Questões de Português - Uso dos conectivos para Concurso

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Q2048471 Português
FILOSOFIA DOS EPITÁFIOS

2.png (385×136) 

(Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)
O trecho “E, aliás, gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou.” (linhas 2 a 5) é construído sob a lógica da coesão sequencial que não se utiliza de marcadores argumentativos para ligar as estruturas oracionais. Caso se substituísse o sinal de ponto e vírgula por um marcador textual de coesão sequencial, sem que se altere a coerência do texto, ter-se-ia o seguinte conectivo: 
Alternativas
Q2047872 Português
Para responder a essa questão, assinale APENAS UMA ÚNICA alternativa correta e marque o número correspondente na Folha de Respostas.   


A alternativa em que há correspondência entre o termo transcrito e a ideia por ele expressa é 
Alternativas
Q2047840 Português
“Você tem um bom gênio, mas seu irmão é muito impulsivo.” Marque a opção correta. O termo destacado:
Alternativas
Q2047569 Português
As aventuras de Pi
(Fragmento)

    A história do meu nome não acaba com ele. Quando alguém se chama Bob, ninguém lhe pergunta “Como é que se escreve?”. Não é o que acontece com Piscine Molitor Patel.
    Alguns achavam que era P. Singh; deduziam que eu fosse *sique e ficavam se perguntando por que não estaria usando um turbante.
    Na época da faculdade, fui uma vez a Montreal com uns amigos. Certa noite, eu é que tive de pedir as pizzas.
    Já não aguentava mais aquela gente que falava francês cair na gargalhada ao ouvir o meu nome, portanto, quando o sujeito ao telefone perguntou “O seu nome, por favor?”, respondi “Sou quem sou”. Meia hora mais tarde, chegaram duas pizzas para um tal de “Soul Ken Soul...
    É verdade que as pessoas que conhecemos podem nos modificar, e, às vezes, de uma forma tão profunda que, depois disso, não somos mais os mesmos, nem com relação ao nosso nome. O apóstolo Simão que passa a se chamar Pedro; Mateus, também chamado Levi; Nataniel que é também Bartolomeu; Judas, não o Iscariotes, que assumiu o nome de Tadeu; Simeão que ficou conhecido como o negro; Saulo que passou a ser Paulo.
    O meu soldado romano estava parado no pátio da escola, uma manhã, quando eu tinha doze anos. Eu tinha acabado de chegar. Ele me viu e um lampejo de gênio do mal se acendeu na sua mente estúpida. Erguendo o braço, apontou para mim e, aos berros, gritou meu nome acentuando a primeira sílaba em vez da segunda, como na palavra francesa:
     -Olha aí o Piscine Patel!
    Resultado: o que se ouviu foi pissing, “mijando” em inglês, a língua que todos falávamos ali.
     Num segundo, todo mundo estava rindo. Fiquei para trás quando fizemos fila para ir para a sala. Fui o último a entrar, envergando a minha coroa de espinhos.
     [,..]0 meu plano era melhor que isso.
    Resolvi botá-lo em prática já no meu primeiro dia de colégio, e na primeira aula. Ali na sala, havia outros ex-alunos do St. Joseph. A aula começou como todas elas começam: pela apresentação, íamos dizendo o nosso nome do nosso lugar, seguindo a ordem das carteiras em que estávamos sentados.
     [...]
    Tinha chegado a minha vez [...] Medina, me aguarde...
    Levantei do meu lugar e fui direto ao quadro-negro. Antes que o professor pudesse dizer uma palavra que fosse, peguei um giz e fui dizendo, enquanto escrevia:
     O meu nome é Piscine Molitor Patel conhecido como (sublinhei duas vezes as duas primeiras letras do meu nome) Pi Patel.
    Só por precaução, acrescentei π =3,14 e tracei um grande círculo que, depois, dividi em dois com a linha de diâmetro, para evocar a lição mais elementar da geometria.
     O silêncio foi total. O professor ficou olhando para o quadro. Eu prendi a respiração. Então, ele disse:
    -Tudo bem, Pi. Pode ir se sentar. Da próxima vez, peça permissão para sair da sua carteira.
-Sim, senhor.
MARTEL, Yann. As aventuras de Pi. Extraído do site: www.maismac.net/yannmartel_-_as_aventuras_de_pi.pdf.

*Sique: que ou quem segue o siquismo (religião monoteísta da índia). 
Considere as seguintes afirmações sobre aspectos da construção do texto:
I. Na frase “Ali na sala, havia outros EX-ALUNOS do St. Joseph.”, o termo destacado, pela nova ortografia, deveria ter sido escrito sem hífen: “EXALUNOS". II. Atentando para o uso do sinal indicativo de crase, o A destacado, no segmento “gritou meu nome acentuando Aprimeira sílaba em vez da segunda, como na palavra francesa”, deveria ser acentuado se estivesse no plural. III. Na frase “dividi em dois com a linha de diâmetro, PARA evocar a lição mais elementar da geometria.”, a palavra destacada poderia ser substituída por A FIM DE, fazendo-se as modificações necessárias.
Está correto apenas o que se afirma em:
Alternativas
Q2046896 Português
TEXTO II PARA A QUESTÃO

