AFINIDADE
Afinidade é um dos poucos sentimentos que resistem a
todo e qualquer tempo. A afinidade não é o mais brilhante,
mas o mais sutil, delicado e penetrante dos sentimentos.
É o mais independente. Não importa o tempo, a ausência,
os adiamentos, as distâncias, as impossibilidades.
Quando realmente há afinidade, qualquer reencontro
retoma a relação no exato ponto em que foi interrompido.
Retoma também o diálogo, a conversa, o afeto.
Afinidade é não haver tempo mediando a vida.
É uma vitória do adivinhado sobre o real. Do subjetivo para
o objetivo. Do permanente sobre o passageiro. Do básico
sobre o superficial.
É muito raro ter afinidade.
Mas quando existe não se precisa de códigos verbais para
se expressar.
Existia antes do conhecimento, irradia durante e
permanece depois que as pessoas deixaram de estar
juntas.
O que você tem dificuldade de expressar a um afim, sai
simples e claro diante de alguém com quem você tem
afinidade.
Afinidade é ficar longe pensando parecido a respeito dos
mesmos fatos que impressionam, comovem ou mobilizam.
É ficar conversando sem trocar palavras.
Afinidade é jamais "sentir por".
Quem "sente por", confunde afinidade com masoquismo,
mas quem "sente com", avalia sem se contaminar.
(...)
Compreende sem ocupar o lugar do outro.
Aceita para poder questionar.
Quem não tem afinidade, questiona por não aceitar.
Afinidade é ter perdas semelhantes e iguais esperanças.
É conversar no silêncio, tanto nas possibilidades exercidas
quanto das impossibilidades vividas.
Afinidade é retornar à relação no ponto em que parou sem
lamentar o tempo de separação.
Porque tempo e separação nunca existiram.
Foram apenas oportunidades dadas ou tiradas pela vida,
para que a maturação comum pudesse se dar.
E para que cada pessoa pudesse e possa ser, cada vez mais
a expressão do outro sob a forma ampliada do eu
individual aprimorado.
Do livro: "Alguém que já não fui" Artur da Távola, pseudônimo de Paulo
Alberto Moretzsohn Monteiro de Barros - Adaptado
Fonte: https://www.contandohistorias.com.br/cgi-bin/ch.cgi