Atente para as seguintes afirmações, referentes ao texto: I...
Mort. Ed Mort. Detetive particular. Está na plaqueta. Durante meses ninguém entrara no meu escri – escritório é uma palavra grande demais para descrevê-lo – a não ser cobradores, que eram expulsos sob ameaças de morte ou coisa pior. De repente, começou o movimento. Entrava gente o dia inteiro. Gente diferente. Até as baratas estranharam e fizeram bocas. Não levei muito tempo para saber o que tinha havido. Alguém trocou minha plaqueta com a da escola de cabeleireiros, ao lado. A escola de cabeleireiros passou o dia vazia. Voltaire, o ratão albino, que subloca um canto da minha sala, emigrou para lá. Quando recoloquei a plaqueta no lugar, Voltaire voltou. Ele gosta de sossego. Mort. Ed Mort. Está na plaqueta certa.
Eu estava pensando no meu jantar da noite passada – isto é, em nada – quando ela entrou. Nem abri os olhos. Disse: “A escola de cabeleireiros é ao lado”. Mas quando ela falou, abri os olhos depressa. Se sua voz pudesse ser engarrafada seria vendida como afrodisíaco. Ela não queria a escola de cabeleireiros.
– Preciso encontrar meu marido.
– Claro – disse eu. – Vá falando que eu tomo nota.
Meu bloco de notas fora levado pelas baratas. Uma ação de efeito psicológico. O bloco não lhes serviria para nada. Só queriam me desmoralizar. Peguei o cartão que um dos pretendentes a cabeleireiro deixara em cima da minha mesa, com um olhar insinuante, no dia anterior. Tenho um certo charme rude, não nego. Sou violento. Sorrio para o lado. Uso costeletas. No cartão estava escrito Joli Decorações e um nome, Dorilei. Virei do outro lado. Comecei a escrever enquanto ela falava. A Bic era alugada.
(VERÍSSIMO, Luis Fernando. As cem melhores crônicas brasileiras /
Joaquim Ferreira dos Santos, organização e introdução. – Rio de
Janeiro: Objetiva, 2007. Fragmento.)
Atente para as seguintes afirmações, referentes ao texto:
I. Em “A Bic era alugada.”, o autor utiliza como recurso estilístico da linguagem, uma palavra por outra com a qual se acha relacionada.
II. A referência às baratas e ao rato albino demonstra o uso de uma linguagem conotativa que confirma e enfatiza a real situação profissional em que se encontrava o detetive particular.
III. O período “Durante meses ninguém entrara no meu escri – escritório é uma palavra grande demais para descrevê-lo – a não ser cobradores, que eram expulsos sob ameaças de morte ou coisa pior.” (1º§) evidencia que o detetive particular demonstra conformismo em seu ambiente de trabalho.
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À exceção do item I, que demanda reconhecimento de figura de linguagem, os outros dois podem ser analisados a partir da leitura do texto. Façamos a análise de cada item a seguir:
I. Em “A Bic era alugada.”, o autor utiliza como recurso estilístico da linguagem, uma palavra por outra com a qual se acha relacionada.
Correto. Percebe-se a presença de uma figura de linguagem denominada metonímia, que define a substituição de uma palavra por outra que lhe seja próxima ou alusiva. No caso em apreço, trocou-se o produto (caneta) pela marca (Bic);
II. A referência às baratas e ao rato albino demonstra o uso de uma linguagem conotativa que confirma e enfatiza a real situação profissional em que se encontrava o detetive particular.
Correto. A reação das baratas, que estranhavam o vaivém de pessoas, sugere abandono, falta de serviço, de trabalho;
III. O período “Durante meses ninguém entrara no meu escri – escritório é uma palavra grande demais para descrevê-lo – a não ser cobradores, que eram expulsos sob ameaças de morte ou coisa pior.” (1º§) evidencia que o detetive particular demonstra conformismo em seu ambiente de trabalho.
Incorreto. A bem da verdade, evidencia, sobretudo, exasperação desenfreada por parte dele, uma vez que eram os cobradores escorraçados e ameaçados.
Letra B
III. O período “Durante meses ninguém entrara no meu escri – escritório é uma palavra grande demais para descrevê-lo – a não ser cobradores, que eram expulsos sob ameaças de morte ou coisa pior.” (1º§) evidencia que o detetive particular demonstra conformismo em seu ambiente de trabalho.
Discordo do gabarito. A fúria dele contra os credores não exclui seu conformismo com a situação decadente de seu escritório. Veja, ele só reage quando da presença de credores. Fora isso, tá absolutamente acomodado. E ainda há, no texto, outras passagens que demonstram essa resignação.
Gabarito: B
lll - acredito que ele não estava conformado, mas estava desesperançoso, desanimado. Quando fala que escritório é uma palavra grande demais para descrevê-lo, percebe-se o desânimo do detetive. E também, em minha interpretação, expulsar os cobradores sob ameaça de morte ou coisa pior, não é um gesto de uma pessoa conformada, mas de uma pessoa que devido a seu desânimo, demonstrou raiva. Já em outro trecho, quando a mulher chegou e mencionou interesse em seu serviço, ele de repente se animou para ajudá-la. Se ele estivesse conformado, não estaria nem aí para a demanda dela.
III - ao meu ver, ele estava inconformado com o fato do escritório dele ser muito pequeno, tanto é que ele corta a frase no meio, demonstrando falta de conformidade com a sua situação.
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