A questão tem como base o texto 01.
Texto 01:
Nos últimos 20 anos, os jornais sofreram
vertiginosa transformação. Há pouco mais de duas
décadas, porém, o modelo convencional de
jornalismo cometeu uma das maiores “barrigas”, com
efeitos trágicos sobre a vida dos personagens
envolvidos. Barriga é jargão entre jornalistas.
Significa erro, falha, informação improcedente, uma
mentira publicada, enfim.
Em março de 1994, os brasileiros
tomaram conhecimento, pelos jornais diários,
revistas, emissoras de rádio e televisão que havia
uma grave denúncia contra professores e
funcionários de uma escola para crianças, no bairro
da Aclimação, zona sul de São Paulo. Eles eram
acusados da prática de abuso sexual contra os
menores. As manchetes, taxativas. Na Escola de
Educação Infantil Base, as crianças seriam vítimas de
abusos em orgias gravadas em fitas que depois eram
exibidas nos aparelhos de videocassete. As
reportagens foram elaboradas a partir das
informações colhidas com fontes autorizadas,
delegados de polícia, investigadores e mães de pelo
menos quatro crianças.
A “escolinha do sexo” virou palco da
vingança e da tragédia. Funcionários foram
torturados por policiais. O local, pichado, depredado.
Os proprietários presos. O inferno chegara após
avisá-los pelos jornais.
A irresponsabilidade originada das
denúncias validadas pela autoridade policial
contaminou jornais e jornalistas. O caso realçou o
“fontismo”, termo que indica a dependência do
jornalista pelas declarações das fontes de
informação, sem que o contraditório seja apurado,
investigado.
Mais tarde, constatou-se que nenhuma
prova fora produzida contra os acusados. Eram
inocentes.
Uma cadeia de erros foi construída. Entre
os grandes jornais paulistas, somente o Diário
Popular, com uma tiragem acima dos 200 mil
exemplares/dia, recusou-se a se contaminar pelo engano. E publicou apenas uma nota, nas páginas
internas da edição da terça-feira, 29 de março
daquele ano. Mas, a parcimônia e o cuidado dos
jornalistas do Diário Popular não foram critérios para
os concorrentes. Todos os outros foram conduzidos
pelo estado emocional das mães que acusavam a
escola de ser palco das orgias com seus filhos e pelas
declarações do delegado responsável pelo inquérito.
Os proprietários, Icushiro Shimada e a
esposa, Maria Aparecida Shimada, ingressaram com
ações cíveis contra os jornais. Editora Abril, Folha de
São Paulo, Rede Globo, SBT, entre outras empresas,
foram sentenciadas a indenizá-los, como ao
motorista Maurício Alvarenga. Icushiro e Maria
Aparecida morreram sem ter recebido as
indenizações. Ele, de infarto no miocárdio em abril
deste ano. Ela, de câncer, em 2007.
A verdade no jornalismo é provisória. E
depende dos processos nos quais informações e
contrainformações bem apuradas se debatem por um
lugar nas páginas impressas, nas telas digitais ou na
edição audiovisual. Desrespeitar tais fundamentos é
arriscar repetir o caso Escola de Base e aprofundar o
grau de descrédito sobre um jornalismo rasteiro,
apressado e descompromissado com os fatos.
Inverter essa equação é desafio para jornais,
jornalistas e sociedade.
(Autoria Professor Mestre Marcel J. Cheida.
Disponível em https://www.puccampinas.edu.br/artigo-o-caso-escola-base-profme-marcel-j-cheida/)