O abandono do lar conjugal

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Ano: 2018 Banca: FCC Órgão: DPE-AP Prova: FCC - 2018 - DPE-AP - Defensor Público |
Q873707 Direito Civil
O abandono do lar conjugal
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Antes de analisarmos as assertivas, faço aqui uma breve consideração acerca do abandono de lar, prevista no art. 1.573, IV do CC como sendo uma das causas da impossibilidade da comunhão de vida.
Segundo as lições do Prof. Flavio Tartuce, com a Emenda Constitucional 66/2010, conhecida como Emenda do Divórcio, não há mais qualquer modalidade de separação de direito ou jurídica, tendo sido retirados do ordenamento jurídico vários institutos e, entre eles, o abandono voluntário do lar conjugal (TARTUCE, Flavio. Direito Civil. Direito de Família. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 5. p. 227).
Pergunta: teria ainda alguma relevância jurídica o abandono de lar? Sim, lá no âmbito dos Direitos Reais, pois, de acordo com o art. 1.240-A do CC “Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".
Trata-se da usucapião especial urbana por abandono do lar, sendo semelhante a usucapião especial urbana, só que com um requisito temporal menor: ao invés de 5, são apenas 2 anos. É o menor prazo previsto, dentre todas as modalidades de usucapião previstas na lei, inclusive com relação a bens móveis.
Cuidando do tema, temos o Enunciado 500 do CJF: “A modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe a propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive homoafetivas".
Passemos à analise das assertivas.

A) INCORRETO. Segundo doutrina majoritária, tornou-se inviável a discussão de culpa, em ação de divorcio, após o advento da Emenda Constitucional 66/2010. Vejamos:
“Com a entrada em vigor da EC 66/2010 a questão da infidelidade deve ser vista com ressalvas. Como é notório, alterou-se o art. 226, § 6º da Constituição Federal de 1988, que passou a prever que “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio". Não há mais menção à separação judicial, havendo corrente doutrinária de peso que afirma a impossibilidade de discussão da culpa para a dissolução do casamento. Essa é a opinião de Rodrigo da Cunha Pereira, Maria Berenice Dias, Paulo Lôbo, Rolf Madaleno, Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, conforme manifestações exaradas ao autor desta obra. Para essa corrente, não é mais possível a discussão da culpa na separação judicial – agora extinta –, e no divórcio, para qualquer finalidade."(TARTUCE, Flavio. Direito Civil. Direito de Família. 12. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. v. 5. p. 111);

B) CORRETO. De acordo com o art. 1.240-A do CC; 

C) INCORRETO. O abandono do lar é um dos requisitos para a configuração da usucapião, tendo, portanto, relevância jurídica;

D) INCORRETO. Para que possa haver dano moral, é necessária a prova do dano, da conduta e do nexo de causalidade. Ocorre que com o dano i"n re ipsa" não há a necessidade de provar dano algum, pois ele se torna presumido, ou seja, independe de prova de abalo psicológico da vítima. É o que acontece, por exemplo, quando a pessoa tem seu nome inscrito indevidamente no cadastro de proteção ao crédito, de acordo com o entendimento do próprio STJ.
Pergunta: é possível dano moral in re ipsa no âmbito do direito de família? Vejamos o que entende a jurisprudência sobre o tema:
"Para a admissão do dano moral no âmbito da relação matrimonial, mostra-se necessário que o comportamento violador esteja acompanhado de circunstância extraordinária, capaz de evidenciar a potencialidade do dano, não configurado pela mera decepção, tristeza e sentimento de menosprezo derivados do abandono ou do adultério." (AREsp 743842, Relator Ministro LÁZARO GUIMARÃES). Portanto, os danos morais devem ser concedidos excepcionalmente, não se falando em dano moral presumido;

E) INCORRETO. De acordo com o art. 3º da Lei 12.318: “A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda". Lembrando que ela pode gerar a responsabilidade civil do alienador, por abuso de direito (art. 187 do CC), responsabilidade esta objetiva, em consonância com o Enunciado 37 do CJF.

RESPOSTA: (B)

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Comentários

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Para que se configure a usucapião familiar, é necessário que o ex-cônjuge ou ex-companheiro tenha abandonado o lar conjugal de forma dolosa, deixando o núcleo familiar a própria sorte, ignorando o que a família um dia representou. Assim, a simples saída de casa, não configura o abandono do lar, que deve ser interpretado de maneira cautelosa, com provas robustas amealhadas ao longo da instrução processual. (Apelação Cível nº 0004120-63.2013.8.24.0139, 1ª Câmara de Direito Civil do TJSC, Rel. Saul Steil. j. 06.10.2016).
 

Lembrando que a discussão da culpa está ultrapassada

Abraços

A) implica a culpa pelo fim do matrimônio, independente de prazo, de modo que acarreta a perda dos direitos patrimoniais decorrentes do casamento. Errada. Como salientado pelo colega Lúcio, a discussão da culpa não tem mais lugar na concepção moderna do Direito de Família - apesar de algumas bancas ainda reproduzirem artigos que se utilizam do instituto.

