Questões de Concurso
Sobre significação contextual de palavras e expressões. sinônimos e antônimos. em português
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Mantém-se a correção gramatical da frase acima substituindo-se o elemento sublinhado por:
Texto para responder a questão.
Brasil cumpre apenas 2 de 6 metas mundiais para a educação, diz Unesco
Só um terço dos países atingiram objetivos para período 2000 a 2015.
Inep contesta números e diz que país avançou no acesso à educação.
Um relatório divulgado nesta quarta‐feira (8) pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), mostra que somente um terço dos países alcançou todas as seis metas de educação estabelecidas há 15 anos para o período de 2000 a 2015. Segundo o relatório, o Brasil chegou a duas dessas metas: universalizou o acesso à educação primária (1º ao 5º ano do ensino fundamental) e atingiu a meta da igualdade de gênero, levando meninos e meninas às aulas em grande proporção.
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), autarquia do Ministério da Educação, contesta os números e vê grandes avanços no acesso à educação na pré‐escola, no ensino profissionalizante e no combate ao analfabetismo.
A educação no mundo ainda não é tratada da maneira como deveria, segundo a Unesco. A organização afirma que apesar de neste período 34 milhões de crianças terem tido acesso à educação, ainda há 58 milhões de crianças fora da escola no mundo e cerca de 100 milhões de crianças que não completarão a educação primária.
A desigualdade na educação aumentou, com os mais pobres e desfavorecidos carregando o maior fardo. As crianças mais pobres do mundo têm chances quatro vezes maiores de não frequentar a escola quando comparadas às crianças mais ricas do mundo, e cinco vezes maiores de não completar a educação primária.
Uma nova reunião mundial será realizada em maio na Coreia do Sul para traçar objetivos para o período de 2015 a 2030.
(Disponível: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2015/04/brasil‐cumpre‐apenas‐2‐de‐6‐metas‐mundiais‐para‐educacao‐diz‐unesco.html. Acesso em: 08/04/2015. Adaptado.)
O texto abaixo servirá de base para a questão.
Futuro exige homem multidisciplinar para driblar automatismo do algoritmo
Jacqueline Lafloufa
É muito raro que algoritmos, sequências de códigos que executam uma função automaticamente, saibam lidar com o que foge ao padrão ou é inesperado. "Existe a chance de que o viés dos algoritmos nos leve a tratar as pessoas de forma injusta", destaca o relatório de tendências 2019 da Fjord, braço da consultoria Accenture. O alerta já tinha sido dado por Cathy O'Neil em 2016, quando ela defendeu, em seu livro "Armas de Destruição Matemática", que opiniões e estereótipos costumam estar embutidos nos algoritmos. Um caso famoso de algoritmo estereotipado foi o reconhecimento facial errôneo do Google Photos, descoberto por Jacky Alciné em 2015, que reparou que seus amigos negros estavam sendo identificados como "gorilas" em suas fotos. O Google se desculpou alegando que a tecnologia de etiquetamento de imagens ainda não era perfeita, mas até o ano passado o problema continuava não resolvido, e muitas faces negras ainda não são identificadas na plataforma.
Será que, se houvesse desenvolvedores ou bases de dados mais diversas, um erro tão terrível como esse teria acontecido? Talvez não. Gustavo Abreu, designer de conteúdo e líder de inclusão e diversidade da Fjord, afirma que uma solução possível é trazer o diferente para dentro dos times. "Não tem como pedir a um homem branco e hétero ser menos enviesado. Precisamos pensar, ao recrutar ou formar uma equipe, qual é o problema e quem vamos colocar para resolvê-lo", analisa. Segundo Abreu, essa inclusão deve ser além da demográfica (que considera gênero, faixa etária ou classe socioeconômica), abrangendo também a diversidade cognitiva (jeitos de pensar) e experiencial (experiências anteriores).
Diante da pressão pública por mais diversidade nas corporações, grandes empresas como Amazon, Google e Facebook apostaram na indicação de executivos ou equipes dedicadas a garantir a inclusão e a diversidade. "É lidando com a diversidade, com a pluralidade cultural, rompendo a matriz colonialista, eurocêntrica, branca e ocidental dos currículos, que vamos solucionar questões que não são parte do repertório ocidentalizado das disciplinas", opina Carlota Boto, professora de Filosofia da Educação na USP (Universidade de São Paulo), que vê o surgimento de um movimento contrário à divisão disciplinar do século 18. "Para ser capaz de responder problemas contemporâneos, vivemos um movimento de entrelaçamento das diferentes áreas", explica, apontando que a capacidade interdisciplinar passará a ser cada vez mais desejada pelo mercado de trabalho.
