Está correto o emprego do elemento sublinhado na frase:
Quem já se habituou ao desgosto de receber textos não
solicitados de cem páginas aguardando sua leitura? Ou quem
não se irrita por ser destinatário de mensagens automáticas que
nem lhe dizem respeito? E, mesmo sem aludir a entes mais
sinistros como os hackers e os vírus, como aturar os abusos da
propaganda que vem pelo computador, sob pretexto da
liberdade de acesso à informação?
Entre as vantagens do correio eletrônico - indiscutíveis,
a pergunta que anda percorrendo todas as bocas visa a
apurar se a propagação do e-mail veio ressuscitar a carta. A
esta altura, o e-mail lembra mais o deus dos começos, Janus
Bifronte, a quem era consagrado o mês de janeiro. No templo
de Roma ostentava duas faces, uma voltada para a frente e
outra para trás. A divindade presidia simultaneamente à morte e
ao ressurgimento do ciclo anual, postada na posição
privilegiada de olhar nas duas direções, para o passado e para
o futuro. Analogamente, o e-mail tanto pode estar completando
a obsolescência da carta como pode dar-lhe alento novo.
Sem dúvida, o golpe certeiro na velha prática da
correspondência, de quem algumas pessoas, como eu, andam
com saudades, não foi desferido pelo e-mail nem pelo fax. O
assassino foi o telefone, cuja difusão, no começo do século XX,
quase exterminou a carta, provocando imediatamente enorme
diminuição em sua frequência. A falta foi percebida e muita
gente, à época, lamentou o fato e o registrou por escrito.
Seria conveniente pensar qual é a lacuna que se
interpõe entre a carta e o e-mail. Podem-se relevar três pontos
em que a diferença é mais patente. O primeiro é o suporte, que
passou do papel para o impulso eletrônico. O segundo é a
temporalidade: nada poderia estar mais distante do e-mail do
que a concepção de tempo implicada na escritura e envio de
uma carta. Costumava-se começar por um rascunho; passavase
a limpo, em letra caprichada, e escolhia-se o envelope
elegante - tudo para enfrentar dias, às vezes semanas, de
correio. O terceiro aspecto a ponderar é a tremenda invasão da
privacidade que a Internet propicia. Na pretensa cumplicidade
trazida pelo correio eletrônico, as pessoas dirigem-se a quem
não conhecem a propósito de assuntos sem interesse do infeliz
destinatário.
(Walnice Nogueira Galvão, O tapete afegão)
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Comentário objetivo:
Para resolver essa questão basta verificar e regência verbal e o uso de pronomes relativos para cada uma das alternativas:
a) Quem não se irrita por ser o destinatário de mensagens por cujo assunto não tem o menor interesse? PERFEITA! Quem não tem interesse, não tem interesse POR alguma coisa...
b) Como reagir à recepção de textos aos quais OS QUAIS jamais houve solicitação nossa? Quem solicita, solicita alguma coisa...
c) A autora refere-se ao deus Janus Bifronte, às duas faces suas em cujas QUE representavam-se o passado e o futuro. Quem representa, representa alguma coisa...
d) Quem matou o hábito das cartas foi o telefone, em que o CUJO reinado começou junto com o século XX. Exige o cujo pois apresente o elemento possuidor (telefone) e o elemento possuido (reinado).
e) Os e-mails acabam chegando a destinatários de cuja CUJA privacidade não costumam respeitar. Quem respeita, respeita alguma coisa...
(A) “Quem não se irrita por ser o destinatário de mensagens por cujo assunto não tem o menor interesse?” Quem não tem interesse, não tem interesse POR algo/alguém. Certíssimo. O uso do ‘cujo’ também está adequado uma vez que estabelece relação de posse entre os termos que o ladeiam.
(B) “Como reagir à recepção de textos Dos quais jamais houve solicitação nossa?” O substantivo solicitação rege a preposição A quando se refere à pessoa, o que não é o caso, porque a solicitação é Dos textos.
(C) “A autora refere-se ao deus Janus Bifronte, às duas faces suas em cujas representavam-se o passado e o futuro.” O uso de ‘cujo’ está equivocado porque ele não está entre dois nomes, como deve vir estabelecendo a relação de posse. A frase está truncada e deve ser reescrita assim, por exemplo: “A autora refere-se ao deus Janus Bifronte, em cujas duas faces representavam-se o passado e o futuro”.
(D) “Quem matou o hábito das cartas foi o telefone, em que o reinado começou junto com o século XX.” Há uma relação de posse entre ‘reinado’ e ‘telefone’, logo o uso de ‘cujo’ é bem-vindo. A frase deveria estra escrita assim: “Quem matou o hábito das cartas foi o telefone, cujo reinado começou junto com o século XX.”
(E) “Os e-mails acabam chegando a destinatários cuja privacidade não costumam respeitar.” Não há termo algum após o pronome relativo que exija preposição, logo não deve haver preposição antes dele.
Dica sobre o uso do cujo:
- usado entre substantivos
- relação de posse entre esses substantivos
- Pode ser preposicionado, dependerá da regência do verbo
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