Leia o trecho abaixo para responder à questão.
Semana passada, um conhecido morreu de forma trágica,
o que gerou imensa comoção e o compartilhamento de ternas
homenagens pelas redes sociais. Somos adultos, sim. Sabemos
que pessoas morrem e que, com o passar do tempo, tendem a
morrer com mais frequência. Contudo, nada nos prepara para
certas ausências, principalmente porque são duas, na prática: a
física e a digital.
Confesso ter dificuldade para o luto online. Até hoje, não
consigo desfazer amizade com duas grandes amigas. Ambas
morreram há mais de cinco anos e, é claro, eu poderia clicar na
opção "deixar de seguir". Mas como encará-las como não
pessoas? Os avatares resistem e, por vezes, passeio por suas
publicações. Algo me escapa entre os retratos, porém segue
sendo vínculo. Talvez últimas palavras, numa legenda feliz do
Instagram.
Ao vasculhar minha caixa de e-mails, é comum que um
termo da busca traga por acaso meu pai e nossa antiga troca de
mensagens. Vou relendo tudo embargada de emoção,
reconhecendo seu modo de se expressar. Ao contrário das
cartas, que amarelam, o que corre pela tela é um fluxo vivo de
pensamento, como se conversássemos de novo a partir daquelas
linhas. Sua voz grave ecoando na minha cabeça.
Seria a vida digital, então, a verdadeira vida após a morte?
Afinal, podemos ir para o céu, para o inferno, inclusive para o
nada. Certeza, mesmo, apenas a dessa reencarnação promovida
não por um deus, mas pelas operadoras de celular: quando o
número de telefone enfim muda de dono e nos deparamos com
a foto de um estranho entre nossos contatos. Mero “invólucro”
de pixels.
É por isso que tantos perfis continuam no ar, feito
memoriais. Deles surge toda sorte de atualizações, como votos
de saudade e feliz aniversário. Memórias datadas de "há tantos
anos, neste dia". Deixo lá meus likes como se depositasse
pedrinhas no jazigo dos entes queridos. Seguem mortos, mas
não desconectados da nossa realidade.
(Bia Braune. www1.folha.uol.com.br. Adaptado).