      Em consequência disso, homens e mulheres jovens, transformados em bombas humanas, não hesitam em suicidar-se inutilmente, convencidos de que cumprem a vontade de Alá e serão recompensados com o paraíso. 
      Parece loucura e, de fato, o é, mas diferente da doença psíquica propriamente dita. É uma loucura decorrente do fanatismo político ou religioso, que muda o amor a Deus em ódio aos infiéis. 
      Embora o Corão condene o assassinato de inocentes, na opinião dos promotores de tais atentados - que matam sobretudo inocentes - só é proibido matar os “nossos” inocentes, como afirmou Bin Laden, não os inocentes “deles”. 
      Tudo isso mostra que o homem é mesmo um ser cultural, mas que a cultura tanto pode nos transformar em santos como em demônios. 

                          (Ferreira Gullar. Cultura e terror. Folha de São Paulo. Abril/2013. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/1269134-cultura-e-terror.shtml.) 


Observe o emprego dos sinais de pontuação usados nos seguintes trechos.

I. “[...] uma das expressões mais irracionais da intolerância religiosa: o terrorismo islâmico, [...]” (13º§)
II. “[...] na opinião dos promotores de tais atentados – que matam sobretudo inocentes – [...]” (17º§)

De acordo com o contexto, eles foram usados para
Alternativas

Gabarito comentado

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Alternativa correta: E

A questão aborda o uso adequado dos sinais de pontuação em diferentes contextos textuais, e exige do aluno a capacidade de identificar e interpretar esses usos com precisão.

No trecho I ("[...] uma das expressões mais irracionais da intolerância religiosa: o terrorismo islâmico, [...]"), o uso dos dois-pontos tem a função de esclarecer ou explicar algo que foi mencionado anteriormente. Neste caso, os dois-pontos introduzem um esclarecimento ou uma explicação sobre o que é considerado uma das expressões mais irracionais da intolerância religiosa.

Já no trecho II ("[...] na opinião dos promotores de tais atentados – que matam sobretudo inocentes – [...]"), os travessões são utilizados para separar uma oração intercalada. Este tipo de construção é comum quando se quer adicionar uma informação adicional ou um comentário dentro de uma sentença sem interromper o fluxo principal do texto.

Vamos analisar as alternativas para entender por que a correta é a letra E:

A - Iniciar uma enumeração nos dois trechos.

Incorreta. O uso dos dois-pontos no trecho I não é para iniciar uma enumeração, mas para explicar algo que foi dito anteriormente. E no trecho II, os travessões não iniciam enumeração, mas sim uma oração intercalada.

B - Separar orações intercaladas nos dois trechos.

Incorreta. No trecho I, os dois-pontos não separam uma oração intercalada; eles introduzem uma explicação. Somente no trecho II os travessões separam uma oração intercalada.

C - Indicar dúvida no trecho I e indecisão no trecho II.

Incorreta. Não há indicação de dúvida ou indecisão em nenhum dos trechos. Os dois-pontos e os travessões têm funções diferentes das mencionadas.

D - Anteceder o início da fala de um personagem no trecho I e separar uma oração intercalada no trecho II.

Incorreta. Os dois-pontos no trecho I não antecedem a fala de um personagem, mas introduzem uma explicação. No trecho II, os travessões realmente separam uma oração intercalada.

E - Esclarecer algo que foi explicitado anteriormente no trecho I e separar uma oração intercalada no trecho II.

Correta. Esta alternativa está correta porque descreve com precisão as funções dos sinais de pontuação nos respectivos trechos: os dois-pontos no trecho I esclarecem algo previamente mencionado e os travessões no trecho II separam uma oração intercalada.

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Comentários

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E) esclarecer algo que foi explicitado anteriormente  no trecho I (EXEMPLIFICAÇÃO) e separar uma oração intercalada no trecho II. ORAÇÃO ADJETIVA- SEMPRE ANTECEDIDA POR PRONOME RELATIVO- EXPLICATIVA JÁ QUE ESTÁ ENTRE VÍRGULAS. 

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