Estão destacados, nos excertos abaixo retirados do texto, t...
O Líder
O sono do líder é agitado. A mulher sacode-o até acordá-lo do pesadelo. Estremunhado, ele se levanta, bebe um gole de água. Diante do espelho refaz uma expressão de homem de meia-idade, alisa os cabelos das têmporas, volta a se deitar. Adormece e a agitação recomeça. “Não, não!” debate-se ele com a garganta seca.
O líder se assusta enquanto dorme. O povo ameaça o líder? Não, pois se líder é aquele que guia o povo exatamente porque aderiu ao povo. O povo ameaça o líder? Não, pois se o povo escolheu o líder. O povo ameaça o líder? Não, pois o líder cuida do povo. O povo ameaça o líder?
Sim, o povo ameaça o líder do povo. O líder revolve-se na cama. De noite ele tem medo. Mas o pesadelo é um pesadelo sem história. De noite, de olhos fechados, vê caras quietas, uma cara atrás da outra. E nenhuma expressão nas caras. É só este o pesadelo, apenas isso. Mas cada noite, mal adormece, mais caras quietas vão se reunindo às outras, como na fotografia de uma multidão em silêncio. Por quem é este silêncio? Pelo líder. É uma sucessão de caras iguais como na repetição monótona de um rosto só. Nas caras não há senão a inexpressão. A inexpressão ampliada como em fotografia ampliada. Um painel e cada vez com maior número de caras iguais. É só isso. Mas o líder se cobre de suor diante da visão inócua de milhares de olhos vazios que não pestanejam. Durante o dia o discurso do líder é cada vez mais longo, ele adia cada vez mais o instante da chave de ouro. Ultimamente ataca, denuncia, denuncia, denuncia, esbraveja e quando, em apoteose, termina, vai para o banheiro, fecha a porta e, uma vez sozinho, encosta-se à porta fechada, enxuga a testa molhada com o lenço. Mas tem sido inútil. De noite é sempre maior o número silencioso. Cada noite as caras aproximam-se um pouco mais. Cada noite ainda um pouco mais. Até que ele já lhes sente o calor do hálito. As caras inexpressivas respiram – o líder acorda num grito. Tenta explicar à mulher: sonhei que... sonhei que... Mas não tem o que contar. Sonhou que era um líder de pessoas vivas.
(LISPECTOR, Clarice. Para não esquecer. São Paulo: Siciliano, 1992.)
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Vamos analisar a questão e entender seu foco. O tema central aqui é Morfologia, especialmente a identificação de termos preposicionados com valor adjetivo. É necessário compreender como algumas expressões, introduzidas por preposição, qualificam ou caracterizam um substantivo, assumindo assim um valor adjetivo.
Alternativa Correta: C - “Não, não!” debate-se ele com a garganta seca.”
A expressão “com a garganta seca” não desempenha um papel adjetivo. Aqui, a preposição "com" é utilizada para indicar uma condição ou estado ao qual o sujeito está submetido, não uma característica atribuidora ou qualificativa, o que não confere função adjetiva ao termo.
Análise das Alternativas Incorretas:
A - “Estremunhado, ele se levanta, bebe um gole de água.”
A expressão "de água" qualifica o tipo de gole, indicando que é um gole de água, conferindo, portanto, função adjetiva.
B - “Diante do espelho refaz uma expressão de homem de meia-idade.”
Aqui, "de meia-idade" qualifica o substantivo "homem", indicando uma característica do homem, agindo como adjetivo.
D - “Sim, o povo ameaça o líder do povo.”
Na expressão "do povo", o termo qualifica e especifica o líder, ou seja, ele é o líder específico do povo, atribuindo-lhe assim um valor adjetivo.
E - “(...) mais caras quietas vão se reunindo às outras, como na fotografia de uma multidão em silêncio.”
O termo "em silêncio" qualifica a multidão, indicando sua característica de silêncio, desempenhando, portanto, o papel de um adjetivo.
Compreender a função e o valor das preposições em contextos variados é essencial para resolver questões como essa de forma eficaz. Espero que esta explicação tenha ajudado a elucidar as dúvidas sobre o tema!
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A temática presente na questão refere-se à análise sintática, ou seja, o papel desempenhado por segmentos em conjunto ou palavras isoladas dentro da estrutura (podem ser objeto, sujeito, predicativo do sujeito, predicativo do objeto, etc). Em especial, deve-se reconhecer algum dos termos abaixo que não exerça função sintática de adjunto adnominal. Apenas com esta informação, resolve-se às claras a questão; no entanto, inspecionemos item a item a fim de dirimir quaisquer resquícios de dúvidas:
a) “Estremunhado, ele se levanta, bebe um gole de água.” (1º parágrafo)
Incorreto. "De água" atrela-se ao substantivo "gole", portanto tem valor de adjetivo e se classifica em adjunto adnominal;
b) “Diante do espelho refaz uma expressão de homem de meia-idade, alisa os cabelos das têmporas, volta a se deitar.” (1º parágrafo)
Incorreto. "De meia-idade" atrela-se ao substantivo "homem", portanto tem valor de adjetivo e se classifica em adjunto adnominal;
c) “Não, não!” debate-se ele com a garganta seca.” (1º parágrafo)
Correto. "Com a garganta seca" é um adjunto adverbial de modo que modifica o verbo "debater-se". Sendo assim, distingue-se dos demais elementos;
d) “Sim, o povo ameaça o líder do povo.” (3º parágrafo)
Incorreto. "Do povo" atrela-se ao substantivo "líder", portanto tem valor de adjetivo e se classifica em adjunto adnominal;
e) “(...) mais caras quietas vão se reunindo às outras, como na fotografia de uma multidão em silêncio.” (3º parágrafo)
Incorreto. "Em silêncio" (equivalente ao adjetivo "silencioso") atrela-se ao substantivo "multidão", substantivo concreto, portanto tem valor de adjetivo e se classifica em adjunto adnominal.
Letra C
O artigo a, refere-se a garganta.
locução adjetiva, tem valor adjetivo
locução adjetiva = preposição + substantivo/advérbio
Complemento..
Para quem teve dúvida quanto à letra e).
Em alguns casos é possível trocar a locução adjetiva pelo adjetivo correspondente:
uma multidão em silêncio.
uma multidão silenciosa.
O nosso gabarito não permite, pois expressa o modo como o cidadão acorda.
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