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Ano: 2023
Banca:
FUNCERN
Órgão:
Prefeitura de Junco do Seridó - PB
Provas:
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Pedagogo
|
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Professor – Educação Infantil |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Professor – Ensino Fundamental |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Professor De Educação Física |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Professor Para Sala De Recursos Multifuncionais (SRM) |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Nutricionista Escolar |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Psicólogo Escolar |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Assistente Social Educacional |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Biomédico |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Fisioterapeuta |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Médico PSF |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Médico Plantonista |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Médico Veterinário |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Nutricionista |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Psicólogo |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Terapeuta ocupacional |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Educador Físico |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Enfermeiro |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Assistente Social |
FUNCERN - 2023 - Prefeitura de Junco do Seridó - PB - Psicólogo CRAS e CREAS |
Q2195769
Português
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A questão referem-se ao texto abaixo.
TEXTO 01
“Eles não são mais índios...”
A possibilidade de uma vida indígena foi cada vez mais dificultada, dado o avanço da 'civilização'
sobre suas terras
Por Maria Luiza Santos Soares,
jornalista e mestre em comunicação.
“Eles não são mais índios… eles perderam a sua cultura”. Esta frase recorrente no seio da sociedade
brasileira faz parte de uma herança, cuja origem remonta à descoberta do Novo Mundo pelos navegadores
portugueses e espanhóis. Desde então, a ideia acerca dos povos indígenas vem sendo construída através
de um olhar nostálgico, reservando-lhes um lugar que não cabe no espaço contemporâneo. Este
estranhamento, no entanto, foi construído historicamente, desde os primeiros relatos dos colonizadores,
passando pelos escritos iluministas de Russeau, Rotherdan e Morus, pela literatura romântica brasileira do
século XIX, aos dias de hoje.
Por isso ainda é comum a ironia diante de um indígena utilizando um automóvel do ano, um celular,
ou um computador. Esta visão também bebeu na fonte de textos bíblicos, como se os povos ameríndios
fossem os verdadeiros habitantes do Éden, mantendo fora da história tudo que estivesse relacionado com
eles. Não é por nada que demarcação das terras indígenas atiça setores da elite com o mesmo discurso
“muita terra para pouco índio”.
Que índio é este, vestido com roupas de branco?” É o que dizem muitas pessoas ao encontrarem
famílias Kaingang e Guarani vendendo seu artesanato no Brique da Redenção aos domingos em Porto
Alegre. De todos os absurdos que podem ser atribuídos a eles, este certamente é o mais cruel. Não são mais
índios por quê? Por que perderam sua cultura? Por que não passeiam em trajes típicos neste paraíso tão
almejado pelos conquistadores lá nos mil e quinhentos?
E o que significa ser indígena? Ao consideramos que, originariamente, os povos que aqui se
desenvolveram estavam intimamente ligados ao meio ambiente, a crueldade aumenta ainda mais. No Rio
Grande do Sul, cada etnia vivia em um determinado ecossistema. Enquanto alguns grupos habitavam os
campos, Charruas e os Minuanos, os Guarani viviam na Mata Atlântica e os Kaingang, no Planalto Meridional
– cada qual dispondo dos recursos naturais à sua volta. Mais de que um bioma em si, não se tratava apenas
de uma questão de sustentabilidade material. Existia uma raiz cultural na relação com o espaço que
ocupavam. Eles desconheciam a terra como propriedade privada. Seu valor não era o do mercado. Para os
povos originários, a terra tem um caráter místico e cosmológico, por isso nenhum lugar é igual a outro. Pela
mesma razão, estão reunidos hoje em Brasília no Acampamento Terra Livre. Querem suas terras ancestrais
e o direito de continuarem sendo indígenas, preconizado pela Constituição brasileira – Aliás, direito ainda hoje
questionado pelas elites conservadoras e seu governo despótico, interessados no que há acima e abaixo das
terras indígenas.
A dita “perda da cultura”, portanto, está ligada à invasão de suas terras. Como realizar todos os rituais
das diferentes etnias sem os elementos da natureza que deram origem às suas crenças e costumes? Por
isso fica difícil entender por que, no Rio Grande do Sul, estado onde prevalecem culturas estrangeiras
preservadas até hoje, não se respeita a cultura originária. Talvez, no fundo, seja mesmo uma profunda
dificuldade de uns se colocarem no lugar de outros.
O antropólogo Claude Lévi-Strauss revelou às Nações Unidas, por meio de um discurso proferido em
1959, que “a diversidade deve ser salva”, sugerindo que não se pode mais enxergar o indígena com os olhos
dos conquistadores. Ao valorizar somente seu passado, repete-se o mesmo equívoco: o de estacionar nosso
imaginário naquele tempo passado, fixado na ideia de preservação de uma cultura, como se ela fosse
inexorável. Tudo muda e tudo flui, como bem nos ensinou Heráclito.
Darcy Ribeiro em “O índio e a civilização” (1970) mostrou que a interação dos indígenas com a
sociedade brasileira os levou de uma condição de índios-tribais à de índios genéricos. Portanto, não é por
nada que o preconceito persiste – há 308 etnias no Brasil atual, sendo que, no Rio Grande do Sul, além dos
Guarani e dos Kaingang, ainda estão os remanescentes dos Xoklen e dos Charrua. Segundo ele, o avanço
sobre os territórios indígenas era quase impossível frente à discriminação racial e os interesses que estavam
em jogo: culturas indígenas diante do desenvolvimento econômico do país.
A possibilidade de uma vida indígena foi cada vez mais dificultada, dado o avanço da “civilização”
sobre suas terras. Foi por ela que os povos indígenas foram usurpados de seu modo de vida tradicional. Foi
por ela que tiveram sua população reduzida por várias décadas, e foi por ela que jamais deixaram de lutar.
No entanto, o “eles não são mais índios” persiste no imaginário.
Sedimentada numa gama de saberes que se reproduziram na ação daqueles encarregados de regrar
as normas para a colônia, as populações indígenas enfrentaram desde então as diferentes ações de linhagem
imperialista: desde as feitorias, passando pelas missões religiosas, aldeamentos, até a tutela, que só deixou
de existir, pelo menos na forma da lei, com a Constituição de 1988.
Em 1680, a coroa Portuguesa concede às missões religiosas, principalmente aos jesuítas, a
administração dos indígenas, através do Regimento das Missões, onde estava explícito que transformar os
índios em cristãos era o mesmo que torná-los vassalos do Rei de Portugal. Embora não constasse no
Regimento, o extermínio de grandes populações indígenas foi enorme, bem como sua escravização. Os
aldeamentos iniciaram-se com as missões jesuíticas, através da transferência de etnias inteiras sob o pretexto
de novas almas para a Igreja.
Em 1755, o Diretório Pombalino, muitas vezes ainda saudado por promover a liberdade dos índios,
deu aos povos indígenas o direito de escolherem a quem serviriam. Pombal na verdade estava preocupado
com o avanço do poder dos jesuítas sobre as populações nativas, e pretendia ocupar o território. Assim, as
aldeias transformaram-se em vilas. Os indígenas não seriam mais convertidos à religião, mas à civilização, à
cultura e ao comércio dos brancos.
O Diretório Pombalino previa a miscigenação, através do casamento de homens brancos com
mulheres indígenas, proibia a língua geral nas escolas indígenas e incentivava o trabalho e o comércio entre
eles. Desta forma, inaugurava-se a retórica da civilização, que vai perdurar até início do século XIX. O termo
civilizado vem servindo de desculpa para suas mais perversas ações contra os povos indígenas, e acabou
virando sinônimo, inclusive para os indígenas, de homem branco.
Os tempos que sucedem o fim da II Guerra Mundial vão refletir nas ciências sociais buscando
respostas contra as atrocidades. Novos horizontes iluminaram a Antropologia Social. Neste contexto,
trabalhos dos etnólogos ligados ao Serviço de Proteção ao Índio passarão a ser orientados por estes ares,
que em termos mundiais, são determinados pela Convenção 169 da Organização Mundial do Trabalho, da
ONU, em 1948. Ela vai pregar a autodeterminação dos povos indígenas, ao decretar que as terras ocupadas
por eles devem suprir-lhes o sustento de acordo com sua cultura, formando, ainda que de forma embrionária,
uma resistência à fúria desenvolvimentista que invadia as terras novas do Brasil.
As práticas do Serviço de Proteção ao Índio, e mais tarde da Funai que viria a substituí-lo em 1967,
porém, não acompanhariam oficialmente a emancipação das comunidades indígenas, tutelando-as
legalmente, até a Constituição de 88. Além disso, o Estado brasileiro teve muita dificuldade de implementar
políticas públicas fundadas na riqueza cultural destes povos, para se contrapor à ideia desenvolvimentista
que não acolhe a diversidade. E o mais cruel ainda é perceber que muitas vezes os setores que negam a
indianidade de nossos povos originários são os mesmo que querem plantar soja ou minerar em suas terras.
Então, cara pálida, quem não é mais índio?
Adaptado de https://www.brasildefators.com.br/2022/04/18/artigo-eles-nao-sao-mais-indios
Acesso em: 01 abr. 2023.
O uso das aspas no título do texto indica: