Leia o excerto de “A Hora e a Vez de Augusto Matraga”, publ...
“E, páginas adiante, o padre se portou ainda mais
excelentemente, porque era mesmo uma brava criatura.
Tanto assim, que, na despedida, insistiu:
– Reze e trabalhe, fazendo de conta que esta vida é um
dia de capina com sol quente, que às vezes custa muito
a passar, mas sempre passa. E você ainda pode ter
muito pedaço bom de alegria... Cada um tem a sua
hora e a sua vez: você há de ter a sua.” [p. 356]
[...]
“Quando ficou bom para andar, escorando-se nas
muletas que o preto fabricara, já tinha os seus planos,
menos maus, cujo ponto de início consistia em ir para
longe, para o sitiozinho perdido no sertão mais longínquo
[...] que era agora a única coisa que possuía de seu.
Antes de partir, teve com o padre uma derradeira
conversa, muito edificante e vasta. E, junto com o casal
de pretos samaritanos, que, ao hábito de se desvelarem,
agora não o podiam deixar nem por nada, pegou chão,
sem paixão.
Largaram à noite, porque o começo da viagem teria de
ser uma verdadeira escapada. E, ao sair, Nhô Augusto
se ajoelhou, no meio da estrada, abriu os braços em
cruz, e jurou:
– Eu vou p’ra o céu, e vou mesmo, por bem ou por
mal!... E a minha vez a de chegar... P’ra o céu eu vou,
nem que seja a porrete!...
E os negros aplaudiram, e a turminha pegou o passo, a
caminho do sertão.” [p. 357-358]
[...]
“E o povo, enquanto isso, dizia: – ‘Foi Deus quem
mandou esse homem no jumento, por mór de salvar as
famílias da gente!...’” [p. 385]
“Mas Nhô Augusto tinha o rosto radiante, e falou:
– Perguntem quem é aí que algum dia já ouviu falar no
nome de Nhô Augusto Esteves, das Pindaíbas! [...]
Então, Augusto Matraga fechou um pouco os olhos,
com sorriso intenso nos lábios lambuzados de sangue,
e de seu rosto subia um sagaz contentamento. [...]
Depois, morreu.” [p. 386]
(ROSA, João Guimarães. Sagarana. Rio de Janeiro: Record, 1984)