Leia o texto, para responder à questão.
Piscina
Era uma esplêndida residência, na Lagoa Rodrigo de
Freitas, cercada de jardins e tendo ao lado uma bela piscina.
Pena que a favela, com seus barracos grotescos se alastrando pela encosta do morro, comprometesse tanto a paisagem.
Diariamente desfilavam diante do portão aquelas mulheres silenciosas e magras, lata d’água na cabeça. De vez em
quando surgia sobre a grade a carinha de uma criança, olhos
grandes e atentos, espiando o jardim. Outras vezes eram as
próprias mulheres que se detinham e ficavam olhando.
Naquela manhã de sábado ele tomava seu gim-tônica no
terraço, e a mulher um banho de sol, estirada de maiô à beira
da piscina, quando perceberam que alguém os observava
pelo portão entreaberto.
Era um ser encardido, cujos molambos em forma de saia
não bastavam para defini-la como mulher. Segurava uma lata
na mão, e estava parada, à espreita, silenciosa como um
bicho. Por um instante as duas mulheres se olharam, separadas pela piscina.
De súbito pareceu à dona da casa que a estranha criatura se esgueirava, portão adentro, sem tirar dela os olhos.
Ergueu-se um pouco, apoiando-se no cotovelo, e viu com
terror que ela se aproximava lentamente: já transpusera o
gramado, atingia a piscina, agachava-se junto à borda de
azulejos, sempre a olhá-la, em desafio, e agora colhia água
com a lata. Depois, sem uma palavra, iniciou uma cautelosa
retirada, meio de lado, equilibrando a lata na cabeça – e em
pouco sumia-se pelo portão.
Lá no terraço o marido, fascinado, viu toda a cena. Não
durou mais de um ou dois minutos, mas lhe pareceu sinistra
como os instantes tensos de silêncio e de paz que antecedem um combate.
Não teve dúvida: na semana seguinte vendeu a casa.
(Fernando Sabino, A mulher do vizinho. Adaptado)