O trecho “E, aliás, gosto dos epitáfios; eles são, entre a gente civilizada, uma expressão daquele pio e secreto egoísmo que induz o homem a arrancar à morte um farrapo ao menos da sombra que passou.” (linhas 2 a 5) é construído sob a lógica da coesão sequencial que não se utiliza de marcadores argumentativos para ligar as estruturas oracionais. Caso se substituísse o sinal de ponto e vírgula por um marcador textual de coesão sequencial, sem que se altere a coerência do texto, ter-se-ia o seguinte conectivo:  
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Q2046595 Português
Passagem pela adolescência

    "Filho criado, trabalho redobrado." Esse conhecido ditado popular ganha sentido quando chega a adolescência. Nessa fase, o filho já não precisa dos cuidados que os pais dedicam à criança, tão dependente. Mas, por outro lado, o que ele ganha de liberdade para viver a própria vida resulta em diversas e sérias preocupações aos pais. Temos a tendência a considerar a adolescência mais problemática para os pais do que para os filhos. É que, como eles já gozam de liberdade para sair, festejar e comemorar sempre que possível com colegas e amigos de mesma idade e estão sempre prontos a isso, parece que a vida deles é uma eterna festa. Mas vamos com calma porque não é bem assim.
    Se a vida com os filhos adolescentes, que alguns teimam em considerar um fato aborrecedor, é complexa e delicada, a vida deles também o é. Na verdade, o fenômeno da adolescência, principalmente no mundo contemporâneo, é bem mais complicado de ser vivido pelos próprios jovens do que por seus pais. Vejamos dois motivos importantes.
    Em primeiro lugar, deixar de ser criança é se defrontar com inúmeros problemas da vida que, antes, pareciam não existir: eles permaneciam camuflados ou ignorados porque eram da responsabilidade só dos pais. Hoje, esse quadro é mais agudo ainda, já que muitos pais escolheram tutelar integralmente a vida dos filhos por muito mais tempo.
    Quando o filho, ainda na infância, enfrenta dissabores na convivência com colegas ou pena para construir relações na escola, quando se afasta das dificuldades que surgem na vida escolar - sua primeira e exclusiva responsabilidade -, quando se envolve em conflitos, comete erros, não dá conta do recado etc., os pais logo se colocam em cena. Dessa forma, poupam o filho de enfrentar seus problemas no presente, é claro, mas também passam a ideia de que eles não existem por muito mais tempo.
    É bom lembrar que a escola - no ciclo fundamental - deveria ser a primeira grande batalha da vida que o filho teria de enfrentar sozinho, apenas com seus recursos, como experiência de aprender a se conhecer, a viver em comunidade e a usar seu potencial com disciplina para dar conta de dar os passos com suas próprias pernas.
    Em segundo lugar, o contexto sociocultural globalizado atual, com ideais como consumo, felicidade e juventude eterna, por exemplo, compromete de largada o processo de amadurecimento típico da adolescência, que exige certa dose de solidão para a estruturação de tantas vivências e, principalmente, interlocução. E com quem os adolescentes contam para conversar?
    Eles precisam, nessa época de passagem para a vida adulta, de pessoas dispostas a assumir o lugar da maturidade e da experiência com olhar crítico sobre as questões existenciais e da vida em sociedade para estabelecer com eles um diálogo interrogador. Várias pesquisas já mostraram que os jovens dão grande valor aos pais e aos professores em suas vidas. Entretanto, parece que estamos muito mais comprometidos com a juventude do que eles mesmos.
    Quem leva a sério questões importantes para eles em temas como política, sexualidade, drogas, ética, depressão e suicídio, vida em família, vida escolar, violência, relações amorosas e fidelidade, racismo, trabalho etc.? Quando digo levar a sério me refiro a considerar o que eles dizem e dialogar com propriedade, e não com moralismo ou com excesso de jovialidade. E, desse mal, padecem muitos pais e professores que com eles convivem.
     Os adolescentes não conseguem desfrutar da solidão necessária nessa época da vida, mas parece que se encontram sozinhos na aventura de aprender a se tornarem adultos. Bem que merecem nossa companhia, não?

SAYÃO, Rosely. “As melhores crônicas do Brasil”. In cronicasbrasil.blogspot.com/search/label/Adolescência.
No fragmento “É que, como eles já gozam de liberdade para sair, festejar e comemorar” (1º §), o conectivo “como” está exprimindo sentido:
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Q2046432 Português
No que concerne ao uso dos elementos que promovem a conexão das frases e das ideias no texto, assinale a alternativa que preenche adequada e respectivamente as lacunas pontilhadas das linhas 20, 21 e 30.
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Ano: 2019 Banca: IDECAN Órgão: IF-PB Prova: IDECAN - 2019 - IF-PB - Professor - Geografia |
Q2046273 Português

TEXTO I PARA A QUESTÃO.


Na passagem "Desse modo, as mudanças recentes têm recolocado em pauta o debate sobre o problema da cidadania, (...)” (linha 10), o elemento “desse modo” marca a sequenciação textual. Não haveria qualquer desvio gramatical e a ideia seria preservada, caso se substituísse o conectivo citado por
Alternativas
Q2045503 Português
O texto permite considerar correta a alternativa
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Q2045469 Português
I. “Mas isso simplesmente não vem acontecendo.” (L.2).
II. “Na realidade, porém, boa parte do discurso criacionista trata de valores morais.” (L.22/23).
Os conectivos em negrito, nos fragmentos em destaque, estabelecem, respectivamente, as relações de
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Q2045342 Português
URUBUS E SABIÁS
(Rubem Alves)

Tudo aconteceu numa terra distante, no tempo em que os bichos falavam... Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes dotes para o canto, decidiram que, mesmo contra a natureza eles haveriam de se tornar grandes cantores.

E para isto fundaram escolas e importaram professores, gargarejaram dó-ré-mi-fá, mandaram imprimir diplomas, e fizeram competições entre si, para ver quais deles seriam os mais importantes e teriam a permissão para mandar nos outros. Foi assim que eles organizaram concursos e se deram nomes pomposos, e o sonho de cada urubuzinho, instrutor em início de carreira, era se tornar um respeitável urubu titular, a quem todos chamam de Vossa Excelência. Tudo ia muito bem até que a doce tranquilidade da hierarquia dos urubus foi estremecida. A floresta foi invadida por bandos de pintassilgos tagarelas, que brincavam com os canários e faziam serenatas para os sabiás... Os velhos urubus entortaram o bico, o rancor encrespou a testa, e eles convocaram pintassilgos, sabiás e canários para um inquérito.

— Onde estão os documentos dos seus concursos? E as pobres aves se olharam perplexas, porque nunca haviam imaginado que tais coisas houvessem. Não haviam passado por escolas de canto, porque o canto nascera com elas. E nunca apresentaram um diploma para provar que sabiam cantar, mas cantavam simplesmente...

— Não, assim não pode ser. Cantar sem a titulação devida é um desrespeito à ordem.

E os urubus, em uníssono, expulsaram da floresta os passarinhos que cantavam sem alvarás...”.

MORAL: Em terra de urubus diplomados não se houve canto de sabiá.
No trecho “Os urubus, aves por natureza becadas, mas sem grandes...”, a palavra em destaque exprime a ideia de:
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Q2044815 Português
Leia o fragmento a seguir.
O carro pegou fogo no meio do trânsito. O motorista não conseguiu sair do veículo. Um guarda de trânsito tentou ajudá-lo.

Se reescrevêssemos esse texto, substituindo a pontuação entre os períodos por conectores adequados, fazendo as modificações necessárias, a forma correta seria:
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Q2044621 Português
Os homens que se transformavam em barbantes
Moacyr Scliar

Havia uma cidade, grande, desenvolvida. As pessoas que moravam lá eram saudáveis, simpáticas e alegres. Não me lembro o nome da cidade, porque eu tinha quinze anos quando passei por ela, levado por meu pai. Nessa época, não me preocupava com o nome, mas sim com os lugares propriamente. Acontece que, certo dia, um habitante desta cidade saiu de casa, pela manhã, dirigindo-se alegremente ao emprego. Fez todas as coisas de praxe. Cumprimentou os vizinhos, o barbeiro da esquina, o vendeiro, os colegas no ponto de ônibus, agradeceu ao motorista, ao ascensorista, sentou-se em sua mesa. Nesse dia, no fim do expediente, o homem notou que seu pulso esquerdo parecia mais fino. ―Bobagem. Impressão. Acho que estou cansado demais.‖ Foi para casa, jantou, viu telenovela, dormiu. Na manhã seguinte, o pulso tinha se afinado mais. E suas canelas pareciam de criança. Chamou a mulher. Ela ficou tão impressionada, que o homem se arrependeu de ter mostrado. Não havia dor, apenas fraqueza. Partiu para o emprego. Contente, cumprimentando as pessoas e agradecendo ao motorista e ao ascensorista. No meio da tarde, porém, não conseguiu trabalhar. O pulso estava fino e dobrava-se. Maleável, sem consistência. O homem, envergonhado, puxou a manga da camisa. O mais que pôde, para que os colegas não vissem. Mas viram. Porque o homem tinha o corpo transformado. A cabeça, única coisa normal, caiu sobre a mesa. O torso não era mais grosso que um lápis, suas pernas e braços, finos como cordéis. Mas ele estava lúcido, coerente, o cérebro não tinha sido perturbado. Além do impacto, e da surpresa ante o estranho, o homem continuava o mesmo. Levado para casa, chamaram o médico. E o médico chamou outro médico. Porque:

— Não é o primeiro. É o terceiro, nesta semana.

Os jornais noticiaram o fato e as notícias trouxeram à luz novos casos. Pela cidade inteira, acontecia aquilo, as pessoas se adelgaçavam, tornavam-se frágeis. Em pouco tempo, outro fato surgiu, ao lado dos homens que se transformavam em barbantes. Eram os que se transformavam em vidro. Tinham que ter muito cuidado, ao andar pela rua, ao trabalhar, porque podiam se quebrar com qualquer batida. Vez ou outra, os homens de vidro se desfaziam. Em plena rua, à vista de todos. Como o vidro blindex que se estilhaça por inteiro. Aquela população alegre, saudável, descontraída, começou a viver apavorada. Sem saber se, a qualquer momento, o vírus (seria vírus?) podia atacar. Mudando a pessoa em vidro ou barbante. Muitos começaram a se mudar, indo para cidades distantes. A secretaria de saúde analisou o ar, a água, tudo, em busca das causas. Mas o ar era bom, não poluído. E as águas vinham de nascentes puras ou de poços artesianos límpidos. Pensou-se que algumas pessoas podiam estar colocando elementos venenosos na comida ou em caixas de água. Investigações nada concluíram. E até hoje, nada se sabe. A cidade parece estar se habituando à possibilidade de eventualmente alguém se transmutar. Não causa mais surpresa quando um barbante é levado pelo vento ou, em dias de chuva, é tragado pela enxurrada. Ou quando os vidros se liquefazem, no momento em que uma pessoa vira a esquina ou dá um esbarrão noutra. A população se acostumou. Parece que o homem se adapta às piores condições, conformando-se com os acontecimentos. Naquela cidade, tudo é muito frágil, a vida humana tem a espessura de um fio. Ou é delgada como um vidro. Mas isto vai se constituindo na normalidade.

Extraído de: BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Cadeiras proibidas. São Paulo: Global, 1998.
Observe o trecho a seguir, extraído do texto: "as águas vinham de nascentes puras ou de poços artesianos límpidos". O conectivo "ou" indica o sentido de:
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Q2044619 Português
Os homens que se transformavam em barbantes
Moacyr Scliar

Havia uma cidade, grande, desenvolvida. As pessoas que moravam lá eram saudáveis, simpáticas e alegres. Não me lembro o nome da cidade, porque eu tinha quinze anos quando passei por ela, levado por meu pai. Nessa época, não me preocupava com o nome, mas sim com os lugares propriamente. Acontece que, certo dia, um habitante desta cidade saiu de casa, pela manhã, dirigindo-se alegremente ao emprego. Fez todas as coisas de praxe. Cumprimentou os vizinhos, o barbeiro da esquina, o vendeiro, os colegas no ponto de ônibus, agradeceu ao motorista, ao ascensorista, sentou-se em sua mesa. Nesse dia, no fim do expediente, o homem notou que seu pulso esquerdo parecia mais fino. ―Bobagem. Impressão. Acho que estou cansado demais.‖ Foi para casa, jantou, viu telenovela, dormiu. Na manhã seguinte, o pulso tinha se afinado mais. E suas canelas pareciam de criança. Chamou a mulher. Ela ficou tão impressionada, que o homem se arrependeu de ter mostrado. Não havia dor, apenas fraqueza. Partiu para o emprego. Contente, cumprimentando as pessoas e agradecendo ao motorista e ao ascensorista. No meio da tarde, porém, não conseguiu trabalhar. O pulso estava fino e dobrava-se. Maleável, sem consistência. O homem, envergonhado, puxou a manga da camisa. O mais que pôde, para que os colegas não vissem. Mas viram. Porque o homem tinha o corpo transformado. A cabeça, única coisa normal, caiu sobre a mesa. O torso não era mais grosso que um lápis, suas pernas e braços, finos como cordéis. Mas ele estava lúcido, coerente, o cérebro não tinha sido perturbado. Além do impacto, e da surpresa ante o estranho, o homem continuava o mesmo. Levado para casa, chamaram o médico. E o médico chamou outro médico. Porque:

— Não é o primeiro. É o terceiro, nesta semana.

Os jornais noticiaram o fato e as notícias trouxeram à luz novos casos. Pela cidade inteira, acontecia aquilo, as pessoas se adelgaçavam, tornavam-se frágeis. Em pouco tempo, outro fato surgiu, ao lado dos homens que se transformavam em barbantes. Eram os que se transformavam em vidro. Tinham que ter muito cuidado, ao andar pela rua, ao trabalhar, porque podiam se quebrar com qualquer batida. Vez ou outra, os homens de vidro se desfaziam. Em plena rua, à vista de todos. Como o vidro blindex que se estilhaça por inteiro. Aquela população alegre, saudável, descontraída, começou a viver apavorada. Sem saber se, a qualquer momento, o vírus (seria vírus?) podia atacar. Mudando a pessoa em vidro ou barbante. Muitos começaram a se mudar, indo para cidades distantes. A secretaria de saúde analisou o ar, a água, tudo, em busca das causas. Mas o ar era bom, não poluído. E as águas vinham de nascentes puras ou de poços artesianos límpidos. Pensou-se que algumas pessoas podiam estar colocando elementos venenosos na comida ou em caixas de água. Investigações nada concluíram. E até hoje, nada se sabe. A cidade parece estar se habituando à possibilidade de eventualmente alguém se transmutar. Não causa mais surpresa quando um barbante é levado pelo vento ou, em dias de chuva, é tragado pela enxurrada. Ou quando os vidros se liquefazem, no momento em que uma pessoa vira a esquina ou dá um esbarrão noutra. A população se acostumou. Parece que o homem se adapta às piores condições, conformando-se com os acontecimentos. Naquela cidade, tudo é muito frágil, a vida humana tem a espessura de um fio. Ou é delgada como um vidro. Mas isto vai se constituindo na normalidade.

Extraído de: BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Cadeiras proibidas. São Paulo: Global, 1998.
Releia o trecho extraído do texto "As pessoas que moravam eram saudáveis, simpáticas e alegres". Assinale a alternativa CORRETA sobre a palavra em destaque:
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Q2044441 Português
O que a 'nova Terra' tem de especial?

Na última quarta (24), uma notícia deixou de orelhas em pé tanto os amantes da ficção científica quanto os da ciência da vida real: astrônomos do European Southern Observatory, um dos maiores observatórios do mundo, anunciaram a descoberta de um planeta que pode ter muitas das condições necessárias ao surgimento e à evolução da vida. Batizado de Próxima b, ele orbita uma anã vermelha chamada Proxima Centauri – e já foi carinhosamente apelidado de Nova Terra. Entenda por que e veja o que ele tem de bacana.

1. Ele está na distância perfeita de sua estrela.
O Próxima b está a 7,5 milhões de km de sua estrela-mãe, a Proxima Centauri. Isso é bem perto: é 5% da distância da Terra ao Sol. Mercúrio mesmo fica bem mais longe: a 57 milhões de km. Toda essa proximidade pode parecer ruim, mas está tranquilo, está favorável, para o planeta recém-descoberto: sua estrela é bem mais fria e muito menor do que o Sol – tem menos de 15% do diâmetro dele (pouco maior que Júpiter). Isso compensa a proximidade. Isso significa que, no Próxima b, pode haver água líquida, o ingrediente básico para a vida.

2. A estrela dele vai viver muito mais do que o Sol.
A Proxima Centauri é uma anã vermelha que pertence à constelação do Centauro, e que provavelmente tem a mesma idade que o Sol. Mas as análises dos astrônomos mostram que a Proxima vai continuar brilhando – e "alimentando" Próxima b – por alguns bilhões de anos depois de o nosso sol morrer, o que vai acontecer daqui a 7 bilhões de anos. Ou seja: contando que o planeta seja mesmo habitável e que, um dia, seja alcançável pelas nossas naves, poderemos nos mudar para lá, para passar mais alguns bilhões com um sol para chamar de nosso.

3. O céu no planeta, provavelmente, é vermelho.
Se você chegasse em Próxima b, em vez do familiar céu azul aqui da Terra, você veria uma imensidão vermelha, como um pôr do sol eterno. Isso porque a luz da estrela é avermelhada.

4. Ele está MUITO perto da gente.
Daqui até o Próximo b, é um pulinho (pelo menos, em termos astronômicos): só 4,2 anos-luz (37 trilhões de km). Pode parecer bastante, mas os outros planetas semelhantes à Terra que nós já encontramos ficam bem mais longe: o Kapteyn b, na constelação de Pictor, está a quase 13 anos-luz de distância; o Wolf 1061 c, na constelação do Serpentário, fica a 14 anos-luz; e o GJ 667 c, na constelação de Escorpião, a 22 anos-luz. De fato, a Proxima Centauri é a estrela que está mais perto do sistema solar – daí o nome da estrela, e o do planeta, que ganhou o nome da estrela adicionado da letra "b" – o "a" seria a própria anã vermelha.

5. Ele é uma Terra com esteroides
A massa do Próxima b é só 30% maior que a nossa. A princípio, isso não faz sentido. Os modelos científicos mais avançados de formação de corpos celestes mostram que as estrelas pequenas, como a Proxima Centauri, só conseguem comportar planetas minúsculos: bem menores que o nosso. Os astrônomos ainda não sabem o que possibilitou o crescimento do Próxima b (...).

6. Pode existir vida por lá.
O planeta está na chamada zona habitável da órbita da estrela – perto o bastante para que a água presente ali não congele, e longe o suficiente para que não evapore. Ou seja: ele pode ter água líquida, o ingrediente essencial para a vida. Essencial, mas não exclusivo: também é preciso haver um campo magnético que proteja o planeta da radiação que vem da estrela – que, no caso do Próxima b, é GRANDE: ele recebe 400 vezes mais raios X do que a Terra.

7. Ele não tem dia e noite
 Sabe a Lua, que está sempre com a mesma face voltada para a Terra? Então: com o Próxima b é a mesma coisa. A configuração da gravidade do planeta e da estrela, somada à proximidade dos dois, travou um "de frente" para o outro – não há rotação, só translação. Isso significa que Próxima b não tem dia e noite, mas também indica que o lado iluminado deve ter uma temperatura relativamente amena – que pode variar entre 0°C a 30°C –, enquanto o outro, sempre no escuro, pode chegar a um frio de -60°C. Mas isso até que é ok, se a gente considerar que a temperatura mais fria registrada na Terra foi de -89,2°C, no Polo Sul, e a mais quente, 54°C. (...)

(Helô D'Angelo. Disponível em: http://super.abril.com.br/ciencia/oque-a-nova-terra-tem-de-especial Acesso em: 30 ago. 2016. Adaptado).
Ainda no mesmo trecho: “uma notícia deixou de orelhas em pé tanto os amantes da ficção científica quanto os da ciência da vida real” (1º parágrafo), o articulador ‘tanto... quanto’ estabelece, nesse trecho, uma relação semântica de  
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Q2043302 Português
CINEMA PARA TODOS

Na obra “A Invenção de Hugo Cabret”, é narrada a relação entre um dos pais do cinema, Georges Mélies, e um menino órfão, Hugo Cabret. A ficção, inspirada na realidade do começo do século XX, tem como um de seus pontos centrais o lazer proporcionado pelo cinema, que encanta o garoto. No contexto brasileiro atual, o acesso a essa forma de arte não é democratizado, o que prejudica a disponibilidade de formas de lazer à população. Esse problema advém da centralização das salas exibidoras em zonas metropolitanas e do alto custo das sessões para as classes de menor renda.

Primeiramente, o direito ao lazer está assegurado na Constituição de 1988, mas o cinema, como meio de garantir isso, não tem penetração em todo território brasileiro. O crescimento urbano no século XX atraiu as salas de cinema para as grandes cidades, centralizando progressivamente a exibição de filmes. Como indicativo desse processo, há menos salas hoje do que em 1975, de acordo com a Agência Nacional de Cinema (Ancine).

Ademais, o problema existe também em locais onde há salas de cinema, uma vez que o custo das sessões é inacessível às classes de renda baixa. Isso se deve ao fato de o mercado ser dominado por poucas empresas exibidoras. Conforme teorizou inicialmente o pensador inglês Adam Smith, o preço decorre da concorrência: a competitividade força a redução dos preços, enquanto os oligopólios favorecem seu aumento. Nesse sentido, a baixa concorrência dificulta o amplo acesso ao cinema no Brasil.

Portanto, a democratização do cinema depende da disseminação e do jogo de mercado. Para levar os filmes a zonas periféricas, as prefeituras dessas regiões devem promover a interiorização dos cinemas, por meio de investimentos no lazer e incentivos fiscais.

Além disso, visando reduzir o custo das sessões, cabe ao Ministério da Fazenda ampliar a concorrência entre as empresas exibidoras, o que pode ser feito pela regulamentação e fiscalização das relações entre elas, atraindo novas empresas para o Brasil. Isso impediria a formação de oligopólios, consequentemente aumentando a concorrência. (...)

Autor: GABRIEL MERLI. Adaptado
Observe o trecho:
PARA levar os filmes a zonas periféricas, as prefeituras dessas regiões devem promover a interiorização dos cinemas, por meio de investimentos no lazer e incentivos fiscais.
O termo em negrito pode ser substituído, sem prejuízo do sentido e da correção, por:
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Q2043121 Português
Os adesivos na parede mostram sequências de atividades rotineiras: o passo a passo no banheiro, como usar o bebedouro, o comportamento dentro da escola. Se para a maioria das crianças é algo feito automaticamente, para aqueles com autismo pode ser um mecanismo fundamental. Juliana Lanser Mayer sabe disso e, quando o filho Rafael foi para a escola, ela percebeu que precisaria levar as figuras de dentro de casa para o colégio.
Isso permite que o menino de seis anos reconheça a ordem das atividades que deve desempenhar dentro da Escola Municipal Padre Martinho Stein, em Timbó. Na unidade, estudam outras quatro crianças autistas.
– Ele é muito visual, isso o ajuda __ seguir uma rotina, o que é importante para que ele não se desorganize – explica
__ mãe, que teve o cuidado de ir __ unidade antes do início do ano letivo conversar com __ direção e colar os adesivos nos principais pontos.[...]

Disponível em https://www.nsctotal.com.br/noticias/mae-adesiva-escola-de-timbo-para-filho-autista-reconhecer-rotina-na-unidade. Acesso em
14/02/2019. [adaptado] 
Assinale a opção que indica correta e respectivamente as relações que as palavras destacadas estabelecem no trecho “Se para a maioria das crianças é algo feito automaticamente, para aqueles com autismo pode ser um mecanismo fundamental. Juliana Lanser Mayer sabe disso e, quando o filho Rafael foi para a escola, ela percebeu que precisaria levar as figuras de dentro de casa para o colégio.”: 
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Q2042677 Português

Expatriaram o gato

Marina Colasanti, quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

       Atravessei a vila que dá saída ao meu prédio, e vi o gato. Todo branco, só a cauda preta e duas manchinhas mínimas na testa. Os olhos, azul cerúleo.

     “Psssit, psssit”, me inclinei. E ele veio buscar o lote de carícias que o som lhe prometia. É altamente provável que eu tenha tido mais prazer que ele nesse encontro.

      Gatos são animais elegantes. Embora eu admire qualquer animal, tenho que admitir a superioridade estética dos felinos com sua postura esnobe, sempre trajados para grande gala, sempre desfilando no tapete vermelho. Todo gato é star.

       E agora leio que o mercado editorial mudou o papel do gato e o transformou em uma espécie de filósofo de autoajuda. Os títulos se multiplicam, assim como as vendas. O substrato de tantas publicações semelhantes é que temos muito a aprender com os gatos. Segundo o francês Stéphane Garnier, autor de “Agir e pensar como um gato”, há cerca de 40 características positivas em um gato, que podem ser muito úteis para o ser humano.

