Ainda no terceiro parágrafo, ao se referir ao “crime” de Tir...
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Ano: 2024
Banca:
FAUEL
Órgão:
Câmara de Munhoz de Mello - PR
Prova:
FAUEL - 2024 - Câmara de Munhoz de Mello - PR - Advogado |
Q3068130
Português
Texto associado
Considere atentamente a crônica a seguir, escrita por Rachel de Queiroz e publicada originalmente na década
de 1980, para responder à questão.
Voto nulo, a pior opção para o eleitor
Esses meninos que se bateram tanto pelo voto aos dezesseis anos, esses outros, mais velhos, que foram
às ruas nas passeatas durante as campanhas pelas eleições diretas; todos os cidadãos que exigiam nos
palanques o seu direito de votar, como é que agora renunciam a tudo e se embalam com a ideia leviana do voto
nulo? Ninguém entende.
Jogam fora esse direito de votar – quer dizer, o seu direito de escolher os homens e mulheres que vão
mandar em todos nós. Não sabem esses tolos que estarão cometendo um crime contra si mesmos e contra o
Brasil nesse ato estúpido de votar nulo, votar em branco, votar num bicho do jardim zoológico, como o
rinoceronte Cacareco, anos atrás, ou o macaco Tião agora; ou o mosquito, no Espírito Santo. Ninguém lembra
(ou será que não sabem?) de quanto sangue foi derramado, quanta prisão, forca, fuzilamentos,
esquartejamentos – quantos mártires tivemos na nossa história por amor desse direito de cidadania. Que agora
se despreza e se quer atirar no lixo, votando em bichos brutos, em anticandidatos ou simplesmente votando em
branco.
Para que hoje você, pobre ou rico, negro, índio ou branco, moço ou velho, homem ou mulher, pudesse
votar livremente, morreu muita gente. Recordo o nome do Bequimão, no Maranhão, enforcado. Felipe dos
Santos, em Minas Gerais, enforcado, arrastado, esquartejado. O Tiradentes, enforcado e esquartejado, no Rio
de Janeiro, com os seus membros mutilados expostos ao longo da estrada de Minas e a cabeça degolada em
poste de ignomínia naquela mesma Vila Rica onde o seu “crime” fora cometido. E Frei Caneca, no Recife. E
Tristão Gonçalves, Carapinima e Bolão, no Ceará, fuzilados pelos imperiais na repressão à Confederação do
Equador. Isso só para recordar os mais famosos. Muito mais que esses foram os esquecidos, os sem nome,
que deram vida, sangue, haveres, por amor dessa cidadania que você atira fora – como se ela não passasse
de uma piada!
Cada voto que você não dá, que você estraga e anula, para mostrar que está desenganado ou está com
raiva, sim, cada voto que se perde é um voto a mais que se conta para os politiqueiros, para os caudilhos
inimigos da nossa liberdade e dos nossos direitos. Voto ruim, candidato ruim, só se combate com voto bom,
voto certo. É um pelo outro, não há mais opção. Se na nossa terra o candidato a prefeito ou vereador não
merece confiança, não é votando em branco ou votando em bicho que você derruba esse mau candidato. Pelo
contrário: o seu voto é nulo mesmo, não será contado. Mas o voto que o candidato ruim comprou ou ganhou
com suas falsas promessas, esse voto será contado e acaba elegendo o sujeito. Por culpa de quem? Por culpa
de você mesmo, que não se opôs, naquelas mesmas urnas, com o seu voto consciente contra o voto errado
dos outros.
Eleição é assunto muito sério. O voto é a única arma que nós temos para defender o nosso direito. Se o
povo vota errado, o culpado não é o voto. O culpado é quem não soube votar.
Em tempo de eleição o poder não está nas mãos do governo, nem dos políticos. Não veem como nessa
hora eles nos bajulam, nos adulam, nos fazem promessas, tentam nos comprar, nos ameaçar, nos seduzir de
qualquer modo? É porque, de voto na nossa mão, o poder somos nós. Nós é que fazemos e desfazemos. Que
escolhemos ou escorraçamos. Nós é que somos o rei, em dia de eleição. Nós, com aquela cruzinha riscada junto
ao nome da nossa escolha, com o voto secreto enfiado na urna, nós – só nós e mais ninguém – é que vamos
decidir se o Brasil muda ou fica nesta tristeza e nesta confusão em que está, a fome nos batendo à porta, a
inflação, como lobisomem, nos comendo a carne e o futuro à nossa frente fechado e preto como um dia sem sol.
(“Voto nulo, a pior opção para o eleitor”, por Rachel de Queiroz, com adaptações)
Ainda no terceiro parágrafo, ao se referir ao “crime” de Tiradentes, a escritora optou por apresentar esse
substantivo entre aspas. Isso se deu porque, nesse caso, a autora do texto: