Ao concluir o texto com a frase – Estacionei no caráter enci...
Não sei como, não sei quando, não sei por quê, fui incluída, à minha revelia, em um site de relacionamentos. Faz dias que meu e-mail é invadido por desconhecidos interessados em estabelecer contato comigo.
Na primeira vez que dei com a mensagem na tela, corri para as letras miúdas, a fim de cancelar a inscrição. Procedi como indicado, mas apareceu uma mensagem exigindo a senha. Eu não tinha a menor ideia do número da senha, eu não me lembro de ter cadastrado uma senha. Jamais, em hipótese alguma, eu me engajaria em um site de relacionamentos. Sou sociofóbica, nasci em meados do século passado e suspeito da massa de anônimos que povoam o ciberespaço.
Cliquei em “Esqueceu sua senha?”, e esperei pela nova, a ser enviada. Demorou, demorou, e nunca chegou. Escrevi para a entidade fantasma – cuja central de atendimento deve ser no México,na Rússia ou em Porto Rico –, exigindo a retirada do meu nome de
circulação. Não há números de telefones disponíveis, nem qualquer ser humano que dê atenção ao meu trauma. A cada contato, o cérebro eletrônico me lê como usuária assídua e redobra a seleção de contatos. Quem controla esse abuso? É o Procon?
Parei no e-mail. Eu amo e-mail. Você escreve quando pode e recebe quando é conveniente. É uma troca pessoal e intransferível, serve de documento e ainda obriga o cidadão a escrever alguma língua direito, com sujeito, verbo e predicado.
Usei o Twitter uma vez e saí batido, impressionada com o número de estranhos que passaram a me tratar como íntima. Não achei prudente a exposição.
A internet foi, e é, o estopim das manifestações de massa que explodiram mundo afora. Como sou antiga e uso meu computador como máquina de escrever e correio, só soube do acontecido depois que aconteceu. Meu filho de 13, não, esse estava informado sobre tudo.
Peco pelo conservadorismo, leio jornal impresso e me informo pela televisão. Ainda assim, ignorante, solitária e ultrapassada, troco toda a consciência pela glória da minha privacidade. Não nasci para o Facebook, o Instagram e o LinkedIn. Estacionei no caráter enciclopédico, epistolar*, matusalênico* das novas tecnologias.
(Fernanda Torres, Veja Rio, 15.07.2013, http://zip.net/bjlQrh, 17.12.2013. Adaptado)
* Matusalém: patriarca da Bíblia que teria morrido com 969 anos
* epistolar: relativo a cartas
* matusalênico: velho, antigo
Gabarito comentado
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A questão apresentada é de interpretação de texto. O objetivo é compreender a posição da autora quanto ao uso das novas tecnologias, conforme revelado no trecho final do texto.
Análise da Alternativa Correta (C): A alternativa C afirma que a autora reforça "seu comportamento conservador ao fazer uso das novas tecnologias". Essa interpretação está correta porque, ao descrever-se como "matusalênico" e referir-se às tecnologias como "enciclopédicas" e "epistolares", a autora destaca sua preferência por métodos tradicionais, revelando um certo conservadorismo. Ela prefere manter-se afastada das interações proporcionadas pelas plataformas modernas, enfatizando seu apego à privacidade e seu uso restrito de tecnologias.
Por que as outras alternativas estão incorretas:
A - A afirmação de que a autora demonstra "admiração pela interatividade promovida pelas novas tecnologias" está incorreta. Pelo contrário, ela expressa desconfiança e crítica em relação às interações online, como evidenciado por seu desconforto com sites de relacionamento e outros meios semelhantes.
B - A alternativa que sugere "satisfação em obter as informações de maneira rápida por meio da internet" não é sustentada pelo texto. A autora confessa seu atraso em relação a eventos comunicados pela internet, evidenciando mais uma vez seu conservadorismo.
D - A ideia de "fascínio diante do fato de que a internet tornou as pessoas mais conscientes" é inverossímil. A autora não demonstra fascínio, mas sim uma crítica ao excesso de informações e à superficialidade das interações na internet.
E - A alternativa que menciona "frustração por não saber usar as novas tecnologias" não está correta. Embora a autora admita não participar ativamente de redes sociais, isso se deve a uma escolha consciente, refletindo seu desejo de preservar a privacidade, e não a uma incapacidade técnica.
Ao interpretar o texto, é vital identificar as palavras-chave e o tom utilizado pela autora. Termos como "sociofóbica", "matusalênico" e sua preferência por "caráter enciclopédico" são pistas claras de sua postura conservadora. Essa análise ajuda a entender a mensagem implícita e a selecionar a resposta correta.
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"Peco pelo conservadorismo, leio jornal impresso e me informo pela televisão. Ainda assim, ignorante, solitária e ultrapassada, troco toda a consciência pela glória da minha privacidade. Não nasci para o Facebook, o Instagram e o LinkedIn"
Gab. C
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