Leia o texto para responder à questão.
Como conciliar a rotina num século em
que o tempo se tornou privilégio?
Publicada em 1865, a obra Aventuras de Alice no País
das Maravilhas, uma das mais importantes da literatura mundial, foi fruto da imaginação e das indagações sobre a relatividade temporal do escritor e matemático Lewis Carroll (1832-
1898). O personagem Coelho Branco pode simbolizar, por
meio de sua obsessão pelo tempo, a angústia causada pela
brevidade da experiência humana.
Afinal, na época em que a história foi escrita, os dias passaram a ser contados pelos ponteiros do relógio, e não mais
pelo nascer e pôr do sol. Foi a partir da Revolução Industrial,
na segunda metade do século 18, que a vida foi compartimentada em horas, minutos e segundos, entre “tempo de trabalho”
e “tempo livre”. Assim como Alice, a humanidade caiu na toca
do Coelho Branco e começou a correr atrás do tempo.
Desde então, a sociedade sonha com a dilatação das
24 horas do dia para conciliar o rendimento no trabalho com
momentos de lazer com família e amigos, fazer atividade
física, ler um livro ou simplesmente ficar de pernas para o ar.
Num século em que gerenciar o tempo se tornou privilégio, a
consequência dessa aceleração vem provocando quadros
de ansiedade, depressão e outros sofrimentos psíquicos. De
acordo com o mais recente mapeamento global de transtornos
mentais, realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS),
o Brasil possui a população mais ansiosa do mundo.
“Precisamos ter em mente que questões de saúde mental estão estreitamente relacionadas aos modos de vida, ao
quadro cultural do país e como está organizada a vida social.
Então, eu colocaria a questão do tempo na perspectiva desse arranjo social, político e econômico neoliberal, que leva
a uma mobilização integral da nossa vida para o trabalho”,
aponta o professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
(USP) Ricardo Rodrigues Teixeira, que coordena a diretoria
de Saúde Mental e Bem-Estar Social da pró-reitoria de Inclusão e Pertencimento da instituição.
Autor do livro Sem tempo para nada, o cientista social Luís
Mauro Sá Martino endossa esse diagnóstico. “Como sociedade, podemos nos perguntar o quanto esse ritmo acelerado está
nos fazendo bem, sobretudo a longo prazo. Você pode tentar
levar uma vida adequada à sua saúde e bem-estar, porém
como fazer isso se tudo ao seu lado está em um ritmo rápido e
contínuo?”, dispara.
(LLEDÓ, Maria Júlia. Como conciliar a rotina num século em que o tempo se
tornou privilégio?. Revista E (Sesc Edições). 01.05.2023. Adaptado)