Em relação ao trecho “Eis que se aproxima o inverno, pelo m...
Olhador de anúncio
Eis que se aproxima o inverno, pelo menos nas revistas, cheias de anúncios de cobertores, lãs e malhas. O que é desenvolvimento! Em outros tempos, se o indivíduo sentia frio, passava na loja e adquiria os seus agasalhos. Hoje são os agasalhos que lhe batem à porta, em belas mensagens coloridas.
E nunca vêm sós. O cobertor traz consigo uma linda mulher, que se apresta para se recolher debaixo de sua “nova textura antialérgica”, e a legenda: “Nosso cobertor aquece os corpos de quem já tem o coração quente”. A mulher parece convidar-nos: “Venha também”. Ficamos perturbados. Faz calor, um calor daqueles. Mas a página aconchegante instala imediatamente o inverno, e sentimo-nos na aflita necessidade de proteger o irmão corpo sob a maciez desse cobertor, e...
Não. A mulher absolutamente não faz parte do cobertor, que é que o senhor estava pensando? Nem adianta telefonar para a loja ou para a agência de publicidade, pedindo endereço da moça do cobertor antialérgico de textura nova. Modelo fotográfico é categoria profissional respeitável, como outra qualquer. Tome juízo, amigo. E leve só o cobertor.
São decepções de olhador de anúncios. [...].
Mas sempre é bom tomar conhecimento das mensagens publicitárias. É o mundo visto através da arte de vender. “As lojas fazem tudo por amor". Já sabemos, pela estória do cobertormulher (uma palavra só) que esse tudo é muito relativo. "Em nossas vitrinas a japona é irresistível”. Então, precavidos, não passaremos diante das vitrinas. E essa outra mensagem é, mesmo, de alta prudência: “Aprenda a ver com os dois olhos”. Precisamos deles para navegar na maré de surrealismo que cobre outro setor da publicidade: “Na liquidação nacional, a casa x tritura preços”. Os preços virando pó, num país inteiramente líquido: vejam a força da imagem. Rara espécie animal aparece de repente: “Comprar na loja y é supergalinha-morta”.
Prosseguimos, invocados, sonhando “o sonho branco das noites de julho”. “Ponha uma onça no seu gravador". “A alegria está no açúcar”. “Pneu de ombros arredondados é mais pneu”. “Tip-Tip tem sabor de céu”. “Use nossa palmilha voadora". “Seus pés estão chorando por falta das meias Rouxinol, que rouxinolizam o andar”. “Neste relógio, você escolhe a hora”. “Ponha você neste perfume”. “Toda a sua família cabe neste refrigerador e ainda sobra lugar para o peru de Natal". “Sirva nossa lingerie como champanha; é mais leve e mais espumante”.
O olhador sente o prazer de novas associações de coisas, animais e pessoas; e esse prazer é poético. Quem disse que a poesia anda desvalorizada? A bossa dos anúncios prova o contrário. E ao vender-nos qualquer mercadoria, eles nos dão de presente “algo mais”, que é o produto da imaginação e tem serventia, as coisas concretas, que também de pão abstrato se nutre o homem.
ANDRADE, Carlos Drummond de. Rio de Janeiro: Record, 2005.
p. 151-2.
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Comentários
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a) ERRADO. O período afirma q "pelo menos", ou seja, o inverno está chegando ao menos na revista
b) ERRADO. É artigo.
c) ERRADO.
d) ERRADO. É nova ortografia e não assassinato da antiga kkkkkkk
e) CORRETO. Sujeito deslocado, reescrevendo "Eis que o inverno se aproxima. "
Erro bobo meu kkkkk
fui de A (meu Deus)
O Gab. é E mesmo.
Considerando que a colega Valnisia Bezerra, não decifrou o erro o ítem "C", acredito que se houvesse uma virgula após a palavra "Eis"
daria uma intenção de aposto, à vista de um certo modo não teria nexo de concordância nenhuma com o resto da frase.
Exemplo: “Eis, que se aproxima o inverno, pelo menos nas revistas, cheias de anúncios de cobertores, lãs e malhas
Assim, é só apagar o texto sublinhado e veja se há alguma concordância frasal.
Exemplo: “Ei, (...) pelo menos nas revistas, cheias de anúncios de cobertores, lãs e malhas
#VOUSERDELTA
o que se aproxima?
o inverno!!!
a forma verbal APROXIMA concorda com O INVERNO.
Na verdade EIS QUE é uma locução que passou a ser causal, sobretudo nos meios forenses. O seu significado, neste caso, é igual a visto que, já que, uma vez que, porquanto:
Foi-lhe dado o direito de aduzir suas razões, eis que a ampla defesa é essencial à legitimidade do processo.
http://www.linguabrasil.com.br/nao-tropece-detail.php?id=694
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