Ao referir-se a “’baristas’ pós-graduados na Esalq e PhDs e...
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Q1285212
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“Master Gourmetização.” Desde que o picolé virou
“paleta”, muita água passou pelo moinho da
ressignificação. O cafezinho é hoje servido em
estabelecimentos com tecnologia da Nasa, por “baristas”
pós-graduados na Esalq e PhDs em “Mindfulness”, uma
conversa sobre cervejas deixa um simpósio de enólogos
parecendo papo de boteco e um mero brigadeiro tem
mais pedigree do que o cachorro da rainha da Inglaterra.
Pois neste programa – o Master Chef do marketing
contemporâneo – três grupos compostos por
profissionais de publicidade e comunicação competem
para reformular algo que ainda não tenha sido tocado
pelos ubíquos raios gourmetizadores. Digamos: o
aviãozinho de papel, o sertanejo universitário, o nabo. O
plano de ação deve incluir a descrição das lojas (ou
cooperativas ou coletivos ou comunidades ou...) dos
novos “produtos” e ações de marketing disfarçadas.
Como, por exemplo, plantar numa coluna social fotos do
Rodrigo Hilbert ou da Björk lançando seus aviõezinhos
de papel especialmente projetados por Philippe Starck e
customizados pelo Ai Weiwei. (Já vejo hipsters
radicalizando e dizendo que todo aviãozinho de papel
que tenha que dobrar o papel é uma concessão, que o
aviãozinho de raiz é o A4 intocado, o aviãozinho ideia, o
aviãozinho potência).
“Problematize já!”. Imagens ou frases aparentemente
neutras são mostradas para os telespectadores, que
deverão enviar vídeos de até dois minutos gravados em
seus celulares (na horizontal) provando que aquilo é
absolutamente ofensivo para algum grupo. Por exemplo,
a foto de um pardal comendo uma minhoca: “Escolher,
entre tantos pássaros que se alimentam de frutos ou
sementes justamente aquele que come minhoca é uma
tentativa de normalizar o carnivorismo e assinar embaixo
do agronegócio que...”. A foto de um paralelepípedo:
“Um igual ao outro, do lado do outro! Massificação!
Padronização! Comunismo! Vai pra Cuba!”. A frase “Ivo
viu a uva”: “A sentença ignora completamente toda a
população de deficientes visuais que jamais viu uma uva.
Por que não ‘Ivo tocou a uva’? Ou, para o caso de
pessoas sem mãos, quem sabe, ‘Ivo sentiu a presença da
uva’?” Um nabo: “Pouca vergonha! Isso aqui é um jornal
família, mais respeito com o cidadão de bem!”.
FONTE: “Programas de TV que não existirão”, Antônio Prata, Folha de São Paulo
Ao referir-se a “’baristas’ pós-graduados na Esalq e PhDs
em ‘Mindfulness’” o autor pretende