Questões de Concurso Sobre figuras de linguagem em português

Foram encontradas 3.387 questões

Q1990332 Português

Atenção: Para responder à questão, leia o início do conto “Missa do Galo”, de Machado de Assis.  


        Nunca pude entender a conversação que tive com uma senhora, há muitos anos, contava eu dezessete, ela, trinta. Era noite de Natal. Havendo ajustado com um vizinho irmos à missa do galo, preferi não dormir; combinei que eu iria acordá-lo à meia-noite.

        A casa em que eu estava hospedado era a do escrivão Meneses, que fora casado, em primeiras núpcias, com uma de minhas primas. A segunda mulher, Conceição, e a mãe desta acolheram-me bem quando vim de Mangaratiba para o Rio de Janeiro, meses antes, a estudar preparatórios. Vivia tranquilo, naquela casa assobradada da Rua do Senado, com os meus livros, poucas relações, alguns passeios. A família era pequena, o escrivão, a mulher, a sogra e duas escravas. Costumes velhos. Às dez horas da noite toda a gente estava nos quartos; às dez e meia a casa dormia. Nunca tinha ido ao teatro, e mais de uma vez, ouvindo dizer ao Meneses que ia ao teatro, pedi-lhe que me levasse consigo. Nessas ocasiões, a sogra fazia uma careta, e as escravas riam à socapa; ele não respondia, vestia-se, saía e só tornava na manhã seguinte. Mais tarde é que eu soube que o teatro era um eufemismo em ação. Meneses trazia amores com uma senhora, separada do marido, e dormia fora de casa uma vez por semana. Conceição padecera, a princípio, com a existência da comborça*; mas afinal, resignara-se, acostumara-se, e acabou achando que era muito direito.

        Boa Conceição! Chamavam-lhe “a santa”, e fazia jus ao título, tão facilmente suportava os esquecimentos do marido. Em verdade, era um temperamento moderado, sem extremos, nem grandes lágrimas, nem grandes risos. Tudo nela era atenuado e passivo. O próprio rosto era mediano, nem bonito nem feio. Era o que chamamos uma pessoa simpática. Não dizia mal de ninguém, perdoava tudo. Não sabia odiar; pode ser até que não soubesse amar.

        Naquela noite de Natal foi o escrivão ao teatro. Era pelos anos de 1861 ou 1862. Eu já devia estar em Mangaratiba, em férias; mas fiquei até o Natal para ver “a missa do galo na Corte”. A família recolheu-se à hora do costume; eu meti-me na sala da frente, vestido e pronto. Dali passaria ao corredor da entrada e sairia sem acordar ninguém. Tinha três chaves a porta; uma estava com o escrivão, eu levaria outra, a terceira ficava em casa.

        — Mas, Sr. Nogueira, que fará você todo esse tempo? perguntou-me a mãe de Conceição.

        — Leio, D. Inácia.

        Tinha comigo um romance, os Três Mosqueteiros, velha tradução creio do Jornal do Comércio. Sentei-me à mesa que havia no centro da sala, e à luz de um candeeiro de querosene, enquanto a casa dormia, trepei ainda uma vez ao cavalo magro de D'Artagnan e fui-me às aventuras. Os minutos voavam, ao contrário do que costumam fazer, quando são de espera; ouvi bater onze horas, mas quase sem dar por elas, um acaso. Entretanto, um pequeno rumor que ouvi dentro veio acordar-me da leitura.

(Adaptado de: Machado de Assis. Contos: uma antologia. São Paulo: Companhia das Letras, 1988)

*comborça: qualificação humilhante da amante de homem casado 

Nunca tinha ido ao teatro, e mais de uma vez, ouvindo dizer ao Meneses que ia ao teatro, pedi-lhe que me levasse consigo. Nessas ocasiões, a sogra fazia uma careta, e as escravas riam à socapa; ele não respondia, vestia-se, saía e só tomava na manhã seguinte. Mais tarde é que eu soube que o teatro era um eufemismo em ação. Meneses trazia amores com uma senhora, separada do marido, e dormia fora de casa uma vez por semana. (2º parágrafo)

Nesse trecho, o narrador acaba por caracterizar um eufemismo. Tendo em vista essa caracterização, verifica-se outro exemplo de eufemismo na seguinte frase: 

Alternativas
Q1989883 Português

INSTRUÇÃO: Leia o texto II a seguir para responder à questão.


TEXTO II




Disponível em: https://josiasdesouza.blogosfera.uol.com.br/. Acesso em: 12 jun. 2022.

O eufemismo é um recurso de linguagem que consiste em suavizar o conteúdo da fala, por meio do uso de palavras que soem mais agradáveis ao interlocutor.
O eufemismo contido na fala do personagem da charge tem como pretensão
Alternativas
Q1987712 Português

O excerto contextualiza as questão. Leia-o atentamente. 


        Existe uma regra de ouro na Linguística que diz: “só existe língua se houver seres humanos que a falem”. E o velho e bom Aristóteles nos ensina que o ser humano “é um animal político”. Usando essas duas afirmações como termos de um silogismo (mais um presente que ganhamos de Aristóteles), chegamos à conclusão de que “tratar da língua é tratar de um tema político”, já que também é tratar de seres humanos. Por isso, o leitor e a leitora não deverão se espantar com o tom marcadamente politizado de muitas das minhas afirmações. É proposital; aliás, é inevitável. Temos de fazer um grande esforço para não incorrer no erro milenar dos gramáticos tradicionalistas de estudar a língua como uma coisa morta, sem levar em consideração as pessoas vivas que a falam.

        O preconceito linguístico está ligado, em boa medida, à confusão que foi criada, no curso da história, entre língua e gramática normativa. Nossa tarefa mais urgente é desfazer essa confusão. Uma receita de bolo não é bolo, o molde de um vestido não é um vestido, um mapa-múndi não é o mundo... também a gramática não é a língua.

        A língua é um enorme iceberg flutuando no mar do tempo, e a gramática normativa é a tentativa de descrever apenas uma parcela mais visível dela, a chamada norma culta. Essa descrição, é claro, tem seu valor e seus méritos, mas é parcial (no sentido literal e figurado do termo) e não pode ser autoritariamente aplicada a todo o resto da língua – afinal, a ponta do iceberg que emerge representa apenas um quinto do seu volume total. Mas é essa aplicação autoritária, intolerante e repressiva que impera na ideologia geradora do preconceito linguístico.

(BAGNO, Marcos. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. 49. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007, pp. 09-10.)

Para explicar a incompletude da descrição gramatical da língua, o autor utiliza a figura de linguagem denominada: 
Alternativas
Q1986384 Português

Leia o texto para responder à questão.


Queda de renda é alarmante

   O mercado de trabalho brasileiro começa a superar alguns dos principais impactos da pandemia. A taxa de desemprego medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ficou em 11,2% no trimestre móvel de novembro a janeiro, menor do que a registrada dois anos antes, isto é, no período imediatamente anterior ao início da pandemia. Mas a queda expressiva de 9,7% no rendimento real habitual em um ano mostra que problemas novos desafiam aqueles que conseguiram manter uma ocupação remunerada.
   A recuperação do emprego tem mostrado consistência pelo menos desde o segundo semestre do ano passado, e as expectativas para os próximos meses são de continuidade dessa tendência. Não parece improvável que os números do fim do ano sejam melhores do que os atuais. Mas a recuperação tem sido lenta, razão pela qual persistem alguns números absolutos que preocupam. E a melhora ocorre num período em que a inflação subiu acentuadamente e se mantém em níveis muito altos.
   Em meio a dados animadores, como o do aumento expressivo do pessoal ocupado (95,4 milhões de trabalhadores, 8,2 milhões mais do que um ano antes), há alguns que mostram aspectos preocupantes do mercado de trabalho. Embora a taxa de desocupação na mais recente Pnad Contínua (11,2%) seja muito inferior ao recorde do período da pandemia, de 14,9% registrado no trimestre móvel de julho a setembro de 2020, é muito maior do que o melhor resultado de toda a pesquisa do IBGE iniciada em 2012 (6,5% no trimestre de novembro de 2013 a janeiro de 2014).
   Em números absolutos, isso significa que, embora o desemprego venha diminuindo, ainda há 12 milhões de trabalhadores sem ocupação. Esse é um dado que não deixa dúvidas sobre a dimensão do drama do desemprego no País. Mas o número de desocupados é parte de um conjunto maior, o de trabalhadores subutilizados, que formam o contingente também chamado de mão de obra desperdiçada. Entre desocupados, subocupados por insuficiência de horas trabalhadas e trabalhadores que formam a força de trabalho potencial (pessoas que não estão em busca de trabalho, mas estão disponíveis para trabalhar), são 27,8 milhões de pessoas. Como outros indicadores negativos das condições do mercado de trabalho, também este vem diminuindo nos últimos meses, mas, dada a lentidão da redução, mantém-se em níveis historicamente muito altos.

(https://opiniao.estadao.com.br, 20.03.2022. Adaptado)

Assinale a alternativa em que o termo destacado é empregado em sentido figurado.
Alternativas
Q1985336 Português
A metonímia é um tipo de linguagem figurada que possui diferentes modelos; um desses modelos é o emprego de um termo abstrato por um concreto ou vice-versa.
Assinale a opção em que o termo sublinhado exemplifica o emprego de um termo abstrato por um concreto.
Alternativas
Q1984444 Português
O rio de minha terra é um deus estranho.
Ele tem braços, dentes, corpo, coração,
muitas vezes homicida,
foi ele quem levou o meu irmão.

É muito calmo o rio de minha terra.

Suas águas são feitas de argila e de mistérios.
Nas solidões das noites enluaradas
a maldição de Crispim desce
sobre as águas encrespadas.

O rio de minha terra é um deus estranho.

Um dia ele deixou o monótono caminhar de corpo mole
para subir as poucas rampas do seu cais.
Foi conhecendo o movimento da cidade,
a pobreza residente nas taperas marginais.

Pois tão irado e tão potente fez-se o rio
que todo um povo se juntou para enfrentá-lo.
Mas ele prosseguiu indiferente,
carregando no seu dorso bois e gente,
até roçados de arroz e de feijão.

Na sua obstinada e galopante caminhada,
destruiu paredes, casas, barricadas,
deixando no percurso mágoa e dor.

Depois subiu os degraus da igreja santa
e postou-se horas sob os pés do Criador.

E desceu devagarinho, até deitar-se
novamente no seu leito.

Mas toda noite o seu olhar de rio
fica boiando sob as luzes da cidade.

(Adaptado de: MORAES, Herculano. O rio da minha
terra. Disponível em: https://www.escritas.org)
A figura de linguagem predominante no verso "O rio de minha terra é um deus estranho” é a 
Alternativas
Q1983638 Português
Em todas as frases abaixo ocorrem metáforas e, portanto, termos comparados a partir de um motivo.
Assinale a opção em que o motivo da comparação metafórica está indicado de forma incorreta.
Alternativas
Q1983636 Português
As palavras no texto podem apresentar um sentido denotativo ou um sentido conotativo; no discurso parlamentar abaixo há uma série de exemplos de linguagem figurada.
“Senhores deputados: o projeto que nos foi apresentado é uma colcha de retalhos feita a partir de projetos anteriores e, portanto, sem nada que nos leve a aproválo. Um desses retalhos propõe a criação de um fundo para combater a fome, mas não indica como obter o dinheiro para isso; outro retalho mostra uma infinidade de problemas no interior do Brasil, que existem há milênios, mas que estão sendo enfrentados pela administração atual; a verdade é que há muitos problemas, mas as soluções são difíceis...”.
O segmento destacado que exemplifica uma metonímia, é: 
Alternativas
Q1982814 Português

Relacione as figuras de linguagem da coluna 1 com as respectivas frases na coluna 2.


Coluna 1 Figuras de linguagem

1. antítese

2. metáfora

3. metonímia

4. pleonasmo

5. prosopopeia


Coluna 2 Frases

( ) Seu corpo afundou no mar, mas sua alma subiu aos céus.

( ) Diante de argumentos tão consistentes, murchou as orelhas e engoliu as palavras.

( ) As árvores são contraditórias: despem-se justamente quando o inverno se aproxima.

( ) Devolva-me o Euclides da Cunha que você me pediu emprestado e nunca leu.

( ) Resta-me a mim somente duas alternativas: reformar a casa ou vendê-la.


Assinale a alternativa que indica a sequência correta, de cima para baixo.

Alternativas
Q1982466 Português
Atenção: Para responder à questão, baseie-se no texto abaixo.

Minha terra

Saí menino de minha terra. 
Passei trinta anos longe dela. 
De vez em quando me diziam: 
Sua terra está completamente mudada, 
Tem avenidas, arranha-céus... 
É hoje uma bonita cidade! 

Meu coração ficava pequenino. 

Revi afinal o meu Recife. 
Está de fato completamente mudado. 
Tem avenidas, arranha-céus. 
É hoje uma bonita cidade. 

Diabo leve quem pôs bonita a minha terra! 

(BANDEIRA, Manuel. Poesia completa e prosa. 
Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 4. ed., p. 283)
A figura de linguagem atuante no verso “Diabo leve quem pôs bonita a minha terra!” traz ao poema
Alternativas
Q1982453 Português
Atenção: Para responder à questão, baseie-se no texto abaixo.

A nuvem

   − “Fico admirado como é que você, morando nesta cidade, consegue escrever uma semana inteira sem reclamar, sem protestar, sem espinafrar!”
   E meu amigo falou de água, telefone, conta de luz, carne, batata, transporte, custo de vida, buracos na rua etc. etc. etc.
   Meu amigo está, como dizem as pessoas exageradas, grávido de razões. Mas que posso fazer? Até que tenho reclamado muito isto e aquilo. Mas se eu for ficar rezingando todo dia, estou roubado: quem é que vai aguentar me ler? Acho que o leitor gosta de ver suas queixas no jornal, mas em termos.
    Além disso, a verdade não está apenas nos buracos da rua e outras mazelas. Não é verdade que as amendoeiras neste inverno deram um show luxuoso de folhas vermelhas voando no ar? E ficaria demasiado feio eu confessar que há uma jovem gostando de mim? Ah, bem sei que esses encantamentos de moça por um senhor maduro duram pouco. São caprichos de certa fase. Mas que importa? Esse carinho me faz bem; eu o recebo terna e gravemente; sem melancolia, porque sem ilusão. Ele se irá como veio, leve nuvem solta na brisa, que se tinge um instante de púrpura sobre as cinzas do meu crepúsculo.
   E olhem só que tipo estou escrevendo! Tome tenência, velho Braga. Deixe a nuvem, olhe para o chão – e seus tradicionais buracos. 


BRAGA, Rubem. Ai de ti, Copacabana! Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1960, pp. 179-180) 
Há emprego de uma personificação na frase:
Alternativas
Q1982243 Português

Texto para o item.



Eduardo Galeano. O torcedor. In: Futebol ao Sol e à Sombra. 2.ª edição. Tradução de Eric Nepomuceno e Maria do Carmo Brito. L&PM Editores, 2002.

Em relação aos sentidos e aos aspectos linguísticos do texto apresentado, julgue o item.


No trecho “de repente arrebenta a garganta” (linha 14), observa-se o emprego da figura de linguagem hipérbole.  

Alternativas
Ano: 2022 Banca: Quadrix Órgão: PRODAM-AM Prova: Quadrix - 2022 - PRODAM-AM - Assistente |
Q1981704 Português
Assinale a alternativa que apresenta um trecho extraído do texto que contém a figura de linguagem personificação. 
Alternativas
Ano: 2021 Banca: FUMARC Órgão: PC-MG Prova: FUMARC - 2021 - PC-MG - Médico Legista |
Q1980583 Português
Texto 02:

Pfizer é 91% eficaz entre 5 e 11 anos


Dados divulgados ontem pelo grupo farmacêutico Pfizer apontam que doses da vacina desenvolvida pela companhia contra COVID-19 para crianças de 5 a 11 anos são seguras e apresentam eficácia de quase 91% na prevenção de infecções sintomáticas. A divulgação ocorre em meio às análises feitas pelos Estados Unidos para aplicação do imunizante nessa faixa etária. De acordo com a agência de notícias Associated Press, as aplicações no país podem começar no início de novembro, se os órgãos reguladores americanos derem sinal verde. O Departamento de Saúde e Serviços Humanos (FDA, na sigla em inglês) ainda terá que publicar sua revisão, independente dos dados de segurança e eficácia da empresa. Os consultores do FDA vão debater publicamente as evidências da eficácia do imunizante na próxima semana. Nos EUA, a vacina é autorizada para maiores de 12 anos, mas pediatras e familiares aguardam a nova aprovação voltada às crianças mais novas como forma de conter as infecções crescentes da variante Delta do coronavírus.

(Jornal Estado de Minas, 23 out. 2021, p. 8)
A figura de linguagem presente no Texto 02 é: 
Alternativas
Q1980093 Português
Faltando um pedaço
Djavan
O amor é um grande laço Um passo pr'uma armadilha Um lobo correndo em círculo Pra alimentar a matilha
Comparo sua chegada Com a fuga de uma ilha Tanto engorda, quanto mata Feito desgosto de filha De filha [...] 
Disponível em: <https://www.letras.com/djavan/45524/>. Acesso em: 27. ago. 2022.
Há, no texto,
Alternativas
Ano: 2022 Banca: FGV Órgão: TCE-TO Prova: FGV - 2022 - TCE-TO - Analista Técnico - Letras |
Q1979643 Português
A opção abaixo que mostra um paradoxo, é:
Alternativas
Ano: 2022 Banca: FGV Órgão: TCE-TO Prova: FGV - 2022 - TCE-TO - Analista Técnico - Letras |
Q1979638 Português
O registro de um texto é constituído pelo conjunto de elementos expressivos que constroem um tom produtor de uma emoção particular no destinatário. Os principais registros são: o cômico, o satírico, o trágico, o lírico, o épico, o fantástico, o polêmico e o patético.
A opção abaixo que exemplifica o registro satírico, é:
Alternativas
Q1979132 Português

Atenção: Para responder à questão, leia o texto de John Gledson.


        Na década de 1880, Machado de Assis publicou cerca de oitenta contos, numa espantosa explosão de criatividade, que também rendeu seu primeiro grande romance, Memórias póstumas de Brás Cubas (1880).

        Como isso aconteceu − por que aconteceu, e por que nesse momento? Nada é mais difícil de explicar do que a explosão de um gênio criador − e não devemos duvidar que é disso que se trata. Contos podem parecer fáceis, escritos algo apressadamente como uma espécie de subproduto de um trabalho mais sério ou até como sintomas de uma incapacidade passageira de empreender “obras de maior tomo” (palavras de Dom Casmurro), mas nada está mais longe da verdade. Contos não são romances imperfeitos − existem com seus direitos próprios, e quando Machado começou a escrever os seus melhores, o gênero estava conquistando uma nova dignidade.

        O traço mais importante de seus contos é a ironia, com frequência fixada por um estilo que muitas vezes emprega certo registro de linguagem a fim de estabelecer, desde a primeira palavra, que nada ali é para ser levado inteiramente a sério, que aquilo não é a fala direta do autor: “A coisa mais árdua do mundo, depois do ofício de governar, seria dizer a idade exata de Dona Benedita”. Machado podia parodiar qualquer tipo de linguagem, da Bíblia à dos jornais (essa, de fato, era a que satirizava com mais frequência). No começo dos anos 1880, Machado não só estabelecera seu direito a falar do universo, mas também principiara a fazer o retrato da sociedade brasileira sob uma luz inteiramente nova. Os romances bem-educados dos anos 1870, que elevavam a vida social, deram lugar à sátira selvagem de Memórias póstumas de Brás Cubas, que mostrava realidades − adultério, prostituição, escravatura, o tratamento dado aos agregados − com uma nitidez e uma cólera inteiramente impossíveis alguns anos antes.

        Uma coisa é certa: a expansão do material possível de Machado e o distanciamento irônico que ele adota são inseparáveis. Digamos assim: se ele não tivesse encontrado modos dos mais variados (irônicos, sarcásticos, mas sempre semiocultos) de se expressar a respeito de coisas sobre as quais não devia falar, ou às quais só podia se referir de soslaio, suas histórias jamais teriam existido; podemos sentir sua satisfação quando se aproxima de outra questão espinhosa e acaba encontrando novas maneiras de falar sobre coisas demasiado embaraçosas para mencionar diretamente. Na minha opinião, isso ajuda a explicar o êxito de seus contos − Machado caminhava no fio da navalha.

(Adaptado de: GLEDSON, John. Trad. Fernando Py. In: 50 contos de Machado de Assis. São Paulo: Companhia das Letras, edição digital)

Gledson considera que, antes de fazer o retrato da sociedade brasileira sob uma luz inteiramente nova (3º parágrafo), Machado de Assis produziu romances
Alternativas
Q1978919 Português

Atenção: Para responder à questão, leia a crônica “Tatu”, de Carlos Drummond de Andrade.


O luar continua sendo uma graça da vida, mesmo depois que o pé do homem pisou e trocou em miúdos a Lua, mas o tatu pensa de outra maneira. Não que ele seja insensível aos amavios do plenilúnio; é sensível, e muito. Não lhe deixam, porém, curtir em paz a claridade noturna, de que, aliás, necessita para suas expedições de objetivo alimentar. Por que me caçam em noites de lua cheia, quando saio precisamente para caçar? Como prover a minha subsistência, se de dia é aquela competição desvairada entre bichos, como entre homens, e de noite não me dão folga? 

Isso aí, suponho, é matutado pelo tatu, e se não escapa do interior das placas de sua couraça, em termos de português, é porque o tatu ignora sabiamente os idiomas humanos, sem exceção, além de não acreditar em audiência civilizada para seus queixumes. A armadura dos bípedes é ainda mais invulnerável que a dele, e não há sensibilidade para a dor ou a problemática do tatu.

Meu amigo andou pelas encostas do Corcovado, em noite de prata lunal, e conseguiu, por artimanhas só dele sabidas, capturar vivo um tatu distraído. É, distraído. Do contrário não o pegaria. Estava imóvel, estático, fruindo o banho de luz na folhagem, essa outra cor que as cores assumem debaixo da poeira argentina da Lua. Esquecido das formigas, que lhe cumpria pesquisar e atacar, como quem diz, diante de um motivo de prazer: “Daqui a pouco eu vou trabalhar; só um minuto mais, alegria da vida”, quedou-se à mercê de inimigos maiores. Sem pressentir que o mais temível deles andava por perto, em horas impróprias à deambulação de um professor universitário. 

      − Mas que diabo você foi fazer naqueles matos, de madrugada?

      − Nada. Estava sem sono, e gosto de andar a esmo, quando todos roncam. 

Sem sono e sem propósito de agredir o reino animal, pois é de feitio manso, mas o velho instinto cavernal acordou nele, ao sentir qualquer coisa a certa distância, parecida com a forma de um bicho. Achou logo um cipó bem forte, pedindo para ser usado na caça; e jamais tendo feito um laço de caçador, soube improvisá-lo com perícia de muitos milhares de anos (o que a universidade esconde, nas profundas camadas do ser, e só permite que venha aflorar em noite de lua cheia!).

Aproximou-se sutil, laçou de jeito o animal desprevenido. O coitado nem teve tempo de cravar as garras no laçador. Quando agiu, já este, num pulo, desviara o corpo. Outra volta no laço. E outra. Era fácil para o tatu arrebentar o cipó com a força que a natureza depositou em suas extremidades. Mas esse devia ser um tatu meio parvo, e se embaraçou em movimentos frustrados. Ou o sereno narrador mentiu, sei lá. Talvez o tenha comprado numa dessas casas de suplício que há por aí, para negócio de animais. Talvez na rua, a um vendedor de ocasião, quando tudo se vende, desde o mico à alma, se o PM não ronda perto.

Não importa. O caso é que meu amigo tem em sua casa um tatu que não se acomodou ao palmo de terra nos fundos da casa e tratou de abrigar longa escavação que o conduziu a uma pedreira, e lá faz greve de fome. De lá não sai, de lá ninguém o tira. A noite perdeu para ele seu encanto luminoso. A ideia de levá-lo para o zoológico, aventada pela mulher do caçador, não frutificou. Melhor reconduzi-lo a seu hábitat, mas o tatu se revela profundamente contrário a qualquer negociação com o bicho humano, que pensa em apelar para os bombeiros a fim de demolir o metrô tão rapidamente feito, ao contrário do nosso, urbano, e salvar o infeliz. O tatu tem razões de sobra para não confiar no homem e no luar do Corcovado.

Não é fábula. Eu compreendo o tatu. 

(Adaptado de: ANDRADE, Carlos Drummond. Os dias lindos. São Paulo: Companhia das Letras, 2013)

O cronista lança mão da figura de linguagem conhecida como personificação no seguinte trecho:
Alternativas
Q1978159 Português

“Superei um tabu”

O ator Lázaro Ramos, 43, conta como lutou para falar sobre paternidade de forma franca e aberta

Depoimento dado a Amanda Péchy

Quando soube que seria pai, aos 32 anos, fui racional. Dizia estar emocionado, mas, na verdade, a ficha só veio a cair no dia em que João nasceu. Aí, sim, aflorou um turbilhão de sentimentos misturados – medos, inseguranças, incertezas. No meio disso, senti um amor gigantesco por um desconhecido, como nunca antes. Me vi também isolado e perdido no novo papel. Cheguei a me afastar de amigos, uma vez que nossas realidades passaram a seguir cursos tão diferentes. Até com aqueles que eram pais, eu não conseguia conversar em profundidade. Era como uma espécie de tabu. Sou integrante de uma geração que começa a discutir a masculinidade e poderia estar mais maduro quando apareceram em minha vida o João, hoje com 11 anos, e a Maria, de 7. O fato é que essa ainda é uma trilha difícil, sobre a qual pesa um machismo, às vezes nas entrelinhas, que resiste ao tempo. Sensibilidade e cuidados, em pleno século XXI e com tantos avanços, parecem ainda não ser temas do universo masculino.

Acabou que minha profissão foi decisiva para trazer o assunto à tona, de forma franca e direta. Queria há tempos tratar do tema e aconteceu com o filme Papai É Pop, do do Caíto Ortiz, que recém estreou nos cinemas. Nunca havia lido o livro no qual se baseia o roteiro, obra que levanta uma ampla reflexão para nós, homens, sobre paternidade. Tinha um temor de repetir erros que observava em meu próprio pai, como não abraçar, beijar, não deixar os sentimentos à tona. Queria ser ativo, dar banho, trocar fralda, estar na área, mesmo que significasse uma reviravolta. Na geração dos meus pais, como diz o filme, mãe era peito e o progenitor, bolso. Aprendi que não precisa ser desse jeito, nem deve, e fui conquistando meu espaço, me entendendo nessa rotina. Uso a palavra conquistar porque, tanto eu como minha mulher (a atriz Taís Araújo), viemos de famílias de mulheres fortes. E nesse cenário fui demarcando o meu território.

Ter filhos muda a vida de qualquer casal, e conosco não foi diferente. Olhando sob a perspectiva de hoje, a criação deles nos aproximou porque fomos estabelecendo uma saudável divisão de funções e, por tabela, descobrimos algo essencial: nossos conceitos e valores nesse campo eram semelhantes. Foi uma revelação, já que, antes deles, não tínhamos ideia de como seríamos como pais. Selamos, logo de saída, acordos primordiais sobre o dia a dia – saúde, alimentação, educação –, sem discordâncias fundamentais no que importa. Claro que há momentos de tensão, mas temos conseguido contorná-los com boa dose de diálogo. Aprendo também com gente de quem, graças à paternidade, me aproximei nestes anos. Tenho vínculos com pais de amigos dos dois, mas a conversa se prolonga mais com as mães, e eu adoro isso.

Engraçado observar que a experiência que tive com cada um foi tão distinta. Com o João, assimilei tudo em tempo real, me transformando por força das circunstâncias. Quando Taís engravidou outra vez, pensei: “Ótimo, já sou perito”. Aí Maria nasceu, e fiquei perdido de novo. Ser pai de menina era um admirável mundo que se abria. Tinha medo de cometer um erro diante de um ser que, além de pequenino, era de outro sexo, um terreno ainda mais desconhecido. Na pandemia, com todos sob o mesmo teto, me vi tendo de lidar com meus demônios: impaciência e até falta de repertório para conversar com eles estavam no rol. Mas a convivência intensiva também foi boa, produtiva, e me fez melhor. Em Papai É Pop, identifico-me com meu personagem Tom porque vejo nele um genuíno desejo de ser bom pai e, ao mesmo tempo, aquele medo de não reunir qualidades suficientes. Ele consegue ser um espelho para vários homens. Assim como o personagem, hoje levo a paternidade com leveza, e falar sobre ela deixou de ser um tabu.

Fonte: Revista Veja, ed. 2805, ano 55, n. 35, p. 78, 07 set. 2022.

Há linguagem figurada, EXCETO em:
Alternativas
Respostas
1021: B
1022: D
1023: A
1024: D
1025: A
1026: A
1027: D
1028: C
1029: B
1030: C
1031: E
1032: C
1033: E
1034: D
1035: E
1036: B
1037: D
1038: D
1039: D
1040: D