 

B) tem relevância, desde que dure pelo menos dois anos, como requisito para a configuração da usucapião familiar, se presentes os demais requisitos legais. Correta. Dispõe o artigo 1.240-A, do Código Civil: Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m², cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o dominio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural".

 

C) é uma mera situação de fato juridicamente irrelevante, uma vez superada a possibilidade de discussão de culpa para o divórcio. Errada. O abandono do lar tem relevância jurídica, conforme explicação da afirmativa B.

 

D) tem como efeito jurídico, desde que dure pelo menos dois anos, a ensejar a responsabilidade civil daquele cônjuge a indenizar o abandonado por dano moral in re ipsa. Errado. O abandono do lar, embora possa causar dano moral em situaçoes excepcionais, não é hipótese de dano moral in re ipsa.

E) consubstancia hipótese de alienação parental passível de suspensão do poder familiar, quando exista prole comum do casal. Errado. As hipóteses de alienação parental constam de rol expressamente exemplificativo, conforme o art. 2º, caput, da Lei n. 12.318/2010. Contudo, considera-se alienação parental "a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este". Assim, o simples abandono do lar não é apto a configurar hipótese de alienação parental - nada obstando, contudo, que a conduta de abandonar o lar, associado a outros elementos, possa configurar alienação parental.

USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR CONJUGAL: PONTOS RELEVANTES!

(EMAGIS) Sobre a aplicação da “USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR", prevista no art. 1.240-A do Código Civil, analise as seguintes proposições.

– A aquisição da propriedade na modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A só pode ocorrer em virtude de implemento de seus pressupostos anteriormente ao divórcio.

– O requisito “abandono do lar” deve ser interpretado de maneira cautelosa, mediante a verificação de que o afastamento do lar conjugal representa descumprimento simultâneo de outros deveres conjugais, tais como assistência material e sustento do lar, onerando desigualmente aquele que se manteve na residência familiar e que se responsabiliza unilateralmente pelas despesas oriundas da manutenção da família e do próprio imóvel, o que justifica a perda da propriedade e a alteração do regime de bens quanto ao imóvel objeto de usucapião.

– A fluência do prazo de 2 (dois) anos previsto pelo art. 1.240-A para a nova modalidade de usucapião nele contemplada tem início com a entrada em vigor da Lei n. 12.424/2011.

– Cobramos, no presente exercício, três Enunciados plasmados nas Jornadas de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal (CJF) relativamente à chamada “USUCAPIÃO POR ABANDONO DO LAR", introduzida pela Lei 12.424/11.

– Lembremos, para bem nos situarmos nas discussões, o que dita o art. 1.240-A do Código Civil, incluído pelo referido Diploma Legal:

– Pois bem.

– O item I alinha-se ao magistério cristalizado no ENUNCIADO N. 499, assim redigido:

– A aquisição da propriedade na modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil só pode ocorrer em virtude de implemento de seus pressupostos anteriormente ao divórcio.

– O requisito “abandono do lar” deve ser interpretado de maneira cautelosa, mediante a verificação de que o afastamento do lar conjugal representa descumprimento simultâneo de outros deveres conjugais, tais como assistência material e sustento do lar, onerando desigualmente aquele que se manteve na residência familiar e que se responsabiliza unilateralmente pelas despesas oriundas da manutenção da família e do próprio imóvel, o que justifica a perda da propriedade e a alteração do regime de bens quanto ao imóvel objeto de usucapião".

– Por sua vez, o item II está amparado no ENUNCIADO N. 498, que bem aplica o direito intertemporal e impede a retroação da novel regra legal. Eis o que dispõe esse verbete:

– A fluência do prazo de 2 (dois) anos previsto pelo art. 1.240-A para a nova modalidade de usucapião nele contemplada tem início com a entrada em vigor da Lei n. 12.424/2011".

ENUNCIADO N. 500, in verbis:

– A modalidade de usucapião prevista no art. 1.240-A do Código Civil pressupõe a propriedade comum do casal e compreende todas as formas de família ou entidades familiares, inclusive homoafetivas".

– Com efeito, o próprio art. 1.240-A fala em "propriedade dividida", donde ser necessário que o bem em testilha seja de propriedade comum do casal.

A letra C diz: "é uma mera situação de fato juridicamente irrelevante, uma vez superada a possibilidade de discussão de culpa para o divórcio".

A primeira parte dela está INCORRETA, pois como se vê no item B, considerado CERTO, o abandono do lar possui SIM relevância jurídica. 

Já a segunda parte da assertiva está CORRETA, afinal, encontra-se atualmente superada a discussão da culpa para a ação de divórcio, conforme a mais abalizada doutrina!

Espero ter colaborado!

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