O conceito de universalismo de chegada

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   O conceito de “universalismo de chegada" foi elaborado pelo jurisfilósofo espanhol Joaquim Herrera Flores ao debater sobre o papel dos Direitos Humanos em unir os indivíduos em prol de lutas comuns pela dignidade. Entretanto, para se entender os Direitos Humanos como forma de resistência é preciso estabelecer o núcleo duro de direitos mínimos que garantiriam a dignidade do indivíduo. Na visão de Flores, essa definição deve passar antes pelo reconhecimento das diferenças culturais e pela compreensão de que tais direitos são uma construção. Ou seja, Flores defende a superação da clássica dicotomia entre a visão universalista e a visão culturalista dos Direitos Humanos.

   O universalismo, conceito derivado de uma concepção ocidental, defende que práticas universalistas neutras estabelecem um conjunto de direitos preestabelecidos. Seus seguidores buscam um marco comum de direitos que possibilitaria a convivência harmônica entre os indivíduos. Flores critica a visão universalista por levar à crença de que só há uma verdade sobre os fenômenos essenciais da condição humana, e que esta verdade é válida para todas as pessoas em todos os tempos. Ao contrário, ele acredita há muitos caminhos e muitas formas de ação como forma de resistência e para se lutar pela dignidade. É vital buscar um ponto de encontro em que todas as propostas e diferenças sejam levadas em conta.

   Já a visão culturalista, baseia-se em uma perspectiva mais comunitária, onde há primazia da comunidade, do local e, portanto, do valor da diferença. Esses fatores são essenciais para estabelecer o conjunto mínimo de direitos que satisfaçam os membros de determinado grupo. A dignidade está no respeito à sua diferença, às suas práticas particularistas. Um dos problemas que essa visão apresenta é compreender a cultura como algo fechado, e por isso determinado grupo não valora ou não incorpora aquilo que não coincide com sua cultura.

   Como resultado dessas premissas falhas de ambas as visões, surgem racionalidades e práticas sociais que não conseguem atender à função de resistência dos Direitos Humanos, pois não relacionam suas propostas com o contexto real, que, segundo Flores, hoje é regido por uma “racionalidade da mão invisível" ( que seria a racionalidade do capitalismo). A visão universalista, por exemplo, ao construir um sistema de regras e princípios  reconhecidos juridicamente, acaba por priorizar o formalismo e , nesse sentido, deixa de analisar questões importantes, como poder, diversidade e desigualdades econômicas. Essa racionalidade formal culmina em uma prática universalista que o teórico chamará de “universalismo de partida".

      Para Flores, a visão culturalista também constrói um universalismo - chamado por ele de “universalismo de retas paralelas"-. Nesse caso, a proposta é se fechar em si mesmo e por isso, impedir o indivíduo de ter conhecimento de outras formas de visão do mundo. Fruto de uma reação ao universalismo, a visão culturalista acaba por desenvolver uma perspectiva separatista, fomentando, muitas vezes, o conflito. Portanto, não auxilia a resistência, a luta contra opressão e sim, a desagregação.

        Nesse contexto, o jusfilósofo propõe uma visão mais complexa dos Direitos Humanos, realmente capaz de promover uma “racionalidade de resistência". Para tanto, se faz necessário, a priori, que os indivíduos se reconheçam como detentores de direitos e, além disso, se reconheçam em situação de opressão. Para compreender essa visão complexa, o indivíduo deve se situar na periferia e não no centro, pois é lá onde é possível reconhecer relações que nos mantém condicionados tanto interno quanto externamente. A pluralidade da periferia conduziria ao diálogo e à convivência. 

       E esse é um ponto essencial na visão proposta por Flores, uma vez que ele acredita em uma cultura de direitos que acolha em seu seio a universalidade das garantias e o respeito pelo diferente. A visão complexa de Direitos Humanos assumiria a realidade e a presença de múltiplas vozes, todas com o mesmo direito a se expressar, a demandar e a lutar. Flores chega então ao conceito de “universalismo de chegada ou confluência"  em que se propõe a construir um universalismo onde a convivência interpessoal e intercultural, o encontro com o outro é valorizado e respeitado. Guardando profundas semelhanças com o conceito de “diálogo intercultural" de Boaventura de Sousa Santos, o “universalismo de chegada" é um universalismo de misturas, cruzamentos, que permite ao indivíduo se deslocar pelos diferentes pontos de vista sem pretensão de negar a possibilidade de luta pela dignidade humana a ninguém.
Gabarito: B



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Comentários

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CORRETA a alternativa "B".

Joaquin Herrera Flores defende que o universalismo abstrato dos direitos humanos (universalismo de ponto de partida) exige uma racionalidade jurídica/formal, assim como o universalismo localista, que exige uma racionalidade material/cultural (universalismo de retas paralelas), são produtos de visões reducionistas da realidade e acabam por dogmatizar seus pontos de vista, pois funcionam como um padrão de medidas e de exclusão. Em razão disso, o autor propõe uma prática intercultural (universalismo de chegada, de confluência ou de entrecruzamentos), que exige uma racionalidade de resistência, a partir de uma visão complexa dos direitos, cujo conteúdo advém da incorporação dos diferentes contextos físicos e simbólicos na experiência do mundo (FLORES, Joaquín Herrera. A (re)invenção dos direitos humanos. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2009).


Fonte: http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=22&cad=rja&ved=0CC8QFjABOBQ&url=http%3A%2F%2F200.129.241.80%2Fppgda%2Farquivos%2Fimg-conteudo%2Ffiles%2FROMERO%2C%2520Ellen%2520Cristina%2520Oenning_%2520Os%2520direitos%2520ambientais%2520dos%2520povos%2520ind%25C3%25ADgenas_%25202012_Disserta%25C3%25A7%25C3%25A3o%2520_Mestrado%2520em%2520Direito%2520Agroambiental_%2520Universidade%2520Federal%2520de%2520Mato%2520Grosso_Cuiab%25C3%25A1_%25202012.pdf&ei=oax_UaCiLIj48wTXwIHADw&usg=AFQjCNHitwq4SYQHpsyEOYNHv0Ds5H1mwA&bvm=bv.45645796,d.eWU
Letra B

"O que negamos é considerar o universal como um ponto de partida ou um campo de desencontros. Ao universal há de se chegar – universalismo de chegada ou de confluência – depois (não antes) de um processo conflitivo, discursivo de diálogo ou de confrontação no qual cheguem a romper-se os prejuízos e as linhas paralelas. Falamos do entrecruzamento, e não de uma mera superposição de propostas." (FLORES, Joaquín Herrera. Direitos Humanos, Interculturalidade e Racionalidade de Resistência).
Só uma observação: A citação correta é: ""O que negamos é considerar o universal como um ponto de partida ou um campo de desencontros. Ao universal há de se chegar – universalismo de chegada ou de confluência – depois (não antes) de um processo conflitivo, discursivo de diálogo ou de confrontação no qual cheguem a romper-se os PRECONCEITOS e as linhas paralelas. Falamos do entrecruzamento, e não de uma mera superposição de propostas." (FLORES, Joaquín Herrera. Direitos Humanos, Interculturalidade e Racionalidade de Resistência).

Em trilha semelhante, a abordagem de Joaquín Herrera Flores sobre o assunto sustenta um universalismo de confluência, ou seja, um universalismo de chegada e não de partida:

Nossa visão complexa dos direitos aposta por uma racionalidade de resistência. Uma racionalidade que não nega que é possível chegar a uma síntese universal das diferentes opções relativas aos direitos. E tampouco descarta a virtualidade das lutas pelo reconhecimento das diferenças étnicas ou de gênero. O que negamos é considerar o universal como um ponto de partida ou um campo de desencontros. Ao universal há de se chegar – universalismo de chegada ou de confluência – depois (não antes) de um processo conflitivo, discursivo de diálogo ou de confrontação no qual cheguem a romper-se os prejuízos e as linhas paralelas. Falamos do entrecruzamento, e não de uma mera superposição de propostas. (grifo do autor)[14]



Leia mais: http://jus.com.br/artigos/21365/pela-re-construcao-dos-direitos-humanos-em-busca-da-legitimacao-das-intervencoes-humanitarias#ixzz33llIgK5Z

Se forem percerber, essa questão trata do universalismo x relativismo. A, C, D e E estão no mesmo sentido. A letra B é a única que está diferente.

É sempre bom fazer questão com domínio da matéria, mas quando não dá (até porque ninguém consegue decorar todos os detalhes de todas as matérias) valem essas pequenas táticas.

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