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Q631114 Português
                               Rio Doce: não foi acidente. Foi violência

                                                                                              Rosana Pinheiro-Machado

      Sempre que eu vou a Porto Alegre, é a mesma coisa. O taxista reclama que não pode fazer o caminho que ele quer, porque um trecho da Avenida Anita Garibaldi ainda está fechado. Uma rua ia ser alargada para a Copa do Mundo, mas, no meio da obra, descobriu-se que não se podia mais continuar perfurando, porque encontravam (veja bem) uma rocha no meio do caminho. Tudo ficou mais caro.
      A Prefeitura dizia que é culpa da empresa, que deveria ter previsto o problema, mas a empresa queria que a prefeitura cobrisse o valor extra da obra. Aquele velho empurra-empurra. O buraco e seus desvios já viraram parte da paisagem da cidade. A obra está ali, já fazendo aniversário de três anos. E a sensação de todos que passam por tantas obras inacabadas ou malfeitas no Brasil é que elas nunca serão plenamente concluídas. E quem tem a sua vida transtornada somos todos nós.
      A velha aliança que se perpetua entre o Estado brasileiro e o capital – às vezes competindo, às vezes cooperando, mas sempre lucrando – é uma máquina de matar e deixar morrer. A estrutura burocrática e reguladora brasileira nos irrita, nos machuca e nos desrespeita. Mas esse modus operandi causa muito mais do que horas trancadas no trânsito ou a desilusão de ver uma cratera estampada. Ele também produz dor, sofrimento e morte.
      Valores para as campanhas? Licitações facilitadas. Mais uma ponte caiu. A obra está cara? O Estado não fiscaliza? Mais uma barragem se rompeu. A empresa aérea sofre uma crise e cortam-se os custos da manutenção? Quem fiscaliza? Mais um avião caiu.
      Choveu e abriu buraco na estrada? Passe-se aquele cimento mais barato. Assim, quando chover de novo, o Estado paga para tapar os buracos, e a empresa ganha sempre. Afinal de contas, para que investir em material duradouro se o Brasil é país tropical em que quase nunca chove forte? O resultado dessa ganância é perverso: acidentes, corpos mutilados e vidas interrompidas por causas que poderiam ter sido evitadas, mas que são naturalizadas como “acidente”.
      Não se trata de acidente. Trata-se de um crime praticado pelo Estado e pelas empresas que deveriam ser controladas pelo Estado, mas que, na verdade, controlam o Estado.
    Trata-se, portanto, de violência estrutural – conceito adotado por antropólogos como Veena Das, Arthur Kleinman, Paulo Farmer e Akhil Gupta para dar visibilidade a uma forma de sofrimento causado por estruturas sociais: pelo descaso, pela corrupção e pela ausência do Estado na fiscalização (o mesmo Estado que sabe fazer-se onipresente e ostensivo quando se trata de correr atrás de camelô porque os lojistas da cidade estão pressionando).
      A dor causada a milhares de pessoas e a morte de milhares ou milhões de animais ao longo do Rio Doce não foram acidentais. Não foi um desastre natural inevitável. Violência não é apenas o ato deliberado de força mas também os atos invisíveis da incompetência ou má fé judicial, política e administrativa. É preciso nomear claramente esta tragédia. Uma vez que admitimos que o que ocorreu na obra da Samarco (uma parceria da BHP e da Vale) foi um ato de violência – produzida pelo descaso e pela ganância que “deixam morrer” – é preciso identificar os culpados, que, neste caso, são agentes específicos do mercado e das agências controladoras do Estado.
      Não foi acidente. Não foi seleção natural. E a população brasileira não faz parte desse jogo em que se acredita que “os políticos corruptos são reflexo de um povo corrupto”. O taxista de Porto Alegre continua a se indignar, todos os dias. Eu me indigno. Você se indigna. Nós nos sentimos desrespeitados e impotentes.
      As mídias sociais encorajam e nos ajudam a encontrar aqueles outros milhões de perdidos que também não querem esquecer. Não há milagre para romper com esse ciclo de violência estrutural que se perpetua na sociedade brasileira. Podemos contar somente com a mobilização e o engajamento no projeto democrático – que ainda estamos construindo a duras penas, mas de que não desistiremos tão fácil. Por ora, cabe a nós entoar o grito “não foi acidente”, pressionar por medidas reparadoras e acompanhar a sua implementação.

Disponível em:<http://www.cartacapital.com.br/sociedade/nao-foi-acidente-foi-violencia-635.html>. Acesso em: 7 jan. 2016. [Adaptado]
O título do texto
Alternativas

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Tema da Questão: Interpretação de Texto

Esta questão exige que você identifique a relação entre o título do texto e seu conteúdo, analisando a posição do autor quanto à temática discutida. O título “Rio Doce: não foi acidente. Foi violência” já oferece uma pista significativa sobre a visão do autor em relação ao desastre mencionado.

Alternativa Correta: D - sinaliza a posição do autor em relação à discussão promovida.

A alternativa D está correta porque o título do texto expressa claramente a opinião do autor sobre o desastre ocorrido no Rio Doce. Ao utilizar termos como “não foi acidente” e “foi violência”, o título já introduz a ideia de que o evento foi resultado de ações negligentes ou intencionais, e não de uma fatalidade ou acaso. Esta posição é coerente com a argumentação desenvolvida ao longo do texto, que critica a falta de fiscalização e a corrupção que levam a tais tragédias.

Análise das Alternativas Incorretas:

A - mostra-se inadequado ao gênero discursivo em questão.

Essa alternativa está incorreta porque o título é perfeitamente adequado ao gênero discursivo de um artigo de opinião, servindo para evidenciar a posição crítica do autor sobre o tema abordado.

B - é pouco revelador da temática desenvolvida ao longo dos parágrafos.

Incorreta, pois o título é bastante revelador. Ele já indica de forma explícita que o texto tratará da responsabilidade e das consequências de uma tragédia que poderia ser evitada, alinhando-se com a discussão de violência estrutural presente no texto.

C - contradiz aspectos presentes no desenvolvimento do texto.

Errada, já que não há contradição. Pelo contrário, o título e o texto seguem a mesma linha argumentativa, denunciando a negligência e a corrupção como causadoras de tragédias, como a do Rio Doce.

Estratégias para Interpretação:

1. **Identifique palavras-chave**: No título, termos como “acidente” e “violência” são fundamentais para entender a postura do autor.

2. **Relacione título e texto**: Analise se o título está em harmonia com os argumentos e exemplos apresentados no corpo do texto.

3. **Compreenda o tom**: Perceba o tom adotado pelo autor (crítico, acusatório, etc.) e como ele é introduzido já no título.

Com essas estratégias, você será capaz de identificar a intenção do autor e a coerência entre título e conteúdo de forma mais eficaz.

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Comentários

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Letra D

 

Claramente percebemos o posicionamento do autor.

nem precisa ler muito para responder kkkk

Só para complementar:

Tema: compreende o assunto proposto para discussão, o assunto que vai ser abordado.

 


Título: palavra ou expressão que sintetiza o conteúdo discutido.

 


Argumentação: é um conjunto de procedimentos linguísticos com os quais a pessoa que escreve
sustenta suas opiniões, de forma a torná-las aceitáveis pelo leitor. É fornecer argumentos, ou seja, razões
a favor ou contra uma determinada tese.

Concordo que seja a D, mas pq B está errada? pois de fato é pouco revelador sobre a temática.

Marquei B, não vejo erro nela.

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