A partir do trecho: "Levanto cedo, faço minhas abluções, po...

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Q2170921 Português
TEXTO 01

O Padeiro

Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento - mas não encontro o pão costumeiro. No mesmo instante me lembro de ter lido alguma coisa nos jornais da véspera sobre a "greve do pão dormido". De resto não é bem uma greve, é um lock-out, greve dos patrões, que suspenderam o trabalho noturno; acham que obrigando o povo a tomar seu café da manhã com pão dormido conseguirão não sei bem o que do governo.

Está bem. Tomo o meu café com pão dormido, que não é tão ruim assim. E enquanto tomo café vou me lembrando de um homem modesto que conheci antigamente. Quando vinha deixar o pão à porta do apartamento ele apertava a campainha, mas, para não incomodar os moradores, avisava gritando:

- Não é ninguém, é o padeiro!

Interroguei-o uma vez: como tivera a ideia de gritar aquilo?

"Então você não é ninguém?"

Ele abriu um sorriso largo. Explicou que aprendera aquilo de ouvido. Muitas vezes lhe acontecera bater a campainha de uma casa e ser atendido por uma empregada ou outra pessoa qualquer, e ouvir uma voz que vinha lá de dentro perguntando quem era; e ouvir a pessoa que o atendera dizer para dentro: "não é ninguém, não, senhora, é o padeiro". Assim ficara sabendo que não era ninguém...

Ele me contou isso sem mágoa nenhuma, e se despediu ainda sorrindo. Eu não quis detê-lo para explicar que estava falando com um colega, ainda que menos importante. Naquele tempo eu também, como os padeiros, fazia o trabalho noturno. Era pela madrugada que deixava a redação de jornal, quase sempre depois de uma passagem pela oficina - e muitas vezes saía já levando na mão um dos primeiros exemplares rodados, o jornal ainda quentinho da máquina, como pão saído do forno.

Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me julgava importante porque no jornal que levava para casa, além de reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou artigo com o meu nome. O jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade daquele homem entre todos útil e entre todos alegre; "não é ninguém, é o padeiro!" E assobiava pelas escadas.


Rubem Braga. Para gostar de ler. São Paulo: Ática, 1989, p. 63-64.
A partir do trecho: "Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento - mas não encontro o pão costumeiro.", podemos inferir que:
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A banca pede um inferência a partir de um trecho transcrito em seu enunciado Levanto cedo, faço minhas abluções, ponho a chaleira no fogo para fazer café e abro a porta do apartamento - mas não encontro o pão costumeiro. O gabarito tido como correto é As pessoas não se importam com quem faz o pão, mas apenas ao fato de tê-lo à mão. No entanto, não é possível inferir isso a partir do trecho do enunciado sem se valer do texto em sua integralidade. Ou seja, o inferência de que as pessoas não se importam com que faz o pão está fora do trecho transcrito no enunciado que somente narra as ações da personagem sem qualquer juízo de valor em relação a outras pessoas. Questão mal formulada.

"mas não encontro o pão costumeiro" Obviamente infere, somente neste trecho, que as pessoas não se importam com quem faz o pão, se algo aconteceu com quem levava o pão e sim só a falta do alimento que importa!

"Não encontro o pão costumeiro". Ou seja, nesse contexto, o pão é mais importante do que a pessoa que o fez.

A banca foi muito sorrateira aqui , ao meu entender seria impossivel se chegar a essa conclusão complexa lendo apenas esse trecho dado, como o enunciado quer indicar....

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