Sobre o emprego das aspas nos termos “nossos” e “deles” em “...

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Q417706 Português
                                         Cultura e terror


      Essa minha ideia de que o homem é, sobretudo, um ser cultural, não deve ser entendida como uma visão idealizada e otimista, pelo simples fato de que isso o distingue dos outros seres naturais. 
      Se somos seres culturais, se pensamos e com nosso pensamento inventamos os valores que constituem a nossa humanidade, diferimos dos outros animais, que se atêm a sua animalidade e agem conforme suas necessidades vitais imediatas. 
      Entendo que, ao contrário dos outros animais, o homem nasceu incompleto e, por essa razão, teve de inventar-se e inventar o mundo em que vive. Por exemplo, um bisão ou um tigre nasce com todos os recursos necessários à sua sobrevivência, mas o homem, para caçar o bisão, teve que inventar a lança. 
      Isso, no plano material. Mas nasceu incompleto também no plano intelectual, porque é o único animal que se pergunta por que nasceu, que sentido tem a existência. Para responder a essas e outras perguntas, inventou a religião, a filosofia, a ciência e a arte. 
      Assim, construiu, ao longo da história, uma realidade cultural, inventada, que alcança hoje uma complexidade extraordinária e fascinante. O homem deixou de viver na natureza para viver na cidade que foi criada por ele. 
      Mas, o fato mesmo de se inventar como ser cultural criou-lhe graves problemas, nascidos, em grande parte, daqueles valores culturais. É que, por serem inventados, variam de uma comunidade humana para outra, gerando muitas vezes conflitos insuperáveis. As diversas concepções filosóficas, religiosas, estéticas e políticas podem levar os homens a divergências insuperáveis e até mesmo a conflitos mortais. 
      Pode ser que me engane, mas a impressão que tenho é de que o homem, por ser essencialmente os seus valores, tem que afirmá-los perante o outro e obter dele sua aceitação. Se o outro não os aceita, sente-se negado em sua própria existência. Daí por que, a tendência, em certos casos, é levá-lo a aceitá-los por bem ou por mal. Chega-se à agressão, à guerra. 
      Certamente, nem sempre é assim, depende dos indivíduos e das comunidades humanas; depende sobretudo de quais valores os fundamentam. 
      De modo geral, é no campo da religião e da política que a intolerância se manifesta com maior frequência e radicalismo. A história humana está marcada por esses conflitos, que resultaram muitas vezes em guerras religiosas, com o sacrifício de centenas de milhares de vidas. 
      Com o desenvolvimento econômico e ampliação do conhecimento científico, a questão religiosa caiu para segundo plano, enquanto o problema ideológico ganhou o centro das atenções. 
      A questão da riqueza, da desigualdade social e consequentemente da justiça social tornou-se o núcleo dos conflitos entre as classes e o poder político. 
      Esse fenômeno, que se formou em meados do século XIX, ocuparia todo o século XX, com o surgimento dos Estados socialistas. O ápice desse conflito foi a Guerra Fria, resultante do antagonismo entre os Estados Unidos e a União Soviética. 
      Surpreendente, porém, é que, em pleno século do desenvolvimento científico e tecnológico, tenha eclodido uma das expressões mais irracionais da intolerância religiosa: o terrorismo islâmico, surgido de uma interpretação fanatizada daquela doutrina. 
      O terrorismo não nasceu agora mas, a partir do conflito entre judeus e palestinos, lideranças fundamentalistas islâmicas o adotaram como arma de uma guerra santa contra a civilização ocidental, que não segue as palavras sagradas do Corão. 
      Em consequência disso, homens e mulheres jovens, transformados em bombas humanas, não hesitam em suicidar-se inutilmente, convencidos de que cumprem a vontade de Alá e serão recompensados com o paraíso. 
      Parece loucura e, de fato, o é, mas diferente da doença psíquica propriamente dita. É uma loucura decorrente do fanatismo político ou religioso, que muda o amor a Deus em ódio aos infiéis. 
      Embora o Corão condene o assassinato de inocentes, na opinião dos promotores de tais atentados - que matam sobretudo inocentes - só é proibido matar os “nossos” inocentes, como afirmou Bin Laden, não os inocentes “deles”. 
      Tudo isso mostra que o homem é mesmo um ser cultural, mas que a cultura tanto pode nos transformar em santos como em demônios. 

