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Q2051186
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TEXTO 1
A face negativa da norma culta
1. Há tempos que os trabalhos no campo da linguística brasileira têm como uma de suas principais preocupações os
modos de ensino da norma culta da Língua Portuguesa. Vista como símbolo do bem-falar, a norma culta é amplamente
defendida como a “variedade linguística de maior prestígio social”, assim descrita na maioria das gramáticas. Nesse sentido, o
ensino de português, de um modo geral, tem se pautado na transmissão das regras subjacentes a essa norma. As gramáticas
e os livros didáticos, além de darem continuidade a um comércio editorial, que se diz capaz de oferecer essa “arte do bemfalar” aos incapazes de adquiri-la socialmente, em suas atividades linguísticas cotidianas, apenas reforçam a ideia absurda de
que a norma culta é a única aceitável, e quem não souber dominá-la será excluído do conjunto dos indivíduos que “sabem falar
português”.
2. Essa ideia de supervalorização da norma culta e de sua superioridade sobre as outras variedades passou a ser senso
comum na sociedade, gerando, assim, uma onda de preconceito e intolerância, já que se subentende que qualquer uso que
fuja à norma será considerado “inferior e desprestigiado”. O livro “Preconceito e intolerância na linguagem”, da professora Marli
Quadros Leite, abordou esse problema e constatou a ocorrência de intolerâncias, sobretudo, em discursos da imprensa escrita.
[...]
3. A primeira reflexão trazida por Leite é a de que o preconceito contra a linguagem não é apenas linguístico, mas
também social e político. Por meio das análises feitas, é possível perceber, por exemplo, o preconceito e a intolerância contra o
povo nordestino, mostrados, principalmente, por habitantes das regiões Sul e Sudeste. [...] Fica evidente que os argumentos
daqueles que têm preconceito contra a linguagem do nordestino baseiam-se na ideia de que se trata de uma linguagem
“errada”, utilizada por pessoas de baixo prestígio social e que “não sabem falar o português”. Esse tipo de pensamento tem –
em grande parte – origem na distinção entre norma culta e norma popular, na negação de outras variedades linguísticas e na
ignorância de que a língua é um fenômeno social e, inevitavelmente, variável.
4. As análises dos gêneros feitas por Leite são de grande valia aos estudos sobre preconceito e intolerância contra
determinadas variedades linguísticas, mas sua abordagem sobre a ocorrência desses fenômenos na escola é, sem sombra de
dúvidas, o que coroa sua obra, visto que, além da influência da sociedade em geral, a escola (infelizmente) tem sido a grande
incentivadora do preconceito e da intolerância linguísticos. A insistência da escola em ensinar, de forma supervalorizada, as
regras gramaticais – às vezes, sem levar em consideração as variedades linguísticas dos alunos – cria na mente dos
estudantes a ideia de que a norma culta é a que “reina” na sociedade. Isso gera uma atitude corretiva do indivíduo consigo
mesmo – num “policiamento linguístico” – e de um indivíduo para com outro – numa posição soberba e acusadora a que subjaz
o pensamento: “Você fala errado! Eu estudo e falo certo, logo, eu posso corrigir seu erro”.
5. Essa é a face negativa da norma culta. Essa falsa superioridade e desprezo sobre as outras variedades linguísticas, o
que, infelizmente, gera o preconceito e a intolerância, não apenas contra a linguagem de quem faz uso de outras normas, mas
contra a própria pessoa. O uso e o ensino da norma culta são, sem dúvida, essenciais. Ela deve ter, sim, seu lugar na
sociedade e na escola, de forma que todos possam ter a capacidade de comportar-se linguisticamente de forma adequada em
cada situação comunicativa. O que se torna necessário, como conclui Leite, é que as pessoas não julguem umas às outras
pela linguagem de que fazem uso, mas que haja o respeito, a tolerância, a aceitação e a valorização de todas as normas
linguísticas, pois todas, igualmente, são válidas e essenciais à vida da comunidade linguística.
Talita Santos Menezes. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/a-face-negativa-da-norma-culta/118492. Acesso em 05/09/2016.
(Adaptado).
Para o êxito na compreensão do Texto 1, é preciso que o entendamos como: