Releia os fragmentos a seguir e, em seguida, assinale a alt...
Como nasce uma história
Fernando Sabino
Quando cheguei ao edifício, tomei o elevador que serve do primeiro ao décimo quarto andar. Era pelo menos o que dizia a tabuleta no alto da porta.
— Sétimo — pedi.
Eu estava sendo aguardado no auditório, onde faria uma palestra. Eram as secretárias daquela companhia que celebravam o Dia da Secretária e que, desvanecedoramente para mim, haviam-me incluído entre as celebrações.
A porta se fechou e começamos a subir. Minha atenção se fixou num aviso que dizia:
É expressamente proibido os funcionários, no ato da subida, utilizarem os elevadores para descerem.
Desde o meu tempo de ginásio sei que se trata de
problema complicado, este do infinitivo pessoal.
Prevaleciam então duas regras mestras que deveriam
ser rigorosamente obedecidas, quando se tratava do
uso deste traiçoeiro tempo de verbo. O diabo é que as
duas não se complementavam: ao contrário, em certos
casos francamente se contradiziam. Uma afirmava que
o sujeito, sendo o mesmo, impedia que o verbo se
flexionasse. Da outra infelizmente já não me lembrava.
Bastava a primeira para me assegurar de que, no caso,
havia um clamoroso erro de concordância.
Mas não foi o emprego pouco castiço do infinito pessoal que me intrigou no tal aviso: foi estar ele concebido de maneira chocante aos delicados ouvidos de um escritor que se preza.
Ah, aquela cozinheira a que se refere García Márquez, que tinha redação própria! Quantas vezes clamei, como ele, por alguém que me pudesse valer nos momentos de aperto, qual seja o de redigir um telegrama de felicitações. Ou um simples aviso como este:
É expressamente proibido os funcionários…
Eu já começaria por tropeçar na regência, teria de consultar o dicionário de verbos e regimes: não seria aos funcionários? E nem chegaria a contestar a validade de uma proibição cujo aviso se localizava dentro do elevador e não do lado de fora: só seria lido pelos funcionários que já houvessem entrado e portanto incorrido na proibição de pretender descer quando o elevador estivesse subindo. Contestaria antes a maneira ambígua pela qual isto era expresso:
… no ato da subida, utilizarem os elevadores para descerem.
Qualquer um, não sendo irremediavelmente burro,
entenderia o que se pretende dizer neste aviso. Pois
um tijolo de burrice me baixou na compreensão,
fazendo com que eu ficasse revirando a frase na
cabeça: descerem, no ato da subida? Que quer dizer
isto? E buscava uma forma simples e correta de
formular a proibição:
É proibido subir para depois descer.
É proibido subir no elevador com intenção de descer.
É proibido ficar no elevador com intenção de descer, quando ele estiver subindo.
Descer quando estiver subindo! Que coisa difícil, meu Deus. Quem quiser que experimente, para ver só. Tem de ser bem simples:
Se quiser descer, não tome o elevador que esteja subindo.
Mais simples ainda:
Se quiser descer, só tome o elevador que estiver descendo.
De tanta simplicidade, atingi a síntese perfeita do que Nelson Rodrigues chamava de óbvio ululante, ou seja, a enunciação de algo que não quer dizer absolutamente nada:
Se quiser descer, não suba.
Tinha de me reconhecer derrotado, o que era
vergonhoso para um escritor.
Foi quando me dei conta de que o elevador havia
passado do sétimo andar, a que me destinava, já
estávamos pelas alturas do décimo terceiro.
— Pedi o sétimo, o senhor não parou! — reclamei.
O ascensorista protestou:
— Fiquei parado um tempão, o senhor não desceu. Os outros passageiros riram:
— Ele parou sim. Você estava aí distraído.
— Falei três vezes, sétimo! sétimo! sétimo!, e o senhor nem se mexeu — reafirmou o ascensorista.
— Estava lendo isto aqui — respondi idiotamente, apontando o aviso. Ele abriu a porta do décimo quarto, os demais passageiros saíram.
passageiros saíram. — Convém o senhor sair também e descer noutro elevador. A não ser que queira ir até o último andar e na volta descer parando até o sétimo.
— Não é proibido descer no que está subindo? Ele riu:
— Então desce num que está descendo
— Este vai subir mais? — protestei: — Lá embaixo está escrito que este elevador vem só até o décimo quarto.
— Para subir. Para descer, sobe até o último.
— Para descer sobe?
Eu me sentia um completo mentecapto. Saltei ali mesmo, como ele sugeria. Seguindo seu conselho, pressionei o botão, passando a aguardar um elevador que estivesse descendo. Que tardou, e muito. Quando finalmente chegou, só reparei que era o mesmo pela cara do ascensorista, recebendo-me a rir:
— O senhor ainda está por aqui? E fomos descendo, com parada em andar por andar. Cheguei ao auditório com 15 minutos de atraso. Ao fim da palestra, as moças me fizeram perguntas, e uma delas quis saber como nascem as minhas histórias. Comecei a contar:
— Quando cheguei ao edifício, tomei o elevador que serve do primeiro ao décimo quarto andar. Era pelo menos o que dizia a tabuleta no alto da porta.
Texto extraído de: SABINO, Fernando. A Volta Por
Cima. Editora Record: Rio de Janeiro, 1990, p. 137
Releia os fragmentos a seguir e, em seguida, assinale a alternativa CORRETA quanto ao emprego de "que:"
I. "Minha atenção se fixou num aviso que dizia [...]".
II. "Desde o meu tempo de ginásio sei que se trata de problema complicado [...]".
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O tema central dessa questão é o uso do "que", um elemento bastante versátil na língua portuguesa. Ele pode atuar como pronome relativo, conjunção subordinativa, entre outros. Para resolver a questão, é necessário compreender a função que este termo desempenha em contextos específicos, reconhecendo a diferença entre orações explicativas, restritivas e subordinadas.
Alternativa Correta: B
No fragmento II, "Desde o meu tempo de ginásio sei que se trata de problema complicado [...]", o "que" está ligando a oração principal "sei" à oração subordinada substantiva objetiva direta "que se trata de problema complicado". Aqui, o "que" funciona como conjunção subordinativa, pois introduz uma oração que completa o sentido do verbo "sei".
Por que as outras alternativas estão incorretas?
Alternativa A: Em I ("Minha atenção se fixou num aviso que dizia [...]"), o "que" funciona como pronome relativo, mas ele introduz uma oração subordinada adjetiva restritiva, não explicativa. As orações restritivas especificam ou delimitam o sentido de um termo anterior, enquanto as explicativas acrescentam uma informação adicional.
Alternativa C: Embora a função do "que" em I seja a de pronome relativo, ele introduz uma oração adjetiva restritiva, não uma oração subordinada substantiva.
Alternativa D: No fragmento II, o "que" não funciona como pronome relativo. A função de conectar duas orações de forma que uma delas dependa da outra para completar seu sentido é típica de uma conjunção subordinativa, não de um pronome relativo.
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Comentários
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Temos o verbo "ser" em II que pede um objeto direto. Esse vem introduzido pelo "que" inciando a oração subordinada substantiva objetiva direta. "Que" faz papel de conjunção integrante.
Gabarito letra B!
"Desde o meu tempo de ginásio sei ISSO
Quando substituímos o "que' e couber o "isso" estamos diante de uma conjunção integrante que originou uma oração subordinada substantiva objetiva direta, pois é complemento do ver saber(SEI), quem sabe(sabe alguma coisa), sei (Algo) VTD.
Gabarito: Letra B
Gab. B.
A) Em I, o item lexical “que” funciona como pronome relativo, já que introduz uma oração explicativa. (errada. Introduz uma oração restritiva).
B) GABARITO.
C) Em I, o item lexical “que” funciona como pronome relativo, introduzindo uma oração subordinada substantiva restritiva. (errada. O "que", quando pronome relativo, introduzirá, sempre, uma oração subordinada adjetiva podendo ser explicativa ou restritiva. Nesse caso, o "que" introduz uma oração subordinada adjetiva restritiva).
D) Em II, o item lexical “que” funciona como pronome relativo cujo papel é somente ligar duas orações. (errada. o "que" é uma conjunção integrante. Observe: "sei que se trata de problema complicado" = sei ISSO. Quando o "que" for trocado por isso/disso/nisso, ele será uma conjunção integrante. Aliás, normalmente quando o "que" vem posposto a um verbo esse "que" será conjunção integrante).
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Bons estudos, guerreiro(a)!
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