Nesse contexto, a educação deve ser encarada como um re...
Ver outras questões
Usar o filtro de questões
Ano: 2025
Banca:
COMPERVE - UFRN
Órgão:
Prefeitura de Natal - RN
Provas:
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Artes/Artes
|
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Artes/Artes Visuais |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Artes/Teatro |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Artes/Música |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Educação Física |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Ensino Religioso |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de História |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Geografia |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor Intérprete de Libras |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Matemática |
COMPERVE - UFRN - 2025 - Prefeitura de Natal - RN - Professor de Ciências da Natureza |
Q3227073
Não definido
Texto associado
O tempo da economia e o tempo da educação
Raphael Fagundes
O sociólogo Christian Laval levanta uma questão interessante: “O mercado exige
‘reações’ fortes, enquanto a solução para muitos dos problemas da educação demanda
decisões que funcionam no longo prazo”. Sem dúvida este é um dos motivos da crise da
educação.
O neoliberalismo tem como objetivo mercantilizar todas as manifestações humanas. Isso
porque F. A. Hayek criou uma espécie de “formação discursiva neoliberal” que pode ser
aplicada como episteme capaz de dar conta de diversas áreas. Para Hayek não pode haver
um planejamento econômico. O governo deve apenas “fixar normas determinando as
condições em que podem ser usados os recursos disponíveis, deixando aos indivíduos a
decisão relativa aos fins para os quais eles serão aplicados”. Ou seja, o governo não deve
promover um plano econômico com o objetivo de acabar com a fome, desenvolver a
tecnologia etc.
Na visão neoliberal, a economia é um “local” em que cada indivíduo irá extrair recursos
para saciar suas necessidades pessoais. Um lugar livre em que se compram ações, fazem-se
investimentos para se recolher os lucros. Se o indivíduo quiser criar uma instituição de
caridade, escolas etc., ele tem o direito de fazer isto com as quantias provenientes do seu
investimento. Por outro lado, “o Estado deve limitar-se a estabelecer normas aplicáveis a
situações gerais, deixando os indivíduos livres em tudo que depende das circunstâncias de
tempo e lugar, porque só os indivíduos poderão conhecer plenamente as circunstâncias
relativas a cada caso e a elas adaptar suas ações”.
Este mesmo discurso pode vir a ser aplicado a outras áreas, como na educação. A
educação acaba se tornando um bem privado. Não deve haver uma política educacional. O
Estado não deve investir na educação para formar cidadãos, pessoas críticas etc.
Nesse contexto, a educação deve ser encarada como um recurso usado por cada
indivíduo, visando atender suas necessidades privadas, como, por exemplo, a de arranjar uma
boa posição no mercado de trabalho. Assim sendo, ela deixa de ser um bem coletivo e tornase um bem individual, cuja lógica, importada da economia, provoca uma crise insolúvel na
política pública. Insolúvel no sentido de ser impossível resolvê-la dentro das próprias
premissas neoliberais.
A grande revolução capitalista foi a Revolução Industrial, mas antes dela já estava sendo
trabalhada uma alteração temporal no trabalho. A invenção do relógio foi fundamental. O
tempo de produção não estaria mais submetido às intempéries naturais. “O pequeno
instrumento que regulava os novos ritmos da vida industrial era, ao mesmo tempo, uma das
mais urgentes dentre as novas necessidades que o capitalismo industrial exigia para
impulsionar o seu avanço”, explica E. P. Thompson.
Sendo assim, o valor da mercadoria passou a ser determinado pelo tempo que leva para
ser produzida, ou seja, como pontuou Marx, “impõe-se o tempo de trabalho socialmente
necessário à sua produção, que é a lei natural reguladora, que não leva em conta pessoas […]
A determinação da quantidade do valor pelo tempo do trabalho é, por isso, um segredo oculto
sob os movimentos visíveis dos valores relativos das mercadorias”. As máquinas vieram
exatamente para produzir uma maior quantidade de mercadorias num menor período de tempo.
Diversos inventos foram criados com esse objetivo. A tecnologia pragmática está voltada para
essa visão econômica.
A partir de então, como destaca Harmut Rosa, “as transações monetárias modernas
facilitam, multiplicam e aceleram transações sociais e econômicas e, com isso, praticamente,
todas as relações sociais”. Antes, um problema que surgia no trabalho na sexta-feira, só seria
resolvido na segunda-feira da semana seguinte. Hoje, com a tecnologia criada para acelerar o
mundo, o trabalhador recebe uma mensagem no ônibus que pega para voltar para casa ou no
happy hour exigindo dele soluções para tratar da situação indesejada para os lucros finais da
empresa.
A educação entra nessa lógica. O indivíduo quer o resultado mais imediato possível, já
que o mundo ao seu redor está cada vez mais acelerado. Mas como algo que exige tempo
pode auxiliar um indivíduo que vive em um mundo imediatista?
Assim surgem os cursinhos. Os youtubers, com suas soluções mágicas, explicações
“simples” etc., faturam muito nessa economia totalizadora do curto prazo. Se tudo deve ser mercantilizado, tudo deverá ser acelerado. É possível adquirir cada vez mais conhecimento
num espaço de tempo cada vez menor? A indústria do conhecimento diz que é.
O desinteresse pela educação formal vem diminuindo por conta dessa lógica. O aluno
quer o resultado imediato, e isso é justamente o que a escola não pode fornecer. Na busca de
adequar a escola às exigências do mercado e de seus consumidores, as reformas
educacionais vêm tentando encontrar mecanismos que aceleram a produção de pessoas aptas
ao mercado de trabalho. Cursos de como fazer brigadeiros a como ser um influenciador digital
já estão tomando o espaço de disciplinas como História e Sociologia. Exatamente porque o
resultado é muito mais imediato.
Esse é um movimento antigo. Thompson mostra que, em 1772, já se “via a educação
como um treinamento para adquirir o ‘hábito do trabalho'”. O historiador inglês destaca que,
ainda no século XVIII, já se observava que “uma vez dentro dos portões da escola, a criança
entrava no novo universo do tempo disciplinado”. Com o advento de uma tecnologia voltada
para a eficiência (que, no capitalismo, é produzir mais em um período mais curto de tempo),
essa função da escola tornou-se mais necessária para o capital.
Alguns poderiam dizer que os Tigres Asiáticos seriam um exemplo positivo de
relacionamento entre educação e economia. Só esquecem que lá houve muito planejamento
econômico. Mariana Mazzucato mostra que foi “através do planejamento e políticas industriais
ativas [que os países do Leste Asiático] conseguiram se ‘equiparar’ tecnológica e
economicamente ao Ocidente”. Ou seja, o casamento entre educação e economia só funciona
longe da lógica neoliberal.
Rosa entende o tempo como uma dimensão central e constitutiva dos fenômenos da
modernidade. A aceleração social é um fenômeno crucial para entender o mundo moderno: “a
desintegração social seria, assim, uma consequência da crescente dessincronização social; a
destruição ambiental, uma consequência da sobrecarga do ciclo cronológico de regeneração
da natureza; a perda da individualidade ‘qualitativa’, um subproduto do aumento do ritmo da
vida; e o abandono da autonomia racional, resultado da ‘temporalização do tempo'”.
Onde isto vai parar? As fake news ganham espaço porque muitos preferem as
explicações curtas e objetivas sem uma reflexão mais pormenorizada dos fatos. Informações
são produzidas numa velocidade cada vez maior pelos próprios veículos confiáveis, porque é
necessário vender informação em um intervalo de tempo cada vez mais reduzido. A lógica
neoliberal está destruindo a educação, não porque se trata de uma conspiração dos donos do
capital por tornar as pessoas mais burras, mas porque a sua dinâmica é a aceleração. A
velocidade é um dos principais obstáculos para o conhecimento. Não será possível salvar a
educação, a menos que alteremos a lógica econômica que se impõe sobre todo o mundo.
Disponível em: https ://diplomatique.org.br/o-tempo-da-economia-e-o-tempo-da-educacao/. Aces so em: 09 nov.
2024. [Adaptado]
Nesse contexto, a educação deve ser encarada como um recurso usado por cada indivíduo, visando atender suas necessidades privadas, como, por exemplo, a de arranjar uma boa posição no mercado de trabalho. Assim sendo, ela deixa de ser um bem coletivo e torna-se um bem individual, cuja lógica, importada da economia, provoca uma crise insolúvel na política pública. Insolúvel no sentido de ser impossível resolvê-la dentro das próprias premissas neoliberais.
A palavra “encarada” pode ser substituída, sem que haja prejuízo de sentido, por
A palavra “encarada” pode ser substituída, sem que haja prejuízo de sentido, por