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Q2447079 Português
Chuva


     Houve um prefeito, paisano e sem imaginação, que resolveu acabar com as inundações do Rio. Foi o engenheiro João Carlos Vital, cujo breve reinado se perde, na série imensa dos prefeitos, entre um calvo general atrabiliário que construiu o Maracanã e um bravo coronel do P.T.B. que ali recebeu a mais estrondosa das manifestações.

     Vital foi um Frontin às avessas, e conseguiu livrar o Rio do excesso de água com esta providência original: mandou desentupir os bueiros. Nunca ninguém se lembrara disso antes; e depois, como se viu no dia de ontem, nunca ninguém voltou a se lembrar. Tivemos ruas, praças e amplas avenidas transformadas em córregos, lagoas e rios. Foi a bela resposta do coronel à populaça que no estádio lhe gritava: água, água! “Pois tomem água”! – Disse ele.

          Eu tive pena foi de sair de casa calçado e, além disso, com 30 anos de idade mais do que o conveniente. Descalço e menino, faria o que os meninos descalços eu vi fazendo: entraria na enchente, patinaria na lama, soltaria na esquina meus barcos de papel, e me divertiria imenso com a aflição da gente grande a empilhar trastes e móveis no andar térreo e a buzinar nervosamente atrás de um carro de capota levantada e distribuidor enlameado.

       A infância pobre do Rio, sempre esquecida, teve ontem um lindo dia de folga e festa: desculpa para não ir à escola e divertimentos animados na grande alegria das enxurradas.

       Quando a infância ri, Deus está contente. O telhado de minha mansarda amanheceu limpinho, e as árvores da rua engordaram de verde, pingando alegria, muito gratas ao senhor prefeito. Os chauffeurs de táxi tungaram alegremente seus passageiros; não é à toa que esses marotos gostam de ter, no quadro do carro, a imagem de São Cristóvão carregando o menino Jesus no ombro durante uma enchente.

          Salve, portanto, a chuva, amiga das crianças, da lavoura e dos motoristas. Cheguei em casa de pés molhados, mas um gole de pisco, lembrança do Peru, me esquentou os pés e a alma. Para dizer a verdade, foi um gole para os pés e outro para a alma; e para dizer toda a verdade, houve mais um de lambuja. Haja pisco; motivos para beber não hão de faltar neste país sempre desgovernado e às vezes, graças a Deus, chuvoso.


(BRAGA, Rubem. Dois pinheiros e o mar: e outras crônicas sobre meio ambiente. Brasil, Global Editora, 2017.)
Chama-se derivação imprópria o processo de formação de palavras no qual um vocábulo tem sua classificação gramatical alterada em razão do contexto de sua aplicação de modo a estender sua significação. Dentre as diversas metamorfoses morfológicas possíveis, tem-se o processo em que um adjetivo passa a atuar como um advérbio. Um exemplo se dá no caso sublinhado em:
Alternativas

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Alternativa correta: D

A questão aborda a formação de palavras através da derivação imprópria, um processo morfológico em que uma palavra muda sua classe gramatical sem alteração em sua forma. Aqui, focamos no contexto onde um adjetivo passa a atuar como advérbio.

Justificativa da alternativa correta:

A alternativa D traz a expressão "divertiria imenso". O termo "imenso" é originalmente um adjetivo que qualifica algo de grande extensão ou intensidade. No entanto, no contexto da frase, ele está sendo utilizado para modificar o verbo "divertiria", funcionando como um advérbio ao indicar a intensidade da diversão. Portanto, é um exemplo claro de derivação imprópria, onde um adjetivo passa a ser usado como advérbio.

Análise das alternativas incorretas:

A - "O telhado de minha mansarda amanheceu limpinho [...]": Aqui, "limpinho" é um adjetivo que qualifica o estado do telhado. Não há mudança de classe gramatical, pois continua sendo um adjetivo.

B - "[...] entre um calvo general atrabiliário que construiu o Maracanã [...]": O termo "atrabiliário" é um adjetivo qualificando "general". Assim como na alternativa A, não há mudança de classe gramatical.

C - "A infância pobre do Rio, sempre esquecida, teve ontem um lindo dia [...]": "Esquecida" é um adjetivo que qualifica "infância". Novamente, o termo permanece como adjetivo, sem alteração de classe gramatical.

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Comentários

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Na derivação imprópria (ou conversão) uma palavra muda de classe, mas sem alterar a sua forma. No caso em voga, o termo "imenso", que a princípio poderia ser entendido como um adjetivo, assume o papel de advérbio de intensidade.

Me divertiria imenso = me divertiria muito (advérbio)

Vamos lá! Existem diversas formas de significar uma classe de palavra em outra (derivação imprópria), mas sempre há um macete que pode salvar você!!

"Muito" pode ser:

Adj. Adverbial intensificador: intensifica adjetivo, advérbio e verbo.

Pronome indefinido: se refere a substantivo.

SEMPRE OLHE PARA ONDE A PALAVRA "MUITO" ESTÁ SE REFERINDO!

"Imenso" é um adjetivo, certo? Mas está qualificando um verbo (divertiria). Se estivesse qualificando um substantivo, seria um pronome indefinido.

Por isso, trata-se de um adjunto adverbial intensificador.

Gabarito: LETRA E.

Intensidade>>

é só colocar o sufixo MENTE ao final do adjetivo pra virar um advérbio.

IMENSO = IMENSAMENTE

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