                          (Ferreira Gullar. Cultura e terror. Folha de São Paulo. Abril/2013. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/ferreiragullar/1269134-cultura-e-terror.shtml.) 


Sobre o emprego das aspas nos termos “nossos” e “deles” em “[...] só é proibido matar os ‘nossos’ inocentes, [...] não os inocentes ‘deles’.” (17º§), é correto afirmar que foram usadas com a finalidade de
Alternativas

Gabarito comentado

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Alternativa Correta: E - atribuir sentido irônico às palavras “nossos” e “deles”.

O tema central da questão é o uso de aspas para sinalizar um sentido específico em um texto. Neste caso, o texto discute como a cultura influencia os comportamentos humanos e destaca o uso das aspas para indicar a ironia nas expressões “nossos” e “deles”. Para resolver a questão, é necessário entender como as aspas podem alterar o significado de uma palavra ou expressão.

Justificativa da Alternativa Correta: As aspas são frequentemente usadas para sugerir ironia ou distanciamento em relação aos termos destacados. No trecho apresentado, “nossos” e “deles” estão entre aspas para indicar que esses termos refletem uma visão distorcida ou parcial, reforçando a ideia de que aqueles que utilizam essas palavras veem o mundo de maneira divisória e excludente. Logo, a alternativa E está correta ao afirmar que as aspas foram utilizadas para atribuir sentido irônico às palavras.

Por que as alternativas incorretas estão erradas:

A - destacar termos técnicos: Aspas podem ser usadas para destacar termos técnicos, mas neste contexto, os termos “nossos” e “deles” são usados para indicar um uso subjetivo e não técnico.

B - indicar uma citação literal: Embora aspas sejam usadas para citação literal, neste caso, elas não estão indicando uma citação de outra fonte, mas sim uma ênfase no uso irônico das palavras.

C - separar palavras explicativas: Aspas não têm a função de separar palavras explicativas. Normalmente, são parênteses ou vírgulas que fazem isso.

D - sugerir ao leitor que complete o raciocínio: Essa não é uma função das aspas. As aspas destacam uma palavra ou frase para indicar um significado especial ou menos literal, e não para sugerir que o leitor complete algo.

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Comentários

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Discordo com o Gabarito, tendo em vista que uma citação literal é a Transcrição literal de trecho de obra alheia.

exemplo:  Segundo Fulano "citação literária..."

Questão Mal Formulada

Errei e depois entendi,é que as duas palavras aparecem dentro de uma citação,veja: 

“[...] só é proibido matar os ‘nossos’ inocentes, [...] não os inocentes ‘deles’.”

Não devemos olhar as palavras isoladamente, estão com aspas pq no texto original estavam assim,é uma citação literal.

Citação literal dentro da própria citação literal...banca pequena é uma droga mesmo. Não sabe fazer, inventa.

A questão não é ser banca pequena ou grande. Já peguei uma questão da Cespe que questiona este mesmo artifício. Inclusive, usa duas alternativas bem parecidas com essas: uma dizendo que era citação literal e outra que o autor usou de ironia. 
A resposta para a questão é a mesma que esta: indica citação literal. 
Concordo que dá brechas para acharmos que é ironia, mas fazer o quê? O jeito é pegar a manha.

Gab B

 

Caí na pegadinha, porém concordo com o gabarito. Muitas vezes a falta de atenção e o "achar" que a questão foi dada nos fazem perder pontos preciosos.

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