Mais do que colocar um app na rua, desenvolvedores estão sendo pressionados a pensar nos impactos que suas inovações vão trazer. Em apresentação no festival SXSW, Jesus Ramos, especialista em aprendizado de máquina, comentou sobre o dilema que enfrentou ao publicar o app Revisa Mi Grieta, capaz de identificar se uma trinca em um edifício apontava danos na estrutura. "Um falso positivo levaria uma família a buscar assistência sem necessidade, enquanto um falso negativo poderia manter pessoas em um edifício condenado", resumiu. A experiência fez com que ele detectasse a necessidade de incluir, nos processos, profissionais de outras áreas ou disciplinas. "Nosso time hoje conta não apenas com matemáticos e programadores mas também engenheiros e filósofos", ressaltou.
As inovações futuras também precisarão de perfis diversos trabalhando juntos em prol de uma solução, como é o caso da impressão 4D, que cria materiais capazes de se transformar em outros formatos. Os grupos de estudo da área costumam reunir profissionais de diversas áreas, conforme o material que tentam transformar. "Mesclamos engenharia de materiais, ciência da computação, design e práticas artísticas. Os profissionais que atuam conosco são multifacetados, com conhecimento da sua área de especialidade , mas também sabem se comunicar no 'idioma' de outros campos", detalhou Lining Yao, da Universidade Carnegie Mellon, uma das pioneiras da impressão 4D no mundo.
No fim das contas, não é como se todos os profissionais fossem precisar se tornar programadores ou engenheiros de materiais, mas será preciso estar aberto a interagir e compreender as recomendações dos profissionais de diferentes especialidades, como a moda e a gastronomia. "A parte mais difícil é conseguir um bom equilíbrio entre a profundidade e a amplitude desse conhecimento", complementa Yao. Reunir gente tão diferente em uma mesma sala em busca de soluções é uma tarefa que precisa de habilidade na gestão das diversidades. "Haverá cada vez menos espaço para individualismos, porque as competências técnica s deixam de ser predominantes, dando lugar à sabedoria dos grupos multidisciplinares com colaboração e apoio mútuo", analisa Glaucy Bocci, diretora de talentos da consultoria Willis Towers Watson.
Disponível em: https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2019/08/20/futuro-multidisciplinar-exige-tolerancia-no-mercado-de-trabalho.htm. Acesso em: 27 jan. 2020. [Adaptado]
Para responder à questão, considere o excerto transcrito abaixo.
Será que se houvesse desenvolvedores ou bases de dados mais diversas, um erro tão terrível como esse teria acontecido? Talvez não. Gustavo Abreu, designer de conteúdo e líder de inclusão e diversidade da Fjord, afirma que uma solução possível é trazer o diferente para dentro dos times. "Não tem como pedir a um homem, branco e hétero[1] ser menos enviesado[2]. Precisamos pensar, ao recrutar ou formar uma equipe, qual é o problema e quem vamos colocar para resolvê-lo", analisa. Segundo Abreu, essa inclusão deve ser além da demográfica (que considera gênero, faixa etária ou classe socioeconômica), abrangendo també m a diversidade cognitiva (jeitos de pensar) e experiencial (experiências anteriores).
O elemento linguístico “enviesado” pode ser substituído, sem alteração de sentido, por
Leia o texto para responder à questão.
É prioritário estimular a leitura desde a infância, pois ao perceber o encanto do universo do livro e descobrir todas as portas que ele abre, o indivíduo dificilmente deixará de ser um leitor ao longo de toda a sua vida.
Portanto, para conquistarmos a meta tão almejada de que o Brasil seja um país de leitores, não há outro caminho senão despertar nas crianças e adolescentes o gosto pela leitura. Significativa contribuição para isso foi o fato de o livro do ano de ficção do Prêmio Jabuti 2014, o mais importante do mercado editorial brasileiro, ter sido Breve História de um Pequeno Amor, de Marina Colasanti. Tal conquista para uma obra infantojuvenil chama a atenção de todos para esse segmento da literatura.
Ao fazermos uma reflexão sobre a relevância da leitura para o público infantojuvenil, é pertinente lembrarmos o 25º aniversário da Convenção sobre os Direitos da Criança, celebrado dia 20 de novembro, em Nova York, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Na ocasião, o comitê responsável pelo monitoramento desse programa ressaltou a importância da participação ativa das crianças nas discussões que afetem suas vidas.
(Folha de S.Paulo, 16.03.2015. Adaptado)
Leia o texto para responder à questão.
É prioritário estimular a leitura desde a infância, pois ao perceber o encanto do universo do livro e descobrir todas as portas que ele abre, o indivíduo dificilmente deixará de ser um leitor ao longo de toda a sua vida.
Portanto, para conquistarmos a meta tão almejada de que o Brasil seja um país de leitores, não há outro caminho senão despertar nas crianças e adolescentes o gosto pela leitura. Significativa contribuição para isso foi o fato de o livro do ano de ficção do Prêmio Jabuti 2014, o mais importante do mercado editorial brasileiro, ter sido Breve História de um Pequeno Amor, de Marina Colasanti. Tal conquista para uma obra infantojuvenil chama a atenção de todos para esse segmento da literatura.
Ao fazermos uma reflexão sobre a relevância da leitura para o público infantojuvenil, é pertinente lembrarmos o 25º aniversário da Convenção sobre os Direitos da Criança, celebrado dia 20 de novembro, em Nova York, pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Na ocasião, o comitê responsável pelo monitoramento desse programa ressaltou a importância da participação ativa das crianças nas discussões que afetem suas vidas.
(Folha de S.Paulo, 16.03.2015. Adaptado)
Há luz no fim do túnel dos jornais impressos?
Castigados pela conjunção de duas crises – uma primeira de ordem conjuntural, ditada pelo cenário político e econômico, e uma segunda, estrutural, causada pela revolução digital – os próprios diários brasileiros se perguntam sobre o desfecho do imbróglio que tem reduzido suas receitas e, consequentemente, encolhido as publicações, provocando demissões em massa e despertando dúvidas crescentes sobre sua capacidade de entregar notícias, análises e opiniões relevantes.
Durante o X Congresso da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), a sobrevivência dos jornais norteou um debate que reuniu o trio formado por Ascânio Seleme, diretor de redação de O Globo, Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do grupo Estado, e Vinícius Mota, secretário de redação da Folha de S.Paulo.
Coube a Mota fornecer indicadores econômicos sombrios com impacto direto sobre os principais anunciantes dos jornais: o mercado imobiliário, o de automóveis e o de móveis e eletrodomésticos.
Para além dos riscos econômicos, Gandour abordou o que considera uma preocupante rejeição por parte do público, em escala global, ao incômodo gerado pela notícia, que chamou de “aquilo que alguém não quer que seja publicado”. Segundo ele, tal fenômeno, em que a sociedade almeja o bem-estar rejeitando o contraditório, apresenta riscos para o gênero jornalístico como um todo, e não apenas para os jornais impressos.
A fragmentação também foi indicada como um desafio importante, tanto no lado da demanda – o leitor – quanto no lado da oferta – o conjunto das mídias. À medida que o público mais jovem passa a ler notícias distribuídas em redes sociais, a notícia também se fragmenta, gerando um risco adicional, que o representante do Estadão chamou de “perda do discernimento do gênero jornalístico”. Nessa perda, o público já não saberia distinguir um texto informativo de um opinativo. A mitigação desse risco específico passaria pela sinalização clara pelos sites noticiosos do que seja uma notícia ou um editorial.
Já a fragmentação da oferta repercute dramaticamente no mercado publicitário, onde os jornais, que já disputavam verbas com a TV, rádio e revistas, enfrentam os anunciantes digitais, como buscadores e redes sociais. Diante desse panorama desafiador, Gandour acredita que o futuro dos jornais depende da continuidade do método jornalístico, que rege um ofício pautado pela independência editorial e a investigação exaustiva. “A gente vê na internet coisas que não contemplam o método jornalístico, como falar de uma pessoa sem ouvi-la, reproduzir rumores sem checagem”, disse. “O jornalismo é a disciplina da verificação.”
(Angela Pimenta. http://observatoriodaimprensa.com.br. Adaptado)
O melhor amigo
Ana, a mãe de Pedro, estava na sala costurando. O menino abriu a porta da rua, meio assustado, arriscou um passo para dentro e mediu cautelosamente a distância. Como a mãe não se voltasse para vê-lo, ele deu uma corridinha em direção de seu quarto.
– Meu filho? – gritou ela
. – O que é? – respondeu Pedro com o ar mais natural que lhe foi possível.
– O que você está carregando aí?
Pedro ficou pensando como a mãe poderia ter visto alguma coisa, se nem levantara a cabeça. Sentindo-se perdido, tentou ainda ganhar tempo.
– Eu? Nada...
– Está sim. Você entrou carregando uma coisa.
Pronto: ele estava descoberto. Não adiantava negar. O jeito era procurar comovê-la. Então veio caminhando desconsolado até a sala, mostrou à mãe o que estava carregando.
– Olha aí, mamãe: é um filhote...
Os olhos de Pedro aguardavam a decisão.
– Um filhote? Onde é que você arranjou isso?
– Achei na rua. Tão bonitinho, não é mãe?
– Trate de levar embora esse cachorro agora mesmo!
– Ah, mãe... já fazendo cara de choro.
– Você tem dez minutos para levar esse bicho embora. Já disse que não quero animais aqui em casa. Tanta coisa para cuidar!
Pedro voltou para o quarto, emburrado.
– Todo mundo tem cachorro, só eu que não tenho.
– Dez minutos! – repetiu a mãe.
Ele conhecia bem a mãe, sabia que não haveria apelo. Então saiu com o cachorro e pouco tempo depois voltou.
– Pronto, mãe.
E exibia-lhe uma nota de 20. Havia vendido seu melhor amigo por dinheiro.
– Eu deveria ter pedido 50!
(Fernando Sabino. http://www. phaleixo.blogspot.com. br – Acesso em 01.07.2015. Adaptado)
Línguas Que Não Sabemos Que Sabíamos* - Mia Couto
Num conto que nunca cheguei a publicar acontece o seguinte: uma mulher, em fase terminal de doença, pede ao marido que lhe conte uma história para apaziguar as insuportáveis dores.
Mal ele inicia a narração, ela o faz parar: — Não, assim não. Eu quero que me fale numa língua desconhecida.
— Desconhecida? — pergunta ele.
— Uma língua que não exista. Que eu preciso tanto de não compreender nada!
O marido se interroga: como se pode saber falar
uma língua que não existe? Começa por balbuciar umas
palavras estranhas e sente-se ridículo como se a si mesmo
desse provas da incapacidade de ser humano.
Aos poucos, porém, vai ganhando mais à vontade nesse idioma sem regra. E ele já não sabe se fala, se canta, se reza. Quando se detém, repara que a mulher está adormecida, e mora em seu rosto o mais tranquilo sorriso. Mais tarde, ela lhe confessa: aqueles murmúrios lhe trouxeram lembranças de antes de ter memória. E lhe deram o conforto desse mesmo sono que nos liga ao que havia antes de estarmos vivos.
Na nossa infância, todos nós experimentamos este primeiro idioma, o idioma do caos, todos nós usufruímos do momento divino em que a nossa vida podia ser todas as vidas e o mundo ainda esperava por um destino. James Joyce chamava de “caosmologia” a esta relação com o mundo informe e caótico. Essa relação, meus amigos, é aquilo que faz mover a escrita, qualquer que seja o continente, qualquer que seja a nação, a língua ou o gênero literário.
Eu creio que todos nós, poetas e ficcionistas, não deixamos nunca de perseguir esse caos seminal. Todos nós aspiramos regressar a essa condição em que estivemos tão fora de um idioma que todas as línguas eram nossas. Dito de outro modo, todos nós somos impossíveis tradutores de sonhos. Na verdade, os sonhos falam em nós o que nenhuma palavra sabe dizer.
O nosso fito, como produtores de sonhos, é aceder a essa outra língua que não é falável, essa língua cega em que todas as coisas podem ter todos os nomes. O que a mulher doente pedia é aquilo que todos nós queremos: anular o tempo e fazer adormecer a morte.
Talvez se esperasse que, vindo de África, eu usasse desta tribuna para lamentar, acusar os outros e isentar de culpas aqueles que me são próximos. Mas eu prefiro falar de algo em que todos somos ao mesmo tempo vítimas e culpados. Prefiro falar do modo como o mesmo processo que empobreceu o meu continente está, afinal, castrando a nossa condição comum e universal de criadores de histórias.
Num congresso que celebra o valor da palavra, o tema da minha intervenção é o modo como critérios hoje dominantes desvalorizam palavra e pensamento em nome do lucro fácil imediato. Falo de razões comerciais que se fecham a outras culturas, outras línguas, outras lógicas. A palavra de hoje é cada vez mais aquela que se despiu da dimensão poética e que não carrega nenhuma utopia sobre um mundo diferente. O que fez a espécie humana sobreviver não foi apenas a inteligência, mas a nossa capacidade de produzir diversidade. Essa diversidade está sendo negada nos dias de hoje por um sistema que escolhe apenas por razões de lucro e facilidade de sucesso.
Os africanos voltaram a ser os “outros”, os que
vendem pouco e os que compram ainda menos. Os
autores africanos que não escrevem em inglês (e em
especial os que escrevem em língua portuguesa) moram na
periferia da periferia, lá onde a palavra tem de lutar para
não ser silêncio.
Caros amigos:
As línguas servem para comunicar. Mas elas não apenas “servem”. Elas transcendem essa dimensão funcional. Às vezes, as línguas fazem-nos ser. Outras, como no caso do homem que adormecia em história a sua mulher, elas fazem-nos deixar de ser. Nascemos e morremos naquilo que falamos, estamos condenados à linguagem mesmo depois de perdermos o corpo. Mesmo os que nunca nasceram, mesmo esses existem em nós como desejo de palavra e como saudade de um silêncio. Vivemos dominados por uma percepção redutora e utilitária que converte os idiomas num assunto técnico da competência dos linguistas. Contudo, as línguas que sabemos — e mesmo as que não sabemos que sabíamos — são múltiplas e nem sempre capturáveis pela lógica racionalista que domina o nosso consciente. Existe algo que escapa à norma e aos códigos. Essa dimensão esquiva é aquela que a mim, enquanto escritor, mais me fascina. O que me move é a vocação divina da palavra, que não apenas nomeia mas que inventa e produz encantamento. Estamos todos amarrados aos códigos coletivos com que comunicamos na vida quotidiana. Mas quem escreve quer dizer coisas que estão para além da vida quotidiana. Nunca o nosso mundo teve ao seu dispor tanta comunicação. E nunca foi tão dramática a nossa solidão. Nunca houve tanta estrada. E nunca nos visitamos tão pouco.
Sou biólogo e viajo muito pela savana do meu país. Nessas regiões encontro gente que não sabe ler livros. Mas que sabe ler o seu mundo. Nesse universo de outros saberes, sou eu o analfabeto. sei ler sinais da terra, das árvores e dos bichos. Não sei ler nuvens, nem o prenúncio das chuvas. Não sei falar com os mortos, perdi contacto com os antepassados que nos concedem o sentido da eternidade. Nessas visitas que faço à savana, vou aprendendo sensibilidades que me ajudam a sair de mim e a afastar-me das minhas certezas. Nesse território, eu não tenho apenas sonhos. Eu sou sonhável.
Moçambique é um extenso país, tão extenso quanto recente. Existem mais de 25 línguas distintas. Desde o ano da Independência, alcançada em 1975, o português é a língua oficial. Há trinta anos apenas, uma minoria absoluta falava essa língua ironicamente tomada de empréstimo do colonizador para negar o passado colonial. Há trinta anos, quase nenhum moçambicano tinha o português como língua materna. Agora, mais de 12% dos moçambicanos têm o português como seu primeiro idioma. E a grande maioria entende e fala português inculcando na norma portuguesa as marcas das culturas de raiz africana. Esta tendência de mudança coloca em confronto mundos que não são apenas linguisticamente distintos. Os idiomas existem enquanto parte de universos culturais mais vastos. Há quem lute para manter vivos idiomas que estão em risco de extinção. Essa luta é absolutamente meritória e recorda a nossa batalha como biólogos para salvar do desaparecimento espécies de animais e plantas. Mas as línguas salvam-se se a cultura em que se inserem se mantiver dinâmica. Do mesmo modo, as espécies biológicas apenas se salvam se os seus hábitat e os processos naturais forem preservados.
As culturas sobrevivem enquanto se mantiverem produtivas, enquanto forem sujeito de mudança e elas próprias dialogarem e se mestiçarem com outras culturas. As línguas e as culturas fazem como as criaturas: trocam genes e inventam simbioses como resposta aos desafios do tempo e do ambiente. Em Moçambique vivemos um período em que encontros e desencontros se estão estreando num caldeirão de efervescências e paradoxos. Nem sempre as palavras servem de ponte na tradução desses mundos diversos. Por exemplo, conceitos que nos parecem universais como Natureza, Cultura e Sociedade são de difícil correspondência. Muitas vezes não há palavras nas línguas locais para exprimir esses conceitos. Outras vezes é o inverso: não existem nas línguas europeias expressões que traduzam valores e categorias das culturas moçambicanas. (...)
* Intervenção na Conferência Internacional de Literatura WALTIC, Estocolmo, junho de 2008.
I- “(...) eu usasse desta tribuna para lamentar, acusar os outros e isentar de culpas aqueles que me são próximos.”
II- “(...) que se fecham a outras culturas, outras línguas, outras lógicas.”
III- “Os africanos voltaram a ser os “outros”, ...”
Os pronomes destacados têm a correspondência
semântica melhor transcrita em:
Línguas Que Não Sabemos Que Sabíamos* - Mia Couto
Num conto que nunca cheguei a publicar acontece o seguinte: uma mulher, em fase terminal de doença, pede ao marido que lhe conte uma história para apaziguar as insuportáveis dores.
Mal ele inicia a narração, ela o faz parar: — Não, assim não. Eu quero que me fale numa língua desconhecida.
— Desconhecida? — pergunta ele.
— Uma língua que não exista. Que eu preciso tanto de não compreender nada!
O marido se interroga: como se pode saber falar
uma língua que não existe? Começa por balbuciar umas
palavras estranhas e sente-se ridículo como se a si mesmo
desse provas da incapacidade de ser humano.
Aos poucos, porém, vai ganhando mais à vontade nesse idioma sem regra. E ele já não sabe se fala, se canta, se reza. Quando se detém, repara que a mulher está adormecida, e mora em seu rosto o mais tranquilo sorriso. Mais tarde, ela lhe confessa: aqueles murmúrios lhe trouxeram lembranças de antes de ter memória. E lhe deram o conforto desse mesmo sono que nos liga ao que havia antes de estarmos vivos.
Na nossa infância, todos nós experimentamos este primeiro idioma, o idioma do caos, todos nós usufruímos do momento divino em que a nossa vida podia ser todas as vidas e o mundo ainda esperava por um destino. James Joyce chamava de “caosmologia” a esta relação com o mundo informe e caótico. Essa relação, meus amigos, é aquilo que faz mover a escrita, qualquer que seja o continente, qualquer que seja a nação, a língua ou o gênero literário.
Eu creio que todos nós, poetas e ficcionistas, não deixamos nunca de perseguir esse caos seminal. Todos nós aspiramos regressar a essa condição em que estivemos tão fora de um idioma que todas as línguas eram nossas. Dito de outro modo, todos nós somos impossíveis tradutores de sonhos. Na verdade, os sonhos falam em nós o que nenhuma palavra sabe dizer.
O nosso fito, como produtores de sonhos, é aceder a essa outra língua que não é falável, essa língua cega em que todas as coisas podem ter todos os nomes. O que a mulher doente pedia é aquilo que todos nós queremos: anular o tempo e fazer adormecer a morte.
Talvez se esperasse que, vindo de África, eu usasse desta tribuna para lamentar, acusar os outros e isentar de culpas aqueles que me são próximos. Mas eu prefiro falar de algo em que todos somos ao mesmo tempo vítimas e culpados. Prefiro falar do modo como o mesmo processo que empobreceu o meu continente está, afinal, castrando a nossa condição comum e universal de criadores de histórias.
Num congresso que celebra o valor da palavra, o tema da minha intervenção é o modo como critérios hoje dominantes desvalorizam palavra e pensamento em nome do lucro fácil imediato. Falo de razões comerciais que se fecham a outras culturas, outras línguas, outras lógicas. A palavra de hoje é cada vez mais aquela que se despiu da dimensão poética e que não carrega nenhuma utopia sobre um mundo diferente. O que fez a espécie humana sobreviver não foi apenas a inteligência, mas a nossa capacidade de produzir diversidade. Essa diversidade está sendo negada nos dias de hoje por um sistema que escolhe apenas por razões de lucro e facilidade de sucesso.
Os africanos voltaram a ser os “outros”, os que
vendem pouco e os que compram ainda menos. Os
autores africanos que não escrevem em inglês (e em
especial os que escrevem em língua portuguesa) moram na
periferia da periferia, lá onde a palavra tem de lutar para
não ser silêncio.
Caros amigos:
As línguas servem para comunicar. Mas elas não apenas “servem”. Elas transcendem essa dimensão funcional. Às vezes, as línguas fazem-nos ser. Outras, como no caso do homem que adormecia em história a sua mulher, elas fazem-nos deixar de ser. Nascemos e morremos naquilo que falamos, estamos condenados à linguagem mesmo depois de perdermos o corpo. Mesmo os que nunca nasceram, mesmo esses existem em nós como desejo de palavra e como saudade de um silêncio. Vivemos dominados por uma percepção redutora e utilitária que converte os idiomas num assunto técnico da competência dos linguistas. Contudo, as línguas que sabemos — e mesmo as que não sabemos que sabíamos — são múltiplas e nem sempre capturáveis pela lógica racionalista que domina o nosso consciente. Existe algo que escapa à norma e aos códigos. Essa dimensão esquiva é aquela que a mim, enquanto escritor, mais me fascina. O que me move é a vocação divina da palavra, que não apenas nomeia mas que inventa e produz encantamento. Estamos todos amarrados aos códigos coletivos com que comunicamos na vida quotidiana. Mas quem escreve quer dizer coisas que estão para além da vida quotidiana. Nunca o nosso mundo teve ao seu dispor tanta comunicação. E nunca foi tão dramática a nossa solidão. Nunca houve tanta estrada. E nunca nos visitamos tão pouco.
Sou biólogo e viajo muito pela savana do meu país. Nessas regiões encontro gente que não sabe ler livros. Mas que sabe ler o seu mundo. Nesse universo de outros saberes, sou eu o analfabeto. sei ler sinais da terra, das árvores e dos bichos. Não sei ler nuvens, nem o prenúncio das chuvas. Não sei falar com os mortos, perdi contacto com os antepassados que nos concedem o sentido da eternidade. Nessas visitas que faço à savana, vou aprendendo sensibilidades que me ajudam a sair de mim e a afastar-me das minhas certezas. Nesse território, eu não tenho apenas sonhos. Eu sou sonhável.
Moçambique é um extenso país, tão extenso quanto recente. Existem mais de 25 línguas distintas. Desde o ano da Independência, alcançada em 1975, o português é a língua oficial. Há trinta anos apenas, uma minoria absoluta falava essa língua ironicamente tomada de empréstimo do colonizador para negar o passado colonial. Há trinta anos, quase nenhum moçambicano tinha o português como língua materna. Agora, mais de 12% dos moçambicanos têm o português como seu primeiro idioma. E a grande maioria entende e fala português inculcando na norma portuguesa as marcas das culturas de raiz africana. Esta tendência de mudança coloca em confronto mundos que não são apenas linguisticamente distintos. Os idiomas existem enquanto parte de universos culturais mais vastos. Há quem lute para manter vivos idiomas que estão em risco de extinção. Essa luta é absolutamente meritória e recorda a nossa batalha como biólogos para salvar do desaparecimento espécies de animais e plantas. Mas as línguas salvam-se se a cultura em que se inserem se mantiver dinâmica. Do mesmo modo, as espécies biológicas apenas se salvam se os seus hábitat e os processos naturais forem preservados.
As culturas sobrevivem enquanto se mantiverem produtivas, enquanto forem sujeito de mudança e elas próprias dialogarem e se mestiçarem com outras culturas. As línguas e as culturas fazem como as criaturas: trocam genes e inventam simbioses como resposta aos desafios do tempo e do ambiente. Em Moçambique vivemos um período em que encontros e desencontros se estão estreando num caldeirão de efervescências e paradoxos. Nem sempre as palavras servem de ponte na tradução desses mundos diversos. Por exemplo, conceitos que nos parecem universais como Natureza, Cultura e Sociedade são de difícil correspondência. Muitas vezes não há palavras nas línguas locais para exprimir esses conceitos. Outras vezes é o inverso: não existem nas línguas europeias expressões que traduzam valores e categorias das culturas moçambicanas. (...)
* Intervenção na Conferência Internacional de Literatura WALTIC, Estocolmo, junho de 2008.
Leia o texto, para responder à questão.
Clareiras
Se um autor faz você voltar atrás na leitura, seja de um período ou de uma simples frase, não o julgue profundo demais, não fique complexado: o inferior é ele.
A atual crise de expressão, que tanto vem alarmando a velha-guarda que morre mas não se entrega, não deve ser propriamente de expressão, mas de pensamento. Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Em meio à intrincada selva selvagem de nossa literatura encontram-se às vezes, no entanto, repousantes clareiras. E clareira pertence à mesma família etimológica de clareza… Que o leitor me desculpe umas considerações tão óbvias. É que eu desejava agradecer, o quanto antes, o alerta repouso que me proporcionaram três livros que li na última semana.
Porque, ao ler alguém que consegue expressar-se com toda a limpidez, nem sentimos que estamos lendo um livro: é como se o estivéssemos pensando.
E, como também estive a folhear o velho Pascal, encontrei providencialmente em meu apoio estas suas palavras, à pág. 23 dos Pensamentos:
“Quando deparamos com o estilo natural, ficamos pasmados e encantados, como se esperássemos ver um autor e encontrássemos um homem”.
(Mario Quintana, A vaca e o hipogrifo. Adaptado)
Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Assinale a alternativa em que o termo “como” está empregado com o mesmo sentido que tem nessa passagem.
Leia o texto, para responder à questão.
Clareiras
Se um autor faz você voltar atrás na leitura, seja de um período ou de uma simples frase, não o julgue profundo demais, não fique complexado: o inferior é ele.
A atual crise de expressão, que tanto vem alarmando a velha-guarda que morre mas não se entrega, não deve ser propriamente de expressão, mas de pensamento. Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Em meio à intrincada selva selvagem de nossa literatura encontram-se às vezes, no entanto, repousantes clareiras. E clareira pertence à mesma família etimológica de clareza… Que o leitor me desculpe umas considerações tão óbvias. É que eu desejava agradecer, o quanto antes, o alerta repouso que me proporcionaram três livros que li na última semana.
Porque, ao ler alguém que consegue expressar-se com toda a limpidez, nem sentimos que estamos lendo um livro: é como se o estivéssemos pensando.
E, como também estive a folhear o velho Pascal, encontrei providencialmente em meu apoio estas suas palavras, à pág. 23 dos Pensamentos:
“Quando deparamos com o estilo natural, ficamos pasmados e encantados, como se esperássemos ver um autor e encontrássemos um homem”.
(Mario Quintana, A vaca e o hipogrifo. Adaptado)
Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
As expressões “certo” e “ao certo” significam, respectivamente,
Leia o texto, para responder à questão.
Clareiras
Se um autor faz você voltar atrás na leitura, seja de um período ou de uma simples frase, não o julgue profundo demais, não fique complexado: o inferior é ele.
A atual crise de expressão, que tanto vem alarmando a velha-guarda que morre mas não se entrega, não deve ser propriamente de expressão, mas de pensamento. Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Em meio à intrincada selva selvagem de nossa literatura encontram-se às vezes, no entanto, repousantes clareiras. E clareira pertence à mesma família etimológica de clareza… Que o leitor me desculpe umas considerações tão óbvias. É que eu desejava agradecer, o quanto antes, o alerta repouso que me proporcionaram três livros que li na última semana.
Porque, ao ler alguém que consegue expressar-se com toda a limpidez, nem sentimos que estamos lendo um livro: é como se o estivéssemos pensando.
E, como também estive a folhear o velho Pascal, encontrei providencialmente em meu apoio estas suas palavras, à pág. 23 dos Pensamentos:
“Quando deparamos com o estilo natural, ficamos pasmados e encantados, como se esperássemos ver um autor e encontrássemos um homem”.
(Mario Quintana, A vaca e o hipogrifo. Adaptado)