       Depois de fazer do gato um pensador em “O gato filósofo”, utilizando em vez de miados as sábias vozes de Confúcio, Mêncio, e Lao-Tsé, a ilustradora chinesa Kwong Kuen Shan, repetiu a dose em “O gato zen”, “O gato e as orquídeas” e, proximamente, “As quatro estações do gato”. La Fontaine, um mestre na tipificação dos animais, não via no gato tantas virtudes. Nem se interessou grandemente por ele. Em mais de duzentas fábulas dos seus doze livros, só seis são centradas no gato, e sempre em relação ao rato, seu oponente principal. O retrato que sai dessas seis fábulas dificilmente poderia ajudar alguém a reequilibrar sua vida ou seu ego. Para

    La Fontaine, o gato é um animal feroz, em constante perseguição do inimigo, totalmente desprovido de misericórdia.

     O primeiro gato da minha vida foi “O gato de botas”. Tive até um disco com a versão musicada desse conto, e o ouvi tantas vezes que até hoje posso cantarolar trechos. Mas esse gato não era o sanguinário de La Fontaine, era o esperto de Perrault. Aliás, não era de nenhum dos dois, ou de nenhum dos três, já que os irmãos Grimm também escreveram uma versão. Era um gato bem mais antigo, que desde o século XVI morava nas páginas do livro “Le piacevoli notti” (as noites prazerosas) escrito pelo italiano Straparola.

       O gato daquele tempo era autossuficiente, pensava em si mesmo primeiro, almejava a boa vida. Mentiras e enganos lhes eram permitidos. E o Gato de Botas mente para o Rei, engana o Ogro e o come, para apossar-se do seu castelo e fazer com que o dono – que nada fez para merecê-lo – se case com a princesa. Um Gato nada exemplar, e deve ser por isso que as crianças, levadas a mentir pelas exigências dos adultos, gostam tanto dele.

     O segundo gato a cruzar minha vida, quase num empate com o primeiro, foi o de Pinóquio. Um gato meliante, falso cego, companheiro da raposa manca, dupla que engana a marionete, depois a assalta no escuro bosque e acaba por enforcá-lo num galho do Carvalho Grande. Esse tampouco serviria como coach de autoajuda.

        Os animais são tipificados há muitos séculos, desde o Panchatantra, livro de sabedoria indiana com fábulas de animais, escrito em sânscrito por volta do século III a.C. Cada animal tem suas características e sua função no jogo de identificação com os humanos, permitindo uma redução da narrativa. Agora vem a modernidade com sua sede de lucros embaralhar o jogo e trocar sobre a mesa cartas com as quais lidávamos desde sempre. De onde tira esse direito?


Disponível em: <https://www.marinacolasanti.com/2020/02/expatriaram
-o-gato.html> . Acesso em: 17 fevr. 2020.
“Mas esse gato não era o sanguinário de La Fontaine, era o esperto de Perrault. Aliás, não era de nenhum dos dois, ou de nenhum dos três, já que os irmãos Grimm também escreveram uma versão.”
O termo em destaque foi utilizado para introduzir uma
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Fazer nada


     Como a visita de um pássaro nos fez pensar no tempo.

        Conseguimos uns dias de folga e fomos passar um tempo cuidando um do outro. No hotel, em Itatiba, deram-nos o quarto 37, que se abre para um mar de morros verdes, com plantações, pastos, florestas. Fica no piso superior, tem pé-direito alto e uma varanda abraçada por árvores repletas de pássaros. À noite, entrou pela janela um passarinho. Minúsculo, branco no peito e na parte inferior da face, preto no dorso e na metade de cima da cabeça. Entrou pelo quarto, acelerado. Voava junto ao teto e não conseguia baixar até a altura da porta por onde havia entrado. Temíamos que se machucasse. Apagamos as luzes. Ele se acalmou e parou para descansar no toucador. Pulou em pé, no chão. Caminhou um pouco, ofegante. Usamos um chapéu para levá-lo à varanda, onde ficou ainda um tempo, refazendo-se. 
     Depois, vimos que deixou de lembrança um cocozinho na nossa cama. De onde teria vindo essa ave? Qual o significado do carimbo de passarinho sobre o lençol? Resisti à ideia de lembrar que excremento de pássaro é sinal de boa fortuna em antigas tradições. Augúrio? Sinal? Ali não havia mistério. Era apenas um bichinho assustado, acelerado demais. Talvez apenas apavorado por haver entrado em um lugar de onde parecia impossível sair. Mais do que um significado oculto, sua visita pode é nos inspirar, quem sabe, uma analogia. Quantas vezes o homem não se debate, na ilusão de que está acuado? Quantas vezes sofre sem perceber que está saturado por estímulos que ele próprio foi buscar? A sensação de que seu tempo é estrangulado, sem se dar conta de que é ele quem cultiva desassossego para si. Um amigo, sobrinho de um sábio do interior, costuma usar a imagem da trajetória errática e vã das formigas para ilustrar a ilusão que acomete o homem em movimentos inócuos e sem sentido, o esforço inútil. Não é à toa que se fale tanto na necessidade de ir com mais calma.
       Afinal, nós nunca aceleramos tanto. Na ilusão de anteciparmos o futuro, roubamos o momento seguinte e deixamos de vivê-lo. Convivemos sem prestar atenção no outro, respiramos com sofreguidão, comemos sem sentir o sabor. Fugimos do presente, o único tempo que existe e sobre o qual criamos a referência para um passado reconstruído na memória e um futuro sonhado. Como parar e fazer nada? Como apenas ser, sem se debater por ter entrado em uma porta estranha? Há quem não consiga relaxar e, simplesmente, fazer nada. Alguém já disse que fazer nada não é a completa falta de ação, mas a ação feita com desapego, sem visar resultado para si mesmo. Há algo de bom em atingir esse momento em que só se é parte da paisagem e não um observador separado. Se ainda quiséssemos procurar um significado para a visita da pequena ave, poderíamos dizer que ela veio trazer o tema para estas linhas que você lê agora. Como se nos dissesse: que bom que vocês conseguiram uns dias de folga e vieram aqui, cuidar um do outro. Sejam bem-vindos a este momento e esqueçam o resto. Fui.

(NOGUEIRA, Paulo. Vida Simples, ed. 37. São Paulo: Abril, 2006. Disponível em http://mdemulher.abril.com.br/revistas/vidasimples/. Edições/037/caminho/conteúdo_237474.shtml. Acesso em: 13/07/2019.)
EmAfinal, nós nunca aceleramos tanto.” (3º§), a expressão “afinal” pode ser substituída, sem alteração semântica, por:
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As utilíssimas coisas inúteis

Marina Colasanti, quinta-feira, 16 de janeiro de 2020


Fui a uma liquidação de fim de ano porque precisava trocar uma roupa que havia ganho. E fiquei pasma com a quantidade de peças que cada um levava. Na demora da fila, as pessoas esticavam o braço para colher de arara ou prateleira uma bolsa, um cinto ou uma camiseta não vistos antes e acabavam ficando com ela. Tudo, mais que propriamente despertar desejo, era visto como um bom negócio. Afinal, os preços estavam em conta.

E ali mesmo me perguntei se aquela gente toda tiraria do armário o correspondente ao que estava levando, ou se apenas apertaria os cabides.

Compro muito pouco, mas tenho grande dificuldade para jogar fora. Acumulo. E embora tendo isenção profissional para acumular livros e papéis, não a tenho para o resto.

Calcula-se que um europeu ou americano possua em média 10 mil objetos. Para discutir consumismo e gênero no “The Pink and Blue Project”, a sul-coreana Jeongmee Yoon fotografou durante 10 anos crianças e adolescentes no seu quarto, com todos os seus objetos expostos. As fotos são surpreendentes, cada quarto parecendo um mercado.

Até hoje não consegui jogar fora a cama da minha cachorrinha que há três anos morreu, me parece ingratidão, depois de tanto amor que ela me deu. Nem consegui me desfazer dos tecidos para quimono que comprei no Japão e nunca fiz, ou da camisa de seda que comprei na Índia e já não uso. Se uma calça fica larga, penso que posso voltar a engordar, se uma saia fica larga, aperto. Nunca nada ficou apertado, o que me faz crer que dificilmente engordarei. Às vezes consigo jogar fora suéteres que ficaram com “bolinhas”.

Dizem os neurocientistas que acumular é comando do nosso cérebro, possivelmente vindo de tempos remotíssimos em que a abundância era rara ou inexistente, e qualquer pedaço de carne, qualquer pele de bicho, qualquer lasca de pedra era posse valiosa.

Hoje, os objetos de que nos rodeamos adquiriram outro sentido. Um deles é fazer parte da nossa identidade. Segundo o psicólogo Daniel Kahneman sofremos mais ao perder um objeto querido do que o prazer que tivemos ao adquiri-los – podemos imaginar o que sofreu Eike Batista ao perder a Lamborghini que, como um sofá, ficava estacionada na sala. Outro é dizer às multidões quem somos, qual o nosso patamar social.

É o que fazem alto e bom som as marcas. É a função do luxo.

Não compramos só em atendimento ao nosso desejo. Compramos também olhando pelos olhos dos outros, projetando nos olhos dos outros a imagem que teremos com nossas novas aquisições. Desse ponto de vista, quem compra muitas peças de roupa numa liquidação não está fazendo um bom negócio. Apesar do bom preço, está adquirindo o que já saiu de moda, o que se usou no ano anterior ou até mesmo no mês anterior. E tudo o que não é de hoje, é out.

Objetos podem ser inúteis, mas se dados com afeto temos dificuldade em nos desfazer deles. Xuxa tinha uma casa só para guardar memorabilia, presentes dados pelos fãs. Ninguém joga fora o bordado feito pela afilhada, o primeiro desenho do filho, a folha seca na página do livro dada pelo noivo. Os objetos tornamse então não apenas objetos, mas testemunhos do passado que cantam aos nossos olhos. E por isso os guardamos.

Marie Kondo, a japonesa famosa pelo método MarieKondo de arrumação, não se orienta pela ligação psicológica entre os humanos e seus objetos. O interesse dela é na ordem e na estética. Mas ao limpar nossos armários e gavetas corre o risco de nos deixar despidos.


Disponível em:<https://www.marinacolasanti.com/2020/02/expatriaram-o-gato.htmL>  . Acesso em: 17 fev. 2020.
“Os objetos tornam-se então(1) não apenas(2) objetos, mas(3) testemunhos do passado que cantam aos nossos olhos. E(4) por isso(5) os guardamos.”
Por ser sinônimo e por preservar o sentido do contexto, o conector que poderia ser substituído por “unicamente” foi destacado e numerado em
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