A narração do texto 5A3-II se dá em
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Ano: 2021
Banca:
CESPE / CEBRASPE
Órgão:
SEED-PR
Prova:
CESPE / CEBRASPE - 2021 - SEED-PR - Professor - Língua Portuguesa |
Q1689732
Português
Texto associado
Texto 5A3-II
Capítulo CXXXV
Otelo
Jantei fora. De noite fui ao teatro. Representava-se
justamente Otelo, que eu não vira nem lera nunca; sabia apenas o
assunto, e estimei a coincidência. Vi as grandes raivas do mouro,
por causa de um lenço, — um simples lenço! — e aqui dou
matéria à meditação dos psicólogos deste e de outros continentes,
pois não me pude furtar à observação de que um lenço bastou a
acender os ciúmes de Otelo e compor a mais sublime tragédia
deste mundo. Os lenços perderam-se, hoje são precisos os
próprios lençóis; alguma vez nem lençóis há, e valem só as
camisas. Tais eram as ideias que me iam passando pela cabeça,
vagas e turvas, à medida que o mouro rolava convulso, e Iago
destilava a sua calúnia. Nos intervalos não me levantava da
cadeira; não queria expor-me a encontrar algum conhecido. As
senhoras ficavam quase todas nos camarotes, enquanto os
homens iam fumar. Então eu perguntava a mim mesmo se
alguma daquelas não teria amado alguém que jazesse agora no
cemitério, e vinham outras incoerências, até que o pano subia e
continuava a peça. O último ato mostrou-me que não eu, mas
Capitu devia morrer. Ouvi as súplicas de Desdêmona, as suas
palavras amorosas e puras, e a fúria do mouro, e a morte que este
lhe deu entre aplausos frenéticos do público.
— E era inocente, vinha eu dizendo rua abaixo; — que
faria o público, se ela deveras fosse culpada, tão culpada como
Capitu? E que morte lhe daria o mouro? Um travesseiro não
bastaria; era preciso sangue e fogo, um fogo intenso e vasto, que
a consumisse de todo, e a reduzisse a pó, e o pó seria lançado ao
vento, como eterna extinção...
Machado de Assis. Dom Casmurro. In: Massaud Moisés.
A literatura brasileira através dos textos.
São Paulo: Cultrix, 1981. p. 257-258.
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