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Q839729 Português

                                        Trabalho como realização


      Quando me perguntam por que ainda não me aposentei e eu respondo que é porque gosto do meu trabalho, me olham com um misto de incredulidade e indignação. Eu quase tenho que me desculpar pela desfeita: a maioria das pessoas acha que trabalho é castigo e que falar bem dele é pura ostentação, se não for hipocrisia.

      Pois bem: entendo perfeitamente que muitos trabalhos possam ser vistos como castigo. Há incontáveis tarefas que podem ser desinteressantes, tediosas, cansativas, que não trazem prazer nenhum para a maioria das pessoas. Mas há outras nas quais nossa personalidade se realiza, que podem perfeitamente constituir-se como nosso meio de expressão, nossa identidade assumida e resolvida como vocação. Exemplo clássico é o de um professor que tenha grande prazer em dar aula: ele verá a aposentadoria não como uma bênção, mas como brusca interrupção de uma atividade vital. Ele vai adiar o quanto puder o “gozo”, o “desfrute” (enganosas palavras) de uma aposentadoria que mais lhe parece um castigo.

      Fico imaginando, entre outras utopias, a de um mundo em que houvesse para cada um aquele trabalho que representasse também sua realização pessoal. Acredito mesmo que um dos índices mais seguros para se reconhecer a felicidade de alguém seja o prazer que a pessoa encontre em trabalhar. Quando o trabalho vira sinônimo de criação, e quem o faz se sente como um genuíno criador, temos, é forçoso admitir, uma situação de privilégio, em vez de se constituir uma possibilidade de realização ao alcance de todos.

                                                                                                       (Felício Godói, inédito

Considerando-se o contexto, traduz-se adequadamente o sentido de um segmento do texto em:
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