A linguagem politicamente correta é a expressão do aparecime...
Texto 2
A LINGUAGEM POLITICAMENTE CORRETA
José Luiz Fiorin (USP)
No conto Negrinha, de Monteiro Lobato, lemos a seguinte passagem: “A excelente Dona Inácia era mestra na arte de judiar de crianças” (Monteiro Lobato: textos escolhidos. Rio de Janeiro, Agir, 1967, p. 75). No capítulo III, de Clara dos Anjos, de Lima Barreto, aparece a seguinte passagem: “Marramaque, poeta raté, tinha uma grande virtude, como tal: não denegrir os companheiros que subiram nem os que ganharam celebridade” (Prosa seleta. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 2001, p. 661). Em Machado de Assis, no conto Aurora sem dia, lê-se: “Ah! meu amigo, [...] não imagina quantos invejosos andam a denegrir meu nome” (Obra completa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, vol. II, p. 224). Diante desses textos não faltaria quem apontasse o dedo acusador para os três autores, tachando-os de racistas. Afinal, denegrir significa “diminuir a pureza, o valor de; conspurcar, manchar” e é construído com a mesma raiz da palavra negro; judiar quer dizer “tratar mal física ou moralmente, atormentar, maltratar” e é formado com o termo judeu. Mas será que podemos fazer essa acusação? Machado e Lima Barreto eram descendentes de negros; Lobato posicionou-se contra o nazifascismo e pode-se dizer que, à maneira de seu tempo, era antirracista.
A linguagem politicamente correta é a expressão do aparecimento na cena pública de identidades que eram reprimidas e recalcadas: mulheres, negros, homossexuais, etc. Revela ela a força dessas “minorias”, que eram discriminadas, ridicularizadas, desconsideradas. Pretende-se, com ela, combater o preconceito, proscrevendo-se um vocabulário que é fortemente negativo em relação a esses grupos sociais. A ideia é que, alterando-se a linguagem, mudam-se as atitudes discriminatórias.
Em 2004, a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República publicou uma cartilha intitulada Politicamente correto e direitos humanos, em que mostrava que determinadas palavras, expressões e anedotas revelam preconceitos e discriminações contra pessoas ou grupos sociais. Essa publicação gerou muita polêmica e levou o governo a recolhê-la. Muitos intelectuais proeminentes acusaram o governo de estar instaurando a censura (por exemplo, João Ubaldo Ribeiro, no artigo “O programa Fala Zero”, publicado em O Estado de S. Paulo, de 8/5/2005, p. D3, e Ferreira Gullar, no artigo “A coisa está branca”, publicado na Folha de S. Paulo, de 15 de maio de 2005, p. E 12). Declaravam que se tratava de um ato autoritário de um governo que pretendia até mesmo controlar o que as pessoas dizem; que o poder público tinha coisas mais importantes, como a educação e a saúde, com que se preocupar. Chegaram a afirmar que poderíamos ser presos, se disséssemos alguma coisa que contrariasse as normas linguísticas governamentais. Bradavam que se pretendia engessar a língua, impedindo o seu desenvolvimento.
Não vamos fazer a maldade de argumentar, dizendo que chama atenção
que esses furiosos críticos do governo (no geral, articulistas dos principais jornais
do país) não tivessem tido a mesma irada reação, quando os jornais em que
escrevem vetaram o uso, em suas páginas, de uma série de palavras ou expressões por denotarem preconceito, discriminação ou ofensa em relação a determinados grupos sociais (conferir, por exemplo, o verbete “preconceito” do Manual
de redação da Folha de S. Paulo (2001, p. 94) ou o verbete “ética interna” do
Manual de redação e estilo de O Estado de S. Paulo (1990, p. 34-38)).
A linguagem politicamente correta leva-nos a pensar em uma série de aspectos a respeito do funcionamento da linguagem (meus argumentos concordam com os de Sírio Possenti, difundidos em comunicações e textos). O primeiro é que, como já ensinava Aristóteles, na Retórica, aquele que fala ou escreve cria, ao produzir um texto, uma imagem de si mesmo. Sem dúvida nenhuma, a presença de certas palavras num determinado texto faz que ele seja racista, machista, etc., criando uma imagem de que seu autor é alguém que tem preconceito contra as mulheres, os negros, os índios, os homossexuais e assim por diante. O que é preciso saber é se combater o uso de palavras ou expressões que patenteiam a discriminação é um instrumento eficaz de luta contra ela.
