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Ano: 2021 Banca: NC-UFPR Órgão: PC-PR Prova: NC-UFPR - 2021 - PC-PR - Delegado de Polícia |
Q1825493 Direito Administrativo

Acerca da responsabilidade do Estado por atos praticados por agentes de segurança pública, considere as seguintes afirmativas:


1. Em face de dano causado por disparo de arma de fogo de agente policial, caso este não se encontre em serviço, aplica-se a teoria da faute du service para responsabilização do Estado.

2. Caso se demonstre que o agente policial encontrava-se em atendimento a ocorrência, ele ficará isento de ressarcir eventuais danos à viatura decorrentes de o agente conduzi-la em contramão de via.

3. A teoria do risco administrativo incide no caso de perseguição policial que resultou em ferimento a transeunte, causado por projétil de arma de fogo disparado por agente policial.

4. O Estado responde objetivamente em caso de dano decorrente de utilização de arma de fogo de corporação militar por parte de soldado fardado, mesmo se este não se encontrar em serviço.


Assinale a alternativa correta.

Alternativas

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A questão exige do candidato conhecimentos específicos sobre a responsabilidade do Estado decorrente de atos praticados por agentes de segurança pública.

O Estado é civilmente responsável pelos danos que seus agentes venham a causar a terceiros. Desta forma, incumbe-lhe arcar com a reparação de eventuais prejuízos assim como o pagamento das respectivas indenizações.

As modalidades de responsabilização do Estado bem como o processo pelo qual se perfaz essa reparação civil podem sofrer alterações em decorrência de diversos fatores, dentre eles em razão da teoria que fundamenta essa obrigação estatal de reparar os danos causados por seus agentes. Tais teorias passaram por um processo de evolução que começou com a teoria da irresponsabilidade do Estado (séc. XIX) até a atual teoria do risco administrativo. Neste sentido, vamos a análise de algumas das principais teorias que fundamentam a responsabilização do Estado, começando pela teoria da irresponsabilidade:

> Teoria da Irresponsabilidade Civil do Estado: segundo esta teoria, que prevaleceu na metade do século XIX, o Estado não responde civilmente pelos atos praticados por seus agentes.

>Teoria da Responsabilidade com Culpa: essa teoria surgiu superando a teoria da irresponsabilidade, nos casos de ações culposas dos agentes. Mas, atenção, não era qualquer ato danoso da Administração Pública que levava à responsabilização, e para isso é necessário destacar dois tipos de atos. Para esta corrente existiam os atos estatais decorrentes do poder de império, que seriam aqueles coercitivos, provenientes do poder soberano do Estado, e os atos de gestão, que seriam atos mais próximos desses do direito privado. Os atos de gestão podem gerar a responsabilidade do Estado, no entanto, os atos de império, que seriam regidos pelas tradicionais normas de direito público, não há responsabilização

> Teoria da Culpa Administrativa: a partir desta teoria não mais se fazia necessária a distinção entre atos de império e de gestão. Para os defensores desta corrente o lesado não precisaria identificar o agente responsável pelo dano, apenas comprovar o mau funcionamento do serviço público. Essa falta do serviço poderia ser entendida de três formas: inexistência do serviço, mau funcionamento ou retardamento. Em qualquer uma destas hipóteses, mesmo sem a identificação do agente, a falta do serviço culminava no reconhecimento de culpa.

> Teoria da Responsabilidade Objetiva:  nessa modalidade de culpa se dispensa a análise do fator culpa em relação ao fato danoso, basta, portanto, que se comprove a relação de causalidade entre o fato e o dano e o próprio dano. 

> Teoria do Risco Administrativo: a obrigação de indenizar surge somente do ato lesivo causado à vitima pela Administração Pública, não se exigindo qualquer falta do serviço público, nem culpa dos seus agentes. Para esta corrente o Estado tem maior poder e mais prerrogativas do que o administrado, sendo, portanto, o sujeito mais poderoso jurídica, politica e economicamente, e, por isso, teria que arcar com o risco inerente às suas atividades. Essa teoria passou a ser o fundamento da responsabilidade objetiva do Estado.

(CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 32 ed. São Paulo: Atlas, 2018, p. 594 e seguintes.)

Feita a explicação acima vamos a análise das afirmativas voltadas especificamente para a responsabilidade decorrente de atos de agentes de segurança pública.

1) FALSA -  aqui, está errada a teoria que fundamenta a responsabilização. Não se trata da teoria da faute du service, que é o mesmo que a teoria da culpa administrativa - acima exposta, e sim a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, na forma do art. 37, §6º da Constituição Federal.

