Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo pri...
Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo. Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no introito, mas no cabo; diferença radical entre este livro e o Pentateuco.
Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos. Onze amigos! (...)
(ASSIS, Machado. Memórias póstumas de Brás Cubas.
São Paulo: Ateliê, 2001, p. 69)
Memórias póstumas de Brás Cubas, obra
inaugural do Realismo no Brasil, apresenta vários
procedimentos literários que configuram o estilo
de Machado de Assis. Dentre esses procedimentos,
a leitura dos primeiros parágrafos do romance já
permite identificar