Primeiro bebê com DNA de três pessoas nasce no
Reino Unido
País foi o primeiro a regulamentar o tratamento de
doação mitocondrial, que utiliza parte de um óvulo de
uma doadora para evitar a transmissão de uma doença
grave pela mãe
O primeiro bebê com DNA de três pessoas diferentes
nasceu no Reino Unido. O país é pioneiro na
regulamentação da técnica chamada de tratamento de
doação mitocondrial (TDM), aprovada em 2015, que até
então havia sido realizada apenas em procedimentos
experimentais. Segundo a Autoridade de Fertilização
Humana e Embriologia britânica (HFEA, da sigla em
inglês), um total de 32 pacientes já receberam aval para
realizar o tratamento.
O TDM é destinado a mulheres que tenham um alto risco
de transmitir uma doença mitocondrial - disfunções sem
cura que afetam a mitocôndria, parte da célula
responsável pela produção de energia. Com ele, elas
podem ter filhos biológicos sem passar o diagnóstico aos
bebês. No Reino Unido, a regulamentação permite
apenas que indivíduos com formas graves do quadro
estejam elegíveis ao tratamento e eles devem passar
antes por uma análise e aprovação da HFEA.
No procedimento, os médicos utilizam as mitocôndrias
de um óvulo de uma doadora saudável para substituir a
parte que carrega as mutações danosas do gameta da
mãe. Existem dois métodos aprovados no Reino Unido,
mas em ambos o material da doadora corresponde a
menos de 1% da genética final da criança. Por isso, ela
não tem qualquer direito legal sobre o bebê e deve
permanecer em anonimato.
Os dois métodos são chamados de transferência do fuso
materno (TFM) e transferência pronuclear (TPN). No
primeiro, o material genético nuclear é removido do óvulo
da mãe e transferido para o da doadora. O gameta,
então, é fecundado por meio de fertilização in vitro (FIV)
com o esperma do pai para se criar o embrião saudável.
Na TPN, o óvulo da mãe é fertilizado com o esperma do
pai em laboratório, e o gameta doado é também
fertilizado com o mesmo esperma. Depois, os médicos
trocam o material genético nuclear do embrião formado
com o óvulo da doadora pelo material do outro embrião,
que carrega as informações de quem de fato será a mãe.
"Em ambas as técnicas, os embriões são criados usando
seu material genético nuclear (os genes que fazem de
você quem você é) e mitocôndrias saudáveis doadas",
explica a página sobre o tratamento da HFEA. Em
comunicado, a autoridade diz que, desde 2018, quando
a clínica de Newcastle se tornou o primeiro centro
licenciado para realizar o procedimento, mais de 30
aprovações já foram concedidas.
"Até 10 de maio de 2023, 32 pacientes receberam aprovação para tratamento de doação mitocondrial pelo
Comitê Estatutário de Aprovações da HFEA. São
decisões tomadas caso a caso, não havendo outras
opções para as famílias envolvidas e no estrito
cumprimento da lei", diz a nota.
Ao jornal britânico The Guardian , que questionou o órgão
sobre quantos nascimentos já haviam sido registrados no
país, já que até então nenhum havia sido divulgado, a
HFEA confirmou que o primeiro bebê fruto do tratamento
já havia nascido.
Além disso, disse que até abril deste ano foi registrado
um total "inferior a cinco". A autoridade não forneceu
números precisos por alegar que isso "poderia levar à
identificação de uma pessoa a quem o HFEA deve o
dever de confidencialidade". A resposta foi concedida ao
jornal apenas após um pedido de liberdade de
informação, uma legislação britânica semelhante à Lei de
Acesso à Informação no Brasil.
O procedimento
Estimativas apontam que um a cada seis mil bebês são
afetados por doenças chamadas de mitocondriais, que,
por envolverem a geração de energia, podem impactar
diversos órgãos do corpo, como músculos, fígado,
coração e cérebro.
Embora o Reino Unido tenha sido o primeiro local a
regulamentar a prática inovadora que diminui o risco
desses problemas, o primeiro nascimento por meio do
TDM no mundo foi registrado no México, anunciado em
27 de setembro de 2016.
O feito foi parte de um experimento conduzido pelo
cientista norte-americano John Zhang, da clínica de
fertilidade New Hope , que realizou a técnica de TFM na
cidade de Nova York, nos Estados Unidos. A equipe
criou cinco embriões, mas apenas um se desenvolveu
normalmente.
Ele, então, enviou o embrião saudável para o México,
onde foi inserido no útero da mãe. A mulher tinha genes
para Síndrome de Leigh, uma doença mitocondrial
considerada fatal. O bebê nasceu meses antes do
anúncio, no dia 6 de abril, sem a doença.
O sucesso do procedimento foi celebrado pela
comunidade científica, porém despertou preocupações
pelo fato de Zhang ter realizado o tratamento no México
para fugir das regulamentações rígidas dos EUA. Em
entrevista ao portal New Scientist na época, o cientista
insistiu que fez o certo. "Salvar vidas é a coisa ética a
fazer", disse.
O tratamento não é, porém, a única saída para mães que
carregam os genes e desejam ter filhos. Além da adoção
e do uso de um óvulo completo de uma doadora, os pais
que possuem uma doença genética que possa ser
transmitida aos filhos podem realizar biópsias nos
embriões gerados para identificar aqueles saudáveis. No
entanto, nem sempre a eficácia é 100%.
Retirado e adaptado de: YONESHIGUE, Bernardo. Primeiro bebê com
DNA de três pessoas nasce no Reino Unido. O Globo. Disponível em: -
coom-ddna--detres-pessoas-nasceno-reenoounnido.ghtml05/primeiro-bebe-com-dna-de-tres-pessoas-nasce-no-reino-unido.ghtml
Acesso em: 14 maio, 2023.