Questões de Concurso Público Prefeitura de Boa Vista - RR 2016 para Médico - Anestesiologista
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Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Sobre o texto leia as afirmativas a seguir.
I. Dario é desumanizado passo a passo, perdendo, um por um, os objetos que o colocavam em conjunção com o estado de cidadão.
II. A ironia, propiciada pelo excesso de formalismo do estilo, gera uma visão crítica da realidade, resultando na desumanização dos que rodeiam Dario em seu momento de dor.
III. Em relação ao tempo da narrativa, o eixo de referência é estabelecido a partir da morte de Dario e da confusão formada no lugar.
Está correto o que se afirma em:
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Embora Dario seja apenas uma pessoa qualquer, ao ser nomeado toma-se real no enunciado textual. Da mesma forma, o que no nível das estruturas narrativas é definido como Povo (sujeito do fazer), no texto concretiza-se, linguisticamente, na(s) seguinte(s) categoria(s):
1. os indiferentes (cada pessoa, várias pessoas, mais de duzentos, alguns moradores): constância do plural e de pronomes definidos.
2. os solidários (dois ou três passantes, o senhor gordo, o rapaz de bigode, a velhinha de cabelo grisalho: alguém, um grupo, um terceiro, um senhor piedoso, um menino de cor e descalço): uso do numeral e do artigo definido, além da adjetivação.
3. a indeterminação para generalizar a indiferença e a espoliação que permite pressuposições sobre a ação que domina o texto. Nesta categoria, o uso do discurso indireto predomina sobre o direto.
Está correto apenas o que apresenta em:
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Sobre os elementos destacados do fragmento “Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva”, leia as afirmativas.
I. DE COSTAS e NA CALÇADA são circunstâncias adverbiais.
II. A palavra ELA é um pronome pessoal do caso reto.
III. SE, no contexto, é um pronome reflexivo.
Está correto o que se afirma em:
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
“Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim.” A respeito do trecho acima, quanto aos aspectos gramatical, sintático e semântico, analise as afirmativas a seguir.
I. A forma verbal HAVIA LEVADO está no pretérito mais-que-perfeito.
II. NINGUÉM é um pronome adjetivo indefinido.
III. Há um verbo no imperfeito do subjuntivo.
Está correto apenas o que se afirma em:
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
Considere as seguintes afirmações sobre aspectos da construção do texto:
I. Na frase “Dois ou três passantes rodearam-NO, indagando se ele não está se sentindo bem.”, o termo destacado retoma o vocábulo Dario.
II. Atentando para o uso do sinal indicativo de crase, o A, em todas as ocorrências no segmento “E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta.”, deveria ser acentuado.
III. Na frase “A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então A GENTE começou a se dispersar.”, a expressão destacada poderia ser substituída, fazendo-se as alterações necessárias, por NÓS.
Está correto o que se afirma em:
Texto para responder à questão.
Uma vela para Dario
Dario vinha apressado, o guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminui o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Foi escorregando por ela, de costas, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes rodearam-no, indagando se ele não está se sentindo bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, mas não se ouviu resposta. Um senhor gordo, de branco, sugeriu que ele devia sofrer de ataque.
Estendeu-se mais um pouco, deitado agora na calçada, e o cachimbo a seu lado tinha apagado. Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse, deixando-o respirar. E abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario roncou pela garganta e um fio de espuma saiu no canto da boca.
Cada pessoa que chegava se punha na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram acordadas e vieram de pijama às janelas. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao lado dele. Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que Dario estava morrendo. Um grupo transportou-o na direção do táxi estacionado na esquina. Já tinham introduzido no carro a metade do corpo, quando o motorista protestou: se ele morresse na viagem? A turba concordou em chamar a ambulância. Dario foi conduzido de volta e encostado à parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém afirmou que na outra rua havia uma farmácia. Carregaram Dario até a esquina; a farmácia era no fim do quarteirão e, além do mais, ele estava muito pesado. Foi largado ali na porta de uma peixaria. Imediatamente um enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse o menor gesto para espantá-las.
As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas que tinham vindo apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delícias da noite. Dario ficara torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os documentos. Vários objetos foram retirados de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do seu nome, idade, cor dos olhos, sinais de nascença, mas o endereço na carteira era de outra cidade.
Registrou-se tumulto na multidão de mais de duzentos curiosos que, a essa hora ocupava toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu contra o povo e várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo – os bolsos vazios. Restava apenas a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio – quando vivo – não podia retirar do dedo senão umedecendo-o com o sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu – “Ele morreu, ele morreu”, e então a gente começou a se dispersar. Dario havia levado quase duas horas para morrer e ninguém acreditara que estivesse no fim. Agora, os que podiam olhá-lo, viam que tinha todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não lhe pôde fechar os olhos ou a boca, onde as bolhas de espuma haviam desaparecido. Era apenas um homem morto e a multidão se espalhou rapidamente, as mesas do café voltaram a ficar vazias. Demoravam-se nas janelas alguns moradores, que haviam trazido almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario esperando o rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade, apagando-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
TREVISAN, Dalton. Cemitério de elefantes . Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 1964, p.33-35.
De acordo com os estudos de regência verbal e com o padrão culto da língua, leia as afirmações sobre os verbos destacados em “CARREGARAM Dario até a esquina; a farmácia ERA no fim do quarteirão e, além do mais, ele ESTAVA muito pesado.”
I. As três formas verbais correspondem ao núcleo do predicado das orações a que pertencem.
II. As três formas destacadas indicam, basicamente, o estado das coisas.
III. O primeiro verbo é significativo e necessita de complemento.
Está correto apenas o que se afirma em: