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Q475835 Sociologia
Quanto à sociologia jurídica, julgue o  item  subsequente.

Sob o ponto de vista da teoria marxista, a ideologia pode ser compreendida como uma falsa representação. De acordo com esse entendimento, a ideologia jurídica pode ser um instrumento de dominação exercido pelo Poder Judiciário em relação aos seus jurisdicionados.
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A primeira parte da assertiva está correta. Grande parte das concepções de Marx sobre o conceito de ideologia pode ser extraída da obra “a ideologia alemã”. Nela, Marx aponta a ideologia como uma espécie de alienação, como “falsas representações”. Nesse sentido: “até o presente os homens sempre fizeram falsas representações sobre si mesmos. […] Os produtos de sua cabeça acabaram por se impor à sua própria cabeça” (Marx, 1979, p. 17).

Conforme Flávio Pompeo (2008), a ideologia é vista como parte do terreno da super-estrutura.  Dessa forma, as ideologias, que são falsas representações do mundo, são decorrências de contradições fundamentadas nas condições materiais da sociedade.

A ideologia começa a surgir com a divisão do trabalho social, que traça distinção entre o trabalho manual e o trabalho intelectual.

Segundo o próprio Marx, “a produção de idéias, de representações, da consciência, está, de início, diretamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material dos homens, como a linguagem da vida real” (Marx, 1979, p. 36).

E continua, mais a frente: “se, em toda a ideologia, os homens e suas relações aparecem invertidos como numa câmara escura, tal fenômeno decorre de seu processo de vida” (Marx, 1979, p. 37).

O equívoco da assertiva reside em atrelar à teoria marxista a crença de que o Poder Judiciário utiliza da ideologia como instrumento de dominação. Apesar de ser plausível e aceitável, dentro de algumas interpretações marxistas, considerar o direito como um instrumento de dominação utilizado e manipulado pelas classes dominantes nas sociedades capitalistas contemporâneas, dentro de uma concepção marxista seria incorreto afirmar que é o próprio Poder Judiciário que exerce a dominação em relação aos seus jurisdicionados.   

FONTE:

MARX, Karl e Friedrich Engels. A ideologia alemã. 2a ed. São Paulo: Livraria Editora Ciências Humanas, 1979.

POMPÊO, Flávio Sposto. Sobre a ideologia. 2008. Disponível em: <http://www.consciencia.org/sobre-a-ideologia>. Acesso em: 04 dez. 2015.


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Comentários

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Acredito que a primeira frase está correta: 

Nesse sentido, a ideologia pode ser definida como um "sistema de representações que servem para sustentar relações existentes de dominação de classes através da orientação das pessoas para o passado em vez de para o futuro, ou para imagens e ideais que escondem as relações de classe e desviam da busca coletiva de mudança social". 


O erro está em dizer que a ideologia jurídica é um instrumento de dominação exercido pelo Poder Judiciário. A ideologia jurídica é utilizada pela classe dominante para manter a sua posição privilegiada na sociedade. Um pouco sobre o tema: 

 "Luis Alberto Warat enumerou alguns pontos centrais da ideologia jurídica dominante:

- A ordem jurídica nos fornece segurança.

- O direito positivo é a garantia da paz social.

- O direito é árbitro neutro nas disputas entre os homens.

- É legítima a utilização da força física pelo Estado (transformação da força em legalidade, da dominação em dever).

- A obrigação de obedecer às leis deriva de um valor universal de justiça.

- A sanção jurídica tem finalidades éticas."


Fonte: http://www.arcos.org.br/livros/introducao-ao-direito/v-ideologia-e-direito

Errada. 



Concordo com Memuara S.: é a segunda parte da questão que está errada. A dominação não acontece do Judiciário sobre os jurisdicionados como se os juízes fossem uma classe social em si (o que não é verdade, porque o Direito e suas decorrências não integram a infraestrutura); a dominação por meio da jurisdição é instrumental para a manutenção do poder da burguesia (que também compõe o conjunto de "jurisdicionados") sobre o proletariado. Passei o olho rápido pelo enunciado e errei a questão.

O eixo sociologia/filosofia/direitos humanos praticado nas provas da DPU é, ao meu ver, muito difícil. As questões rendem um debate acadêmico e comportam múltiplas possibilidades de reflexão. Não deveriam estar, assim, em uma prova objetiva. Começando pelo fim, ou seja, pela minha justificativa para o gabarito, acho que o fundamento é jurídico-dogmático: o Poder Judiciário possui personalidade distinta da personalidade de seus membros. Logo, não poderia exercer dominação em relação aos seus juridicionados.

A justificativa é fraca, eu sei, sobretudo de ponto de vista "marxista". Passo, pois, as razões pelas quais discordo do gabarito.

Sob a perspectiva marxista, ou ao menos pelo que entendo ser "perspectiva marxista" (existe só uma?), acho correta a seguinte passagem: "a ideologia jurídica pode ser um instrumento de dominação exercido pelo Poder Judiciário em relação aos seus jurisdicionados.

Afinal, que uma boa alma me corrija, acho que é mais ou menos comum entre marxistas considerar que: (1) (1.1.) A ideologia projeta, no domínio dos valores e normas sociais, a dominação exercitada pela classe detentora dos meios de produção (e, de antemão, lembro que atualmente essa ideia de produção não se circunscreve ao espaço empresarial-laboral, abraçando também o espaço da comunidade, família, etc - Boaventura de Souza Santos). (1.2.) Sentimos a influência da ideologia em nossas vidas quando recebemos a informação de que nossas possibilidades de desenvolmento pessoal e interação social - em tese infinitas, sob o paradigma da modernidade - são limitadas por um catálogo de valores, normas e sanções que cumpre a função de legitimar a dominação exercitada pela classe detentora dos meios de produção. (2) O funcionamento das instituições estatais é orientado pela ideologia, motivo pelo qual "um primeiro aspecto a ser abordado numa crítica da ideologia jurídica é seu objeto ou ponto de partida das interpretações e distorções: a lei" (http://www.unicamp.br/cemarx/ANAIS%20IV%20COLOQUIO/comunica%E7%F5es/GT2/gt2m2c4.pdf).

Nesse contexto, não podemos mesmo considerar que "a ideologia jurídica pode ser um instrumento de dominação exercido pelo Poder Judiciário em relação aos seus jurisdicionados"?

Situação concreta: tratamento aprovado pela ANVISA. Fornecimento obrigatório no âmbito da saúde suplementar (ANS). Não aprovado pelo CONITEC (logo, não incorporado aos protocolos de tratamento do SUS). Uma dentre algumas teses defendidas pelo Poder Judiciário. O médico credenciado pelo SUS é livre para prescrever o melhor tratamento para o usuário do SUS, mas o fornecimento deste tratamento somente irá ocorrer mediante tutela judicial se comprovado que as alternativas fornecidas pelo SUS não são satisfatórias. Pesquisem no google sobre "cidadãos de segunda classe". E aí, será que está errada a assertiva? Daí eu ter dito que considero o eixo sociologia/filosofia/direitos humanos da DPU muito difícil.

Pífio reduzir a noção de ideologia a luta de classe, ou dizer que só existe ideologia burguesa. O próprio conceito de ideologia de Marx é retirado da fenomenologia de Hegel que trata sobre a dialética do senhor e do escravo. Na ideologia alemã faz-se uma critica à filósofos alemães, inclusive da esquerda hegeliana. A noção de luta de classe só nasce numa terceira fase, com a publicação d'O Capital'. Dizer que o Poder Judiciário não pode construir um discurso ideológico-jurídico para pacificar, fazer acatar, admitir uma certa noção de justiça ou de prestação jurisdicional, ou seja criar uma falsa realidade, um arcabouço simbólico que não se confunde simplesmente com o discurso burguês, mas o traduz em linguagem jurídica é ficar na superficialidade e no mesmo modelo copiar colar. Se é para cobrar filosofia assim, melhor não cobrar, já temos muitas coisas para decorar.PS: Verifiquei no dicionário do pensamento marxista ao menos 4 abordagens para o termo, sendo que essa cobrada é atribuída a outros interpretes como Gramsci.

Questão bem polêmica. A crítica dos possíveis modelos que partem de premissas marxistas permitem afirmar, sem dúvida alguma, que o Poder Judiciário faz parte de uma burguesia (regra). Pachukanis é um exemplo disso e permite uma leitura no sentido de compreender o enunciado como correto, visto que para P. o fim do modelo capitalista está relacionado ao fim do próprio direito.

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