Segundo o texto, as pesquisas realizadas na década de 1950 j...
TEXTO II
Em defesa da presença
Apesar de não admitirmos, somos, em geral, péssimos ouvintes. E isso não é recente. Mas a habilidade de trazer mais atenção às conversas, em tempos de redes sociais, só tem piorado.
Ao constatar que processamos apenas 25% do que nos é informado verbalmente, pesquisas realizadas na década de 1950 já apontavam para uma necessidade de melhorarmos nossa habilidade de trazer mais atenção às conversas – que, na maioria das vezes, não passam de monólogos cruzados. O problema é que, comprovadamente, só percebemos essa falha nos outros.
De lá para cá, ganhamos vários meios de expor nossa privacidade e opiniões, sem precisar oferecer a contrapartida que costumamos evitar. Socializamos nosso egocentrismo e ele vai desequilibrando ainda mais a relação entre a escuta e a expressão. Quanto ao seu desempenho, os smartphones são extremamente tentadores justamente por alimentarem nossa tendência de falar mais que ouvir, de aparecer mais que comparecer e de escapar daquilo que demanda energia mental.
Temos que ensinar que não há curtidas ou visualizações suficientes para superar o valor de uma grande amizade. Boas conversas, pessoas interessadas e inteiramente presentes, estas, sim, são, possivelmente, a única forma de nos salvar das aflições que crescem até ganhar definição nos dicionários. Mas construir relações significativas é um exercício trabalhoso, que exige uma série de capacidades encontradas nos raros bons ouvintes: generosidade, para oferecer tempo e presença; disposição, para ouvir com interesse sincero; vulnerabilidade, para mostrar-se desarmado e inteiro; e tolerância, para administrar frustrações e aceitar diferenças, sem julgá-las nem as comparar.
(MÜLLER, Michelle. Em defesa da presença. In.: Psique, Ciência & Vida. São Paulo: 2017, ano 12, edição 136, p. 16 – Adaptado).