2) FALSA - Nos termos do art. 37, §6º, da CF, a responsabilidade do Estado é objetiva pelos atos seus agentes, podendo ainda cobrar regressivamente do responsável pelo dano nos casos de dolo ou culpa. 
Na questão deve-se entender a culpa em sentido latu, ou seja, considerar também a ocorrência em uma de suas vertentes, negligencia, imperícia ou imprudência. Deste modo, não se pode afirmar, pelos dados apresentados, que o agente está isento de responder, mesmo poque há grande indício de culpa por estar trafegando na contramão.

3) VERDADEIRA - no caso em epígrafe entende-se que o Estado responde objetivamente nos termos do art. 37, §6º da CF.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 876.362 - CE (2016/0055668-4) RELATOR : MINISTRO SÉRGIO KUKINA AGRAVANTE : ESTADO DO CEARÁ PROCURADOR : RAFAEL LESSA COSTA BARBOZA E OUTRO (S) AGRAVADO : IARA VITÓRIA FERREIRA MACIEL (MENOR) REPR. POR : FRANCISCO OCÉLIO NUNES MACIEL ADVOGADOS : ANTÔNIO DELANO SOARES CRUZ E OUTRO (S) - CE008116 MÁRCIA DE ANDRADE SARAIVA COLARES E OUTRO (S) - CE014595 DECISÃO Trata-se de agravo manejado pelo Estado do Ceará contra decisão que não admitiu recurso especial, este interposto com fundamento no art. 105, III, a, da CF, desafiando acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, assim ementado (fls. 276/277): APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO POLICIAL. CONFRONTO EM VIA PÚBLICA. BALA PERDIDA QUE ATINGIU MENOR. DANOS DE NATUREZA GRAVE. DANOS MORAIS CARACTERIZADOS. ARBITRAMENTO DO VALOR. PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART 20, §§ 3o e 4o, CPC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA ALTERADA. 1. Cuidam os autos de apelação cível contra sentença, que. nos autos da Ação de Indenização por Danos Morais proposta em face do Estado do Ceará, rejeitou o pleito autoral, por entender ausente o nexo causai em razão da não comprovação por parte da recorrente de que as lesões sofridas teriam decorrido de errôneo planejamento estatal. 2.Os agentes públicos ao participarem de confronto armado em via pública contribuíram diretamente para o resultado danoso suportado pela vitima. Se o objetivo dos policiais, ao perseguir os bandidos que assaltavam um banco, era a defesa da sociedade, falharam, pois pelo menos uma pessoa foi submetida a grave risco de morte. 3. A atuação dos bandidos não pode ser tida como um fator externo à atividade policial. A possibilidade de inocentes serem expostos durante ações de combate á criminalidade é uma realidade que não escapa à Teoria do Risco Administrativo, que impõe ao Estado o dever de agir de maneira segura e com cautela, evitando que danos sejam suportados por inocentes. Desse modo. não rompido o nexo causai, o Estado deve responder objetivamente pela conduta de seus servidores, na forma do art. 37, § 6º da Constituição Federal. 
(...)
(STJ - AREsp: 876362 CE 2016/0055668-4, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Publicação: DJ 08/09/2017)

4) VERDADEIRA -  alternativa polêmica, muito cuidado com a redação da alternativa.

Via de regra a responsabilidade do Estado é objetiva, nos termos do art. 37, §6º, da CF. No caso desta questão gera confusão o fato de o soldado não estar em horário de expediente, mas estar fardado e com arma da corporação, e, com esta, causar danos. 
O fato de usar arma da corporação ou própria, para a questão em tela seria irrelevante, o que o candidato deveria saber aqui é como se da a atuação do agente. No entanto, seguindo precedentes do STF, o fato de usar a arma da corporação é mais um fator que reforça a possibilidade de responsabilização do Estado.
Se atuar em nome do Estado, mesmo que fora do expediente, haverá a responsabilidade Estatal:

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ASSALTO PRATICADO POR POLICIAL FARDADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CARREADO AOS AUTOS. SÚMULA 279/STF. 1. O Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agente, ainda que fora do horário de expediente. Nesse sentido: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. responsabilidade civil DO estado. C.F., art. 37, § 6º. I. - Agressão praticada por soldado, com a utilização de arma da corporação militar: incidência da responsabilidade objetiva do estado, mesmo porque, não obstante fora do serviço, foi na condição de policial-militar que o soldado foi corrigir as pessoas. O que deve ficar assentado é que o preceito inscrito no art. 37, § 6º, da C.F., não exige que o agente público tenha agido no exercício de suas funções, mas na qualidade de agente público. II. - R.E. não conhecido (RE 160401, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, Dj 04-06-1999). 2. A súmula 279/STF dispõe verbis: Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário. 3. É que o recurso extraordinário não se presta ao exame de questões que demandam revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, adstringindo-se à análise da violação direta da ordem constitucional. 4.Agravo regimental a que se nega provimento.(STF - ARE: 644395 GO, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 04/10/2011, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-202 DIVULG 19-10-2011 PUBLIC 20-10-2011 EMENT VOL-02611-02 PP-00212)

No caso de policial, mesmo em folga, ao estar fardado há uma exteriorização da sua condição de agente público, sendo este fato determinante para que se presuma que o mesmo atua em nome do Estado, e que se trate aqui de responsabilidade Estatal com base na teoria do risco administrativo.

