No contexto da obra O Ateneu, a homossexualidade, tematizada...

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Ano: 2018 Banca: FGV Órgão: FGV Prova: FGV - 2018 - FGV - Vestibular - Administração Pública |
Q1067482 Português

                                         


      À hora do primeiro almoço, como prometera, Aristarco mostrou-se em toda a grandeza fúnebre dos justiçadores. De preto. Calculando magnificamente os passos pelos do diretor, seguiam-no em guarda de honra muitos professores. À porta fronteira, mais professores de pé e os bedéis ainda, e a multidão bisbilhoteira dos criados.

      Tão grande a calada, que se distinguia nítido o tique-taque do relógio, na sala de espera, palpitando os ansiados segundos.

      Aristarco soprou duas vezes através do bigode, inundando o espaço com um bafejo de todo-poderoso.

      E, sem exórdio:

      “Levante-se, Sr. Cândido Lima! “Apresento-lhes, meus senhores, a Sra. D. Cândida”, acrescentou com uma ironia desanimada.

      “Para o meio da casa! e curve-se diante dos seus colegas!”

      Cândido era um grande menino, beiçudo, louro, de olhos verdes e maneiras difíceis de indolência e enfado. Atravessou devagar a sala, dobrando a cabeça, cobrindo o rosto com a manga, castigado pela curiosidade pública.

      “Levante-se, Sr. Emílio Tourinho...

       Este é o cúmplice, meus senhores!”

      Tourinho era um pouco mais velho que o outro, porém mais baixo; atarracado, moreno, ventas arregaladas, sobrancelhas crespas, fazendo um só arco pela testa. Nada absolutamente conformado para galã; mas era com efeito o amante.

      “Venha ajoelhar-se com o companheiro.”

      “Agora, os auxiliares...”

      Desde as cinco horas da manhã trabalhava Aristarco no processo. O interrogatório, com o apêndice das delações da polícia secreta e dos tímidos, comprometera apenas dez alunos.

      A chamado do diretor, foram deixando os lugares e postando-se de joelhos em seguimento dos principais culpados.

      “Estes são os acólitos da vergonha, os corréus do silêncio!”

      Cândido e Tourinho, braço dobrado contra os olhos, espreitavam-se a furto, confortando-se na identidade da desgraça, como Francesca e Paolo* no inferno.

      Prostrados os doze rapazes perante Aristarco, na passagem alongada entre as cabeceiras das mesas, parecia aquilo um ritual desconhecido de noivado: a espera da bênção para o casal à frente.

      Em vez da bênção chovia a cólera.

                                                                                                Raul Pompeia, O Ateneu.

* Francesca e Paolo: personagens de A Divina Comédia, de Dante Alighieri. 

No contexto da obra O Ateneu, a homossexualidade, tematizada no trecho aqui reproduzido, configura-se como
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