Texto 3Notas de uma resenhaBENJAMIN, Walter. A obra de arte ...
Texto 3
Notas de uma resenha
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica. In: ADORNO et al. Teoria da Cultura de massa. Trad. de C. N. Coutinho. São Paulo: Paz e Terra, 2000. p. 221-254. [O texto de Benjamin foi escrito em 1936.]
Walter Benjamin é um grande autor moderno e nos aproxima de suas reflexões sobre uma teoria materialista da arte e a discussão de cultura de massa na modernidade capitalista. Em seu texto, o autor aponta para algumas questões importantes como a noção de autenticidade, o valor de culto e a unicidade na obra de arte. O “hic et nunc” (“aqui e agora”) do original constitui o que chama de autenticidade, a unicidade de sua presença no próprio local onde ela se encontra. No entanto, esse conceito não tem sentido para uma reprodução, técnica ou não, pois essa noção escapa a toda reprodução.
Discute-se em que época da reprodutibilidade técnica a obra de arte é atingida em sua aura, definida como “única aparição de uma realidade longínqua, por mais próxima que ela possa estar” (p. 229). O valor da unicidade “autêntica” se baseia no ritual que originariamente foi dado. Sendo assim, a reprodutibilidade contribui diretamente para a destruição do caráter único da autenticidade e da tradição. No sistema capitalista, a existência única é substituída por uma existência serial. Desde que o critério de autenticidade não mais se aplica à produção artística, toda função de arte é subvertida, ela se funda agora não apenas no ritual, mas noutra forma da práxis: a política. À medida que se emancipam, as obras de arte tornam-se mais acessíveis a serem expostas. Isso afeta também a qualidade da própria natureza da arte, pois seu valor expositivo lhe empresta funções novas de maneira que a função artística apareça como acessória.
Benjamin aponta o cinema como agente eficaz dessas contradições. A exemplo de polêmicas entre pintores e fotógrafos, em curso no século XIX, no que diz respeito aos valores respectivos das suas obras, também o cinema e o teatro são polemizados. No teatro, o ator adapta-se diante das reações diretas do público e, assim, nota-se a aparição única de algo distante, ou seja, a aura. Já no cinema há todo um mecanismo de mediação, com restrição do papel da aura e a construção artificial da “personalidade” do ator, ou seja, o culto da “estrela” a favor do capitalismo dos produtores.
Segundo o autor, “a massa é a matriz de onde brota, atualmente, todo um conjunto de novas atitudes em face da obra de arte. A quantidade tornou-se qualidade” (p. 250). As massas buscam diversão. Mas a arte necessita do recolhimento. Quem se recolhe diante da obra de arte, por ela é envolvido. Como imagem dialética, o autor cita a história de um pintor chinês que, de acordo com a lenda, perdeu-se na paisagem que acabara de pintar.
FIGUEIREDO, V. M. C. de.; OLIVEIRA, A. P. Disponível em: <https://www.revistas.ufg.br/fef/article/view/130/1487>. [Adaptado] Acesso: 03/set/2018.
Texto 4
Entrevista com Mia CoutoPrestes a completar 62 anos, o escritor moçambicano Mia Couto é uma das poucas pessoas no mundo capaz de juntar com beleza e propriedade assuntos que vão da medicina à ecologia, da biologia à poesia, da prosa à política.
Quais seus principais interesses como cientista?
Sou biólogo e ecologista. O que me fascina é a fronteira entre a descoberta científica e a margem de mistério que sempre subsiste. Mas sobretudo a Biologia me ajudou a repensar-me como pessoa solidária e de identidades partilhadas. A Biologia ensinou-me a entender outras linguagens, ensinou-me a fala das árvores, a fala dos que não falam. Hoje em nenhum lugar me sinto uma criatura solitária. Mais do que tudo ela me trouxe a saúde de pensar que faço parte de uma epopeia partilhada por milhões de criaturas, e nessa antiga saga não existe nunca um ator principal.
De que maneira a ciência ajuda na sua obra literária e vice-versa?
Confirmei na ciência o que suspeitava como poeta: a certeza de um parentesco perdido com o mundo natural, seja ele tido como vivo ou inorgânico. Não imaginamos, nós seres humanos, o quanto somos feitos de material não humano. E mesmo nesse lugar sagrado onde se acreditava estar registrado o nosso pedigree distinto de todas as outras espécies, mesmo no nosso genoma mora a vida inteira.
As palavras que existem na língua portuguesa já não bastam para expressar o que se quer?
Os idiomas são entidades vivas e raramente são os escritores que criam mudanças que se tornam registro corrente. São as pessoas comuns. Não podemos abdicar do direito (e sobretudo do prazer) de sermos coprodutores desse corpo social. Não se trata de uma questão literária. Mas da possibilidade de ver no idioma um modo de assumirmos uma identidade solidária e coletiva e em permanente construção.
Qual sua palavra favorita (inventada ou existente) e o que ela tem de especial?
Um dia um desconhecido num aeroporto em Moçambique abordou-me para me dizer que queria oferecer uma palavra. Estranhei mas ele explicou-se: era um engenheiro de obras e numa certa ocasião teve que chamar a atenção de um operário sobre algo que não estava bem feito. E o homem respondeu: esta é uma coisa “improvisória”. Este termo é genial. Porque reúne muito do que somos em Moçambique (e possivelmente no Brasil): improvisamos na lógica do provisório. Numa única palavra se exprime um modo de uma cultura se dizer a si mesma.
Como conduzir o leitor entre o real e o imaginário sem confundi-lo?
Talvez o leitor precise mesmo de ficar confuso, de perder o pé e ser convidado a procurar um novo chão. Se a obra de arte não fizer isso ela não cumpre a sua função de nos conduzir a uma viagem, a saltar fronteiras e a desobedecer certezas. E talvez seja necessário questionar essa construção de literatura do “mágico” e do “fantástico”. Não existe literatura que não caminhe com um pé no fantástico e outro no real.
PEREIRA, C.; MASSON, C. Revista Isto É. Edição 15/06/2017 - nº 2479. Disponível em: <https://istoe.com.br/teremos-que-inventar-um-ou-tro-modo-de-fazer-politica/#> [Adaptado]. Acesso: 05/set/2018.
Assinale a alternativa correta, de acordo com os textos 3 e 4.