Ao ser transposto para o discurso indireto, o trecho Entre a...
O casamento, para ela, era isso: quarenta e oito anos de opressão, de humilhações, de vexames. Um verdadeiro tirano, o marido dela, um homem autoritário que lhe dava ordens sem cessar e que a ridicularizava na frente de todo o mundo: minha mulher é um desastre, proclamava, não faz nada direito.
E ela? Ela calava. Jamais protestara. Até os filhos se indignavam com aquela passividade: você não pode se deixar dominar dessa maneira, diziam, você tem de fazer alguma coisa. Ela suspirava, resignada, não dizia nada.
Mas estava, sim, resolvida a se vingar. Sua vingança seria cruel e requintada, uma vingança capaz de indenizá-la por uma vida de sofrimentos. Só faltava descobrir a maneira de fazê-lo.
A ideia lhe ocorreu quando, uma manhã, o marido perguntou se ela não vira seu cachimbo. Entre parênteses, gostava muito disso, de fumar cachimbo. Verdade que a ela o cheiro deixava tonta; mas ele pouco estava ligando. Entre a mulher e o cachimbo prefiro o cachimbo, costumava dizer, entre gargalhadas. Mas então ele tinha esquecido onde deixara o cachimbo − sinal de que a memória lhe falhava. E ela resolveu tirar proveito disso. Para quê? Para enlouquecer o marido. Exatamente: enlouquecê-lo. Era o mínimo a que podia almejar.
E aí começou o jogo. Onde está o cachimbo, perguntava ele. Ali onde você o colocou, dizia ela, em cima do televisor.
Ele ficava perplexo: eu coloquei o cachimbo em cima do televisor? E por que teria feito isso, se ali não é lugar de cachimbo? Quanto mais perturbado ele ficava, mais ela se entusiasmava. Era como uma gata brincando com um camundongo, um camundongo triste e desamparado. Você não viu o meu cachimbo? Está ali na prateleira, onde você o deixou. Eu? Eu deixei o cachimbo na prateleira? A coisa ia num crescendo, a angústia dele aumentando sempre. Ela já tinha o final planejado: um dia o cachimbo sumiria para sempre. E quando ele perguntasse ela responderia: você o jogou fora. O que seria um golpe... mortal? Mortal.
Só que ele morreu antes disso. Um ataque do coração, provavelmente. Ela chorou muito: em parte porque tinha pena dele, em parte porque não pudera consumar sua vingança. Mas aí teve uma ideia: colocar o cachimbo no caixão. Para atormentá-lo pela eternidade afora. Procurou o cachimbo, mas não o achou. Simplesmente não conseguia lembrar de onde o colocara. Ali, em alguma parte da casa, estava o maldito objeto. Só que ela não o encontrava. E isto significava que jamais teria paz. Que aquela lembrança a torturaria até a morte.
(SCLIAR, Moacir. O imaginário cotidiano. São Paulo: Global, 2002, p. 113-114)
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Para resolver esta questão, precisamos compreender o tema gramatical envolvido: a transposição do discurso direto para o discurso indireto. Vamos focar na transformação correta da frase apresentada no texto original.
No discurso direto, as falas são apresentadas exatamente como foram ditas, geralmente entre aspas ou com travessão.
No discurso indireto, as falas são integradas à narrativa, sem as marcas típicas do discurso direto, como aspas ou travessões, e requerem algumas mudanças, principalmente em tempos verbais e pronomes.
O trecho original em discurso direto é: “Entre a mulher e o cachimbo prefiro o cachimbo, costumava dizer.”
Para transformá-lo em discurso indireto, precisamos retirar as aspas e ajustar a frase para que ela se encaixe na narrativa de forma indireta. Assim, a frase correta deve ser:
B - Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo.
Agora, vamos analisar as razões pelas quais esta é a alternativa correta e por que as outras não são:
Alternativa A: Ele costumava dizer: − Entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo.
Incorreta porque ainda mantém a estrutura de discurso direto, com o uso de travessão e não realiza a transposição para o discurso indireto.
Alternativa C: Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, prefere o cachimbo.
Incorreta devido ao uso do tempo verbal "prefere", que não concorda com a mudança para o discurso indireto. O correto seria usar o pretérito imperfeito "preferia".
Alternativa D: Ele costumava dizer: − Entre a mulher e o cachimbo, prefiro o cachimbo.
Incorreta por manter a estrutura de discurso direto, com o uso de travessão e sem a transposição adequada.
Alternativa E: Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferiria o cachimbo.
Incorreta porque "preferiria" está no futuro do pretérito, o que altera o sentido original da frase, que não expressa condição ou hipótese.
Quando realizamos a transposição do discurso direto para o indireto, é essencial ajustar os tempos verbais para que a frase mantenha seu sentido original, mas se encaixe na narrativa de forma indireta. Isso envolve, muitas vezes, uma mudança para o pretérito imperfeito, como foi o caso aqui.
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Discurso direto= em 1ª pessoa.
Discurso indireto= em 3ª pessoa.
Gabarito: letra B "Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo."
Para transpor o trecho “Entre a mulher e o cachimbo prefiro o cachimbo, costumava dizer” para o discurso indireto, precisamos considerar algumas regras, como a mudança do tempo verbal e a omissão dos sinais de pontuação típicos do discurso direto.
Análise das Alternativas
A. Ele costumava dizer: − Entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo.
- Explicação: Incorreta. Mantém a forma do discurso direto e não transforma corretamente a fala.
B. Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo.
- Explicação: Correta. Transforma o discurso corretamente para o indireto, mudando o tempo verbal de "prefiro" para "preferia".
C. Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, prefere o cachimbo.
- Explicação: Incorreta. Mantém o tempo verbal "prefere", que não é adequado para o discurso indireto.
D. Ele costumava dizer: − Entre a mulher e o cachimbo, prefiro o cachimbo.
- Explicação: Incorreta. Novamente, mantém a estrutura do discurso direto.
E. Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferiria o cachimbo.
- Explicação: Incorreta. Utiliza o condicional "preferiria", que não se adequa ao contexto original.
Conclusão
A alternativa correta é:
B - Ele costumava dizer que, entre a mulher e o cachimbo, preferia o cachimbo.
Essa opção reflete corretamente a transposição do discurso direto para o indireto, mantendo a coerência do tempo verbal. Se precisar de mais alguma coisa, estou à disposição!
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