“Rouba-se tanto porque a carne não se satisfaz com pouco [....
A CARNE
Temos, ai de nós, uma Polícia Federal satírica. Não sei se existe alguém na PF encarregado de dar codinomes aos seus investigados e nomes às suas operações. Se tiver, é um novo Jonathan Swift, um Voltaire redivivo. Deveria se identificar, para receber nossos aplausos. Essa de chamar de Carne Fraca a operação contra a corrupção nos frigoríficos e o escândalo dos fiscais da indústria de alimentos que recebiam propina para não fiscalizar nada é genial. A ação poderia se chamar Carne Podre, ou Nome aos Bois, mas aí não teria o mesmo valor literário e irônico. Carne Fraca é perfeito. Serviria mesmo para todo o conjunto das ações policiais e jurídicas a partir do começo da Lava Jato.
A corrupção existe, afinal, porque a carne é fraca. Como disse o Oscar Wilde – outro que teria emprego garantido como frasista na Polícia Federal –, “eu resisto a tudo menos à tentação”. A tentação é demais. Somos pobres almas inocentes reféns da nossa própria carne e das suas fraquezas. De certa maneira, Carne Fraca é quase uma absolvição da corrupção epidêmica que assola o país. Rouba-se tanto porque a carne não se satisfaz com pouco, é incapaz de se contentar com o que já tem. Porque a carne é insaciável.
Nenhum corrupto racionaliza a sua fome de ter mais, sempre mais. Nenhum decide: quero tanto e chega. Tenho um Lanborghini e dois Porsches, um para cada pé, piscina aquecida em forma de trevo, uma mulher com menos dedos e orelhas do que o necessário para usar todas as joias que lhe dou, contas na Suíça e em Liechtenstein, apartamento em Palm Beach – e pronto. Não preciso de nem um centavo a mais.
O centavo a mais é a perdição dos nossos corruptos.O centavo a mais é a tentação irresistível de Wilde resumida numa frase. O centavo a mais é uma metáfora para o excesso., para não saber quando parar. É difícil identificar o momento em que a ganância transborda e o centavo a mais bate na porta do corrupto e o leva coercitivamente para a cadeia, o corte zero do seu cabelo, as manchetes dos jornais e a execração pública. É um pouco como o paradoxo do balão: só se descobre a capacidade máxima de um balão, o ponto em que um sopro a mais o estouraria, quando o sopro a mais é dado e ele estoura. Só se descobre quando era o momento de parar de roubar quando o momento já passou.
“Carne Fraca” tem algo até de carinhoso, na sua ironia. A Polícia Federal, ou o autor do nome da operação, reconhece que não é fácil deixar de roubar, com tanto dinheiro voando por aí, com tantas oportunidades que o Brasil oferece para a maracutaia e o molha a mão. O que Carne Fraca diz é que a Polícia Federal não perdoa, mas entende.
VERÍSSIMO, Luis Fernando. A carne. Gazeta do Povo, Curitiba, p. 14. 23 março 2017.
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Análise da Questão:
A questão apresentada envolve interpretação de texto, mais especificamente a substituição de um termo por outro, mantendo o sentido original pretendido pelo autor. Nesse caso, o termo a ser substituído é "carne".
Estratégia de Resolução:
Para resolver essa questão, é importante entender o sentido figurado que o autor atribui à palavra "carne". No texto, "carne" é utilizada como uma metáfora para os desejos e fraquezas humanas, especialmente no contexto da corrupção. A expressão "a carne é fraca" é uma metáfora amplamente usada para indicar a fraqueza do ser humano diante de tentações.
Alternativa Correta:
A - ser humano, indivíduo.
Essa é a alternativa correta porque a palavra "carne" no contexto do texto se refere a características humanas, como desejos e fraquezas. Portanto, substituir "carne" por "ser humano" ou "indivíduo" mantém o sentido original do texto.
Análise das Alternativas Incorretas:
B - produto, indivíduo. O termo "produto" não se encaixa no contexto, pois o texto não trata de produtos, mas sim de características humanas.
C - servidor público, colaborador. Estas palavras não mantêm o sentido original de "carne" como metáfora para a fraqueza humana; além disso, reduzem o conceito a um grupo específico, o que não é o caso no texto.
D - animal, ser humano. Apesar de "ser humano" estar correto, "animal" não é adequado, pois "carne" não faz referência a seres irracionais no texto.
E - ser humano, número. "Número" não mantém o sentido de fraqueza ou desejo humano, portanto, não é uma substituição válida.
Conclusão:
A leitura cuidadosa e a compreensão do contexto são essenciais para questões de interpretação de texto. Lembre-se de identificar o sentido figurado e os marcadores discursivos que ajudam a compreender o que o autor realmente quer comunicar.
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Comentários
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Questão que está envolvendo os conhecimento de anáfora (retomada de um termo anterior) e sinônimo. Esses recursos permitem a não repetição de elementos, assim o texto fica mais enriquecido.
Carne - Na frase, está referindo-se à pessoa(ser humano)
Analisando as alternativas
b) produto, indivíduo.
Errada. Produto (Não), indivíduo (SIM)
c) servidor público, colaborador.
Errada. Ambos os termos estão muito especificados referindo-se a um grupo de pessoas qualificadas.
d) animal, ser humano.
Errada. Animal(não) , ser humano(sim)
e) ser humano, número.
Errada.ser humano(sim),número(NÃO).
Gab.: A
ser humano, indivíduo.
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