Leia as proposições sobre as ideias do texto e marque a alte...
Leia o texto a seguir para responder às questões de 1 a 7.
O padeiro
- Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento — mas
- não encontro o pão costumeiro. No mesmo instante me lembro de ter lido alguma coisa nos jornais da véspera sobre
- a “greve do pão dormido”. De resto não é bem uma greve, é um lock-out, greve dos patrões, que suspenderam o
- trabalho noturno; acham que obrigando o povo a tomar seu café da manhã com pão dormido conseguirão não sei bem
- o que do governo.
- Está bem. Tomo o meu café com pão dormido, que não é tão ruim assim. E enquanto tomo café vou me lembrando
- de um homem modesto que conheci antigamente. Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele apertava a
- campainha, mas, para não incomodar os moradores, avisava gritando:
- —Não é ninguém, é o padeiro!
- Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de gritar aquilo?
- “Então você não é ninguém?”
- Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a campainha
- de uma casa e ser atendido por uma empregada ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha lá de dentro
- perguntando quem era; e ouvir a pessoa que o atendera dizer para dentro: “não é ninguém, não, senhora, é o padeiro”.
- Assim ficara sabendo que não era ninguém…
- Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis detê-lo para explicar que estava
- falando com um colega, ainda que menos importante. Naquele tempo eu também, como os padeiros, fazia o trabalho
- noturno. Era pela madrugada que deixava a redação de jornal, quase sempre depois de uma passagem pela oficina —
- e muitas vezes saía já levando na mão um dos primeiros exemplares rodados, o jornal ainda quentinho da máquina,
- como pão saído do forno.
- Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me julgava importante porque no jornal que levava para
- casa, além de reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu nome. O jornal
- e o pão estariam bem cedinho na porta de cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade daquele
- homem entre todos útil e entre todos alegre; “não é ninguém, é o padeiro!” E assobiava pelas escadas.
BRAGA, Rubem. 200 crônicas escolhidas. 27 ed. Rio de Janeiro: Record, 2010.p. 319.
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