De um lado, é verdade que a linguagem modela sentimentos e emoções. Se alguém sempre ouviu certos termos ou expressões, como negro, bicha ou coisa de mulher, ditos com desdém ou com raiva, certamente vai desenvolver uma atitude machista ou racista. Quem é tratado com gritos ou com ameaças seguramente não vai introjetar atitudes de bondade ou doçura. Portanto, usar uma linguagem não marcada por fortes conotações pejorativas é um meio de diminuir comportamentos preconceituosos ou discriminatórios. De outro lado, porém, é preciso atentar para dois aspectos. O primeiro é que o cuidado excessivo na busca de eufemismos para designar certos grupos sociais revela a existência de preconceitos arraigados na vida social. Se assim não fosse, poder-se-ia empregar, sem qualquer problema, por exemplo, o vocábulo negro, sem precisar recorrer à expressão afrodescendente. Em segundo lugar, os defensores da linguagem politicamente correta acreditam que existam termos neutros ou objetivos, o que absolutamente não é verdade. Todas as palavras, ensina Bakhtin, são assinaladas por uma apreciação social. Considera-se que os termos bicha, veado, fresco são mais preconceituosos que a designação gay. Isso é parcialmente verdadeiro, pois os três primeiros estão marcados por pesada conotação negativa. No entanto, o termo gay também vai assumindo valor pejorativo, tanto que, à semelhança do aumentativo bichona e do diminutivo bichinha, criaram-se gayzaço e gayzinho. Isso ocorre porque as condições de produção de discursos sobre a mulher, o negro, o homossexual, etc. são as de existência de fortes preconceitos em nossa formação social. Isso significa que não basta mudar a linguagem para que a discriminação deixe de existir. Entretanto, como a conotação negativa é uma questão de grau, não é irrelevante deixar de usar os termos mais fortemente identificados com atitudes racistas, machistas, etc. [...]
http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao01/artigos_alinguagempoliticament
ecorreta.htm [adaptado]
Analise as afirmativas sobre as aspas na passagem anterior:
I. Enfatizam outra fala. II. Evidenciam um conceito. III. Realçam a expressão.
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Vamos analisar o tema central da questão, que é o uso das aspas no texto fornecido. As aspas são utilizadas para diversos fins em um texto, como destacar uma expressão, enfatizar uma ideia ou evidenciar um conceito. A questão pede para identificar qual dessas funções se aplica ao uso das aspas na expressão "minorias" no texto.
A alternativa correta é a C - III, apenas.
Justificativa:
Alternativa C (III, apenas): As aspas na expressão "minorias" são usadas para realçar essa expressão, sugerindo uma possível ironia ou questionamento sobre o termo, uma vez que o autor pode estar indicando que o termo "minorias" é uma convenção social, ressaltando sua complexidade. As aspas aqui destacam a expressão de uma forma que nos leva a refletir sobre o significado e a conotação do termo.
Alternativa A (I, apenas): As aspas não estão enfatizando outra fala. Em geral, esse uso de aspas ocorre em citações diretas, o que não é o caso do texto em questão.
Alternativa B (II, apenas): Embora as aspas possam evidenciar um conceito, neste caso específico, elas servem mais para provocar reflexão do que para formalizar um conceito. Não se trata de uma definição formal, mas de uma maneira de abordar criticamente o termo "minorias".
Alternativa D (I, II e III): Como vimos, apenas a função de realçar a expressão (III) é válida para o uso das aspas na passagem analisada. Portanto, esta alternativa é incorreta.
É importante desenvolver uma boa compreensão sobre o uso das aspas nos textos, já que elas podem indicar intenções variadas por parte do autor. Compreender suas funções pode ajudar a interpretar melhor o sentido e a mensagem pretendida.
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Comentários
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Gab. C
A função básica das aspas é isolar qualquer parte do texto que não pertença ao autor que o escreve.
Usam-se ASPAS para:
*Isolar, no texto uma citação literal colhida de outra pessoa.
*Isolar palavras ou expressões que são alheias ao idioma padrão culto da fala:
- Os estrangeirismos;
- As gírias;
- Os modos populares da fala;
- Os arcaísmos;
- Dar ênfase a certas palavras ou expressões da frase;
- Manifestar sentido irônico ou um segundo sentido que se queira atribuir a uma palavra; etc
FONTE: Português descomplicado (Flávia Rita)
GAB:C
"A linguagem politicamente correta é a expressão do aparecimento na cena pública de identidades que eram reprimidas e recalcadas: mulheres, negros, homossexuais, etc. Revela ela a força dessas “minorias”, que eram discriminadas, ridicularizadas, desconsideradas."
Analise as afirmativas sobre as aspas na passagem anterior:
I. Enfatizam outra fala. (NÃO ESTA ENFATIZANDO A FALA DE NINGUEM)
II. Evidenciam um conceito. (NÃO ESTA EVIDENCIANDO NENHUM CONCEITO)
III. Realçam a expressão (SIM,ESTA REALÇANDO UMA EXPRESSÃO)
obs: SIGO DE VOLTA NO INSTA "carolrocha17" S2.. Tô sempre postando motivação nos storys
muito bom
A afirmativa II também está correta, afinal de contas, se considerarmos a literalidade da palavra, uma pessoa loira de olhos azuis também é minoria na população. Todavia, como estamos nos referindo a um conceito específico dessa palavra, ou seja, nos referindo àqueles que são discriminados, essa pessoa de olhos azuis não é enquadrada como minoria. Por isso o uso das aspas também serve para evidenciar um determinado conceito.
Achei essa questão bem subjetiva, penso que deveria ter sido anulada.
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