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Q819523 Português

Impotência

Foi na última chuvarada do ano, e a noite era preta. O homem só estava em casa; chegara tarde, exausto e molhado, depois de uma viagem de ônibus mortificante, e comera, sem prazer, uma comida fria. Vestiu o pijama e ligou o rádio, mas o rádio estava ruim, roncando e estalando. “Há dois meses estou querendo mandar consertar esse rádio”, pensou com tédio. E pensou ainda que há muitos meses, há muitos anos, estava com muita coisa para consertar desde os dentes até a torneira da cozinha, desde seu horário no serviço até aquele caso sentimental em Botafogo. E quando começou a dormir e ouviu que batiam na porta, acordou assustado, achando que era o dentista, o homem do rádio, o caixa da firma, o irmão de Honorina ou um vago fiscal geral dos problemas da vida que lhe vinha tomar contas.

A princípio não reconheceu a negra velha Joaquina Maria, miúda, molhada, os braços magros luzindo, a cara aflita. Ela dizia coisas que ele não entendia; mandou que entrasse. Há dois meses a velha lavava sua roupa, e tudo o que sabia a seu respeito é que morava em algum barraco, em um morro perto da Lagoa, e era doente. Sua história foi saindo aos poucos. O temporal derrubara o barraco, e seu netinho, de oito anos, estava sob os escombros. Precisava de ajuda imediata, se lembrara dele.

– O menino está... morto?

Ouviu a resposta afirmativa com o suspiro de alívio. O que ela queria é que ele telefonasse para a polícia, chamasse ambulância ou rabecão, desse um jeito para o menino não passar a noite entre os escombros, na enxurrada, ou arranjasse um automóvel e alguém para retirar o corpinho. Quis telefonar, mas o telefone não dava sinal; enguiçara. E quando meteu uma capa de gabardine e um chapéu e desceu a escada, viu que tudo enguiçara, os bondes, os ônibus, a cidade, todo esse conjunto de ferro, asfalto, fios e pedras que faz uma cidade, tudo estava paralisado, como um grande monstro débil. [...]

(Rubem Braga – 50 crônicas escolhidas. 3. ed. Rio de Janeiro: BestBolso. 2011. Fragmento.)


O homem só estava em casa; chegara tarde, exausto e molhado, depois de uma viagem de ônibus mortificante, e comera, sem prazer, uma comida fria.” (1º§) Considerando que uma mesma palavra analisada sob a ótica morfológica pode assumir diversificadas funções quando analisada de acordo com a sintaxe, assinale a afirmação correta acerca do trecho destacado.

Alternativas

Gabarito comentado

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Alternativa correta: C

Vamos analisar o tema central da questão. A pergunta aborda a morfologia e a função sintática das palavras no trecho destacado do texto. Para resolver a questão, é importante ter conhecimento sobre classes gramaticais (como substantivos, adjetivos, advérbios) e entender como essas palavras podem desempenhar funções sintáticas diversas em uma frase.

Justificação da alternativa correta:

A alternativa C afirma que a expressão "em casa" e o termo "tarde" denotam circunstâncias diferentes, mas desempenham a mesma função sintática. No contexto da frase, "em casa" indica lugar, enquanto "tarde" indica tempo. Ambas as expressões funcionam como adjuntos adverbiais, mas de circunstâncias diferentes, assim a afirmação está correta.

Análise das alternativas incorretas:

A - O termo "só" foi empregado como denotador de inclusão. Isso está incorreto, pois no contexto do trecho, "só" significa que o homem estava sozinho em casa, e não inclui outras pessoas.

B - A afirmação de que as palavras "só", "exausto" e "mortificante" pertencem à mesma classe gramatical está incorreta. "Só" é um advérbio, "exausto" é um adjetivo, e "mortificante" é um particípio usado como adjetivo. Portanto, eles não são da mesma classe.

D - A expressão "sem prazer" não pode ser substituída por "assim", pois "sem prazer" é uma locução adverbial que indica modo, enquanto "assim" é um advérbio de modo que não carrega o mesmo significado. Assim, a substituição proposta altera o sentido da frase.

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Comentários

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alguém pode explicar esse gabarito?

Vinícius, os dois termos são advérbios. Um indicando circunstância de "lugar" e outro de "tempo".

O homem estava ONDE? Em casa (advérbio de lugar)

O homem chegara QUANDO? A tarde (advérbio de tempo)

A resposta do Rafael é muito boa mas... a rigor, a questão não estaria errada, pelo fato de um se tratar de advérbio de lugar e outro de advérbio de tempo?

letra a està incorreta , pois é denotador de exclusão .

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