Releio “Os jornalistas”, de Honoré de Balzac, ele-mesmo
um escritor jornalista a apontar desvios da ética na imprensa
de seu tempo. Com estilete do sarcasmo, indicou a prevalência de “lados da notícia”, a duração dos fatos nas páginas e
escondimentos propositais. Beliscou a venalidade de articulistas franceses de meados do século 19. As ambições particulares se sobrepunham às carências coletivas; as impressoras se alocavam às conveniências individuais, governos,
corporações ideológicas. Mostrou o jesuitismo artificial de
colunistas cercados de bajuladores a aplaudi-los. Encenando
imparcialidade, curvavam-se aos influentes e poderosos. Altissonantes, fingiam defender grandes causas, mormente as
acenadas como modernas, libertárias.
Sobre editores-proprietários-gerentes, Balzac foi ainda
mais incisivo. Alinhavam-se ao sistema dominante cujo triunfo lhes interessava. E eram respeitados por temor. Viam na
imprensa uma aplicação de capitais cujos juros lhes eram pagos em favores econômicos e autoridade. Quando unida às
oposições, tinha consciência de que elas eram aferradas em
tomar para si os anseios e necessidades sociais, sem que o
cidadão comum lhes desse crédito.
No estilo escrutínio da escola realista, palavras do livro
se articulam para escancarar hipocrisias, falsidades. Alegando que os franceses tinham inclinação por tudo que é tedioso,
caçoava duma categoria de redatores a chamá-los de “nadólogos”. Eram notários que falavam, falavam e nada diziam.
Alcoviteiros da política, negociantes de frases, mostravam-se
superiores, promoviam gracejos para admiração de colunistas severos. Mas estes se calavam ao ingressarem no serviço público. Lá se domesticavam a gozarem do silêncio de
colegas na espera de convites e cargos.
Irritado com os críticos de arte a não lhe darem sossego, Balzac apontou-lhes o dedo. Pintou-os como vaidosos,
incultos, falaciosos que, sem talento para a arte, erguiam
muralhas de censura das ideias. Para o autor, a crítica tinha
apenas uma serventia: a sobrevivência dos críticos.
Ficção e agudo exame da sociedade se mesclaram na
obstinada defesa do bom jornalismo. Escreveu: “Se a imprensa não existisse, seria preciso inventá-la”. São mensagens
que instigam raciocínios, convidam à reflexão. Mormente dos
que buscam notícias isentas, o jornalismo amigo dos fatos.
(Romildo Sant’Anna. Diário da Região, 05.02.2023. Adaptado)
No segundo parágrafo, identificam-se mecanismos de
referenciação textual expressando as noções de reflexividade e pertencimento, respectivamente, nas expressões
destacadas em