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ACIDENTE CAUSADO POR AGENTE PÚBLICO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO OFICIAL. EXISTÊNCIA DOS ELEMENTOS CONFIGURADORES DA RESPONSABILIDADE ESTATAL. PRECEDENTES. O acórdão recorrido está alinhado à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que para a caracterização da responsabilidade da Administração pública, na forma do § 6º do art. 37 da Constituição Federal, não se exige que o agente público tenha agido no exercício de suas funções, bastando que tal qualidade esteja exteriorizada pela sua conduta. Precedentes. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF - AgR ARE: 664246 AL - ALAGOAS, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 16/12/2014, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-027 10-02-2015)

Diante do explicado acima, vamos a identificação da alternativa que contenha as afirmações verdadeiras.

A) ERRADA
B) ERRADA
C) CORRETA
D) ERRADA
E) ERRADA

GABARITO: Letra C

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Comentários

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Acredito que o item I e IV estão corretos por supor a ideia de que mesmo não estando em serviço, os disparos efetuados pelo policial e pelo soldado se dão em decorrência do serviço público. Se eu estiver errado, e a justificativa for outra, por favor, compartilhe aqui e futuramente será ajudado por outro hahaha

O item "I" está errado, uma vez que segundo a evolução das teorias que buscaram explicar a responsabilidade civil do Estado, a chamada "faute du service" ou falta do serviço, de origem francesa, diz respeito aos atos omissivos do Estado, mais especificamente quando houver sua falta, prestação tardia, ou irregular. No caso apresentado, irá aplicar a teoria do risco administrativo mesmo que é nossa regra.

O item "II" confesso que me causou certa confusão no dia da prova, em razão da interpretação de texto pois o "ele" me deixou em dúvida se era referente ao Estado ou ao próprio agente, me parece ser em relação ao agente e não do Estado, então é incorreto dizer que ele ficará isento de responsabiliade, uma vez que o Estado possui ação regressiva contra o agente público em caso de dolo/culpa.

Em relação aos itens III e IV as alternativas eram auto explicativas e corretas.

IV) "O Estado responde objetivamente em caso de dano decorrente de utilização de arma de fogo de corporação militar por parte de soldado fardado, mesmo se este não se encontrar em serviço".

O tema é bastante polêmico e é preciso distinguir em pequenas nuances. Vejam:

Se o agente, em folga, utiliza arma da corporação, mas não se vale da qualidade de agente público (policial), não há responsabilidade do Estado (STF, RE 363423):

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. LESÃO CORPORAL. DISPARO DE ARMA DE FOGO PERTENCENTE À CORPORAÇÃO. POLICIAL MILITAR EM PERÍODO DE FOLGA. Caso em que o policial autor do disparo não se encontrava na qualidade de agente público. Nessa contextura, não há falar de responsabilidade civil do Estado. Recurso extraordinário conhecido e provido.

De outro lado, se o agente, ainda que em folga, se vale da qualidade de agente público (policial), haverá responsabilidade do Estado (STF, ARE 644395):

Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ASSALTO PRATICADO POR POLICIAL FARDADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO CARREADO AOS AUTOS. SÚMULA 279/STF. 1. O Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agente, ainda que fora do horário de expediente. Nesse sentido: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. responsabilidade civil DO estado. C.F., art. 37, § 6º. I. - Agressão praticada por soldado, com a utilização de arma da corporação militar: incidência da responsabilidade objetiva do estado, mesmo porque, não obstante fora do serviço, foi na condição de policial-militar que o soldado foi corrigir as pessoas. O que deve ficar assentado é que o preceito inscrito no art. 37, § 6º, da C.F., não exige que o agente público tenha agido no exercício de suas funções, mas na qualidade de agente público.

Essa é a distinção que eu consigo fazer...

Pessoal, solicitem comentário do Prof...

Sobre o item 4.

A conduta deve ser praticada por um agente público atuando nesta qualidade ou, ao menos, se aproveitando da qualidade de agente para causar o dano. Portanto, mesmo que o agente público esteja fora do seu local de trabalho ou fora do seu horário de trabalho, caso aproveite da qualidade de agente (in casu o uso da farda) no cometimento de um dano o ente público deve ser responsabilizado.

Fonte: